O preço-teto de R$ 115,57/MWh estipulado pelo governo para a energia da hidrelétrica de Belo Monte não atende a necessidade da Norte Energia. Com isso, a empresa confirmou que não participará do leilão A-5, previsto para ocorrer na próxima sexta-feira, 29 de abril. A venda dos 20% restantes da produção de uma das maiores usinas brasileiras é estratégica, pois liberaria os R$ 2 bilhões que faltam do financiamento concedido pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Social e Econômico.
 
Segundo José Aílton de Lima, um dos representantes da Eletrobras no Conselho da Norte Energia, há uma cláusula no contrato de financiamento com o BNDES determinando que a energia precisa ser vendida por R$ 185/MWh para que os recursos possam ser liberados em sua totalidade. Caso a Norte Energia conseguisse vender por pelo menos R$ 165/MW, o banco liberaria apenas R$ 1 bilhão. O executivo explica que a cláusula era conhecida desde o início das conversas com o BNDES e que, portanto, não representa nenhuma novidade para os sócios.
 
“O preço teto colocado não resolve a necessidade da gente. Temos uma cláusula no contrato do financiamento do BNDES dizendo que tenho que vender a R$ 185/MWh em preços atuais para conseguir os R$ 2 bilhões. Eventualmente se eu conseguisse vender a R$165/MWh – a gente conseguiria R$ 1 bilhão. Isso é o que reza o contrato. A R$ 115/MWh, que é o preço teto do leilão, você simplesmente não consegue o recurso do BNDES. Então não faz sentido entrar no leilão para um preço que você não consegue atender a cláusula do financiamento. Dessa forma o Conselho deliberou que não vai participar do leilão”, confirma Lima em entrevista exclusiva à Agência CanalEnergia, nesta sexta-feira, 22 de abril.
 
O conselheiro da Norte Energia não aposta em outra oportunidade para Belo Monte vender essa energia no ambiente regulado, restando apensas adotar uma solução semelhante a aplicada na UHE Jirau, em que os sócios compraram a energia que estava descontratada proporcionalmente a participação societária no projeto. “Já houve um esforço muito grande do governo em fazer uma regra particular para tentar vender nesse leilão. O leilão A-5 é para energia nova, teoricamente a energia de Belo Monte não é tão nova. … Ele não pode ficar repetindo isso nos leilões”, diz Lima, que também é diretor de Operações da Eletrobras Chesf.
 
A solução mais comum seria vender essa energia no mercado livre, mas o executivo lembra que é “praticamente impossível” conseguir um contrato de 30 anos no ACL. “Esse é o problema dessa cláusula contratual. Evidentemente que ela foi aceita quando fizemos o contrato de financiamento, não há nada de surpresa nessa questão”. Além disso, a atual conjuntura econômica do país torna a tarefa mais desafiadora a julgar pela sobra de energia no sistema e pelos preços praticados no mercado livre.
 
Para ele, o que resta é convencer os sócios a fazer novos aportes financeiros para concluir o projeto hidrelétrico no rio Xingu (PA), que iniciou sua operação comercial na última quarta-feira, 20 de abril, exatamente seis anos após ser licitada. Em contrapartida ao aporte, cada sócio firmaria um contrato oneroso se comprometendo a vender essa energia no varejo, proporcionalmente a sua participação societária no projeto. Como se tratam de 914 MW médios/ano, Lima estima que os sócios devem assumir um ônus entre R$ 25 e R$ 30 bilhões considerando os 30 anos do contrato de concessão de Belo Monte. A composição acionária da Norte Energia é formada por três empresas do Grupo Eletrobras, por fundos de previdência (Petros e Funcef), pelas empresas Neoenergia, Cemig/Light, Vale/Cemig, além da Sinobras e da J.Malucelli Energia.
 
“Está solução [de Jirau] poderia ser adotada em Belo Monte. Cada sócio comprava sua parcela e ia vendendo no curto prazo. Só que os sócios não aceitam. Agora os sócios estão reagindo a essa situação. Tem fundo de pensão argumentando que não tem expertise para vender essa energia. O que não vejo como problema, pois se quiser negociar constitui uma comercializadora junto com quem tem experiência”, argumenta Lima. 
 
Em sua visão, quando se entra num leilão todos os sócios assumem o risco do negócio. “O problema é que tem uma parte dos nossos sócios que quer fazer capitalismo sem risco. O risco do negócio existe e ao não conseguir vender precisa colocar dinheiro do bolso. Com isso cai a taxa de retorno do negócio, porque estou aportando mais do que o previsto. Mas é o risco do negócio. Todos os sócios que entraram em Belo Monte sabiam que a regra era essa. Todo mundo sabia que se não vendesse essa energia teria um baita de um problema para resolver”, conclui.