A figura do comercializador varejista não avançou no mercado livre como o esperado. Regulamentado há 14 meses, até o momento há apenas quatro processos de habilitação em andamento na Câmara de Comercialização de Energia Elétrica. Segundo Rui Altieri, presidente do conselho da CCEE, o risco da inadimplência tem inibido as empresas de atuarem nesse mercado, uma vez que a regulação vigente não permite que o comercializador varejista interrompa o fornecimento de energia em caso de falta de pagamento de um cliente.
 
Para Altieri, a operação da figura do comercializador varejista é fundamental para o mercado livre, que vive uma forte migração de clientes com baixo perfil de consumo. Esse volume de pequenos pontos de medição tem exigido muito da CCEE do ponto de vista operacional, o que preocupa a Câmara. "O que a gente tem observado é que isso [a migração] traz para a CCEE um trabalho operacional muito forte", disse. "Temos que cuidar para que essa migração seja prudente e não traga problemas para CCEE ou para o setor elétrico", completou.
 
A busca por custos menores de energia elétrica é o que tem levado a um volume de migração fora do comum para o ACL. Segundo a CCEE, o número total de agentes do mercado livre cresceu 9,5% entre janeiro e abril deste ano, passando de 3.244 agentes para 3.553. Considerando apenas a evolução dos consumidores especiais, houve um salto de 20%, passando de 1.203 para 1.449 agentes. Há ainda 1126 processos de adesão ao ACL em aberto, sendo 1.022 de consumidores especiais e 104 livre. A expectativa da CCEE é que ao final de 2016 só a categoria de consumidores represente 3.221 agentes, sendo 2.471 especiais e 750 livres.
 
"A nossa preocupação é operacional. Nós incentivamos a migração, temos interesse que os agentes migrem para o mercado livre, mas o pequeno consumidor tem que estar modelado embaixo do comercializador varejista. Não faz sentido a mesma regra que contabiliza Itaipu ou a Eletropaulo ser usada por uma padaria. Energia não é o negócio dele, ele precisa ter alguém que faça esse meio de campo", disse Altieri durante o 13º Encontro Nacional dos Agentes do Setor Elétrico (Enase), realizado entre os dias 18 e 19 de maio, no Rio de Janeiro. 
 
Hoje o Ambiente de Contratação Livre representa 27% do consumo de energia nacional, mas esse potencial pode chegar a 40%. Informações das comercializadoras apontam que há mais de 2000 consumidores com a intensão de migrar para o mercado livre. Segundo os especialistas, a mudança para o ACL pode representar uma economia de 25% no custo da energia. Segundo Reginaldo Medeiros, presidente da Associação Brasileira de Comercializadores de Energia, há 14 mil consumidores com potencial para migração no mercado livre.
 
Além de impor um desafio operacional para a CCEE, a mudança de ambiente também tem um efeito negativo para o mercado cativo. A saída de clientes do ambiente cativo provoca perda de mercado para as distribuidoras, reduzindo as receitas e aumentando os custos para os clientes que permanecem conectados às concessionárias. Como a migração dos consumidores está ocorrendo de maneira desconcentrada, o impacto é diferente em cada distribuidora. Um estudo inicial feito pela CCEE estima uma perda de 1% do consumo das concessionárias (média Brasil) com as migrações em andamento.
 
O diretor geral do Operador Nacional do Sistema Elétrico, Luiz Eduardo Barata, disse que é favorável a abertura total do mercado energia para todos os tipos de consumidores, porém essa mudança precisa ser planeja. "Porque se fizer de uma hora para outra, conforme está estruturado o nosso sistema, você pode levar a uma queda de mercado. Então, acho que nesse momento o agente não está preparado para isso. Acho que a saída é o comercializador varejista. Fiquei surpreso que o comercializador varejista não andou. Os dois últimos anos que estive na CCEE apostei muito na figura", disse Barata, que já foi presidente da CCEE e secretário executivo do Ministério de Minas e Energia.