A falta de sistemas de transmissão ainda provoca desperdício da geração eólica no Nordeste e o consumidor é quem está pagando a conta. A reportagem apurou que ainda existem 13 parques eólicos prontos, ou 323 MW, impossibilitados de entregar energia à rede por conta da falta de linhas. Os empreendimentos estão localizados nos estados da Bahia, Ceará e Rio Grande do Norte. Muitas dessas usinas deveriam estar produzindo desde 2013.
 
Não é de hoje que o setor tem convivido com esse tipo de situação, que começou ainda em 2012 quando 622 MW em parques eólicos ficaram prontos antes da construção das linhas. A situação se agravou no ano seguinte e o setor chegou a ter 2.000 MW em usinas paradas. Como a culpa não era dos geradores, a Agência Nacional de Energia Elétrica precisou garantir o pagamento das receitas previstas em contratos. Criou-se a figura das usinas “aptas a operarem”. Dessa forma, o consumidor tem pago por uma energia que não está sendo entregue.  
 
Licitados nos leilões de energia de reserva de 2010, 2011 e 2013, além de dois projetos que fazem parte do A-5 de 2011, os empreendimentos monitorados pela reportagem são das empresas Enel Green Power (149,5 MW), Voltalia (108 MW) e Alupar (40,5 MW). Com exceção dos projetos da Alupar, a previsão é que todas essas usinas estejam conectadas até o final desse ano, isso se a transmissora responsável, a Chesf, cumprir os cronogramas previstos para junho e setembro deste ano. Ocorre que esses dados são alterados todo mês, na sua maioria, postergando ainda mais a entrega das linhas.
 
Quanto aos motivos dos atrasos, são questões da própria concessionária, nenhum impeditivo extraordinário que tenha paralisado a obra. As concessionárias justificam em muitos casos demora em obter as licenças ambientais e autorizações necessárias. Estão em obras as ICGs Morro do Chapéu II (230 kV/BA), Ibiapina II (69 kV/CE) e Touros (69 kV/RN). Em nota, a Chesf informou que "todas as obras citadas são prioritárias para a empresa, que está trabalhando para entregá-las no menor prazo possível."
 
No caso da ICG Aracati III (138 kV/CE), que estava programada para escoar os projetos da Alupar a partir deste ano, no relatório de fiscalização da Aneel, por exemplo, está que a obra ficaria pronta no mês passado, o que não ocorreu. Essa obra, inclusive, não tem mais previsão de quanto ficará pronta, uma vez que o contrato de concessão, concedido à Braxenergy, está em vias de ser cassado pela agência reguladora.
 
"A Aneel contratou num leilão um agente que simplesmente não fez nenhum projeto. Nós avisamos várias vezes…" disse José Luiz de Godoy, diretor de Relações com Investidores e Financeiro da Alupar. "Esse é um ponto que a Aneel precisa avaliar melhor… Essa questão das garantias do leilão precisa melhorar para evitar isso, porque o desconto que a gente pode ter dado no leilão é ridículo em relação ao custo que [o consumidor] vai ter de pagar pelos nossos parques eólicos durante não sei quanto tempo… Essa linha pode ser feita, mas pode demorar dois, três, até quatro anos. Isso [o custo para o consumidor] vai ser muito maior que o próprio custo da linha", disse o executivo à Agência CanalEnergia durante teleconferência com analistas de mercado nesta sexta-feira, 13 de maio.
 
Com as sobras de energia das distribuidoras, há situação hoje não é tão grave como antes em relação ao atendimento da demanda. Porém, trata-se de um investimento importante que poderia contribuir principalmente para o abastecimento da região Nordeste, onde os reservatórios marcam 31,85% da capacidade de armazenamento. A falta de chuvas regulares tem comprometido o desempenho da geração hidrelétrica no submercado Nordeste nos últimos anos, exigindo do Operador Nacional do Sistema Elétrico e da Agências Nacional de Águas manobras operativas para garantir o funcionamento das usinas e o uso múltiplo da água naquelas bacias hidrográficas. A região só não passou por um período de racionamento de energia no ano passado por conta das usinas eólicas. Contudo, a fonte poderia estar contribuindo mais se não houvesse sistemáticos atrasos nas obras de transmissão, impedindo que vários parques eólicos entreguem energia dentro do planejado.
 
Compensação – Tramita na Câmara dos Deputados um processo que pretende cobrar R$ 929,5 milhões da Chesf como compensação aos consumidores brasileiros por 26 novos parques eólicos que estavam prontos em 2013, mas não podiam entregar esta energia. O relatório final da investigação, realizada pelo Tribunal de Contas da União, foi aprovado no dia 4 de maio pela Comissão de Minas e Energia da Câmara dos Deputados. 
 
Além disso, a reportagem apurou que a Agência Nacional de Energia Elétrica ingressou no ano passado com uma ação civil pública contra à Chesf buscando ressarcimento aos consumidores dos valores desembolsados para pagar usinas eólicas impedidas de operar em virtude do atraso nas obras de transmissão. O processo está na mão do juiz Francisco Renato Codevila Pinheiro Filho, da 15ª Vara Federal de Brasília. Com relação ao processo da Aneel, a Chesf disse que já apresentou recurso.