Dez dias após o desligamento das térmicas fora da ordem de mérito no país os preços de energia no mercado livre, cuja expectativa era de alta com o maior uso de reservatórios, não tem se confirmado. Ao invés de elevação o mercado tem registrado uma retração nos valores para o segundo semestre deste ano. O principal motivo é a hidrologia melhor do que a prevista e a consequente situação dos reservatórios, que ficaram estáveis ou até mesmo apresentaram melhoria no seu nível de armazenamento. Outros componentes dessa equação são as incertezas quanto aos rumos que o setor tomará em decorrência de uma possível revisão da formação do PLD, qual será o tempo de retomada da economia e se o atual governo se manterá no poder.
De acordo com a plataforma da BBCE, há negócios para energia convencional no submercado Sudeste para o segundo semestre fechados na casa de R$ 80/MWh. Segundo agentes de mercado, esse mesmo produto no início do ano apresentava valores na casa R$ 90 a R$ 93/MWh. Com essa queda, a distância entre os produtos convencional e incentivada aumentou uma vez que este segundo está em plena ascensão em decorrência da verdadeira fuga em massa do mercado regulado para o livre por parte de clientes livres especiais. “Na verdade este é o retorno da normalidade do setor com as chuvas influenciando os preços mais que o CMSE”, resumiu o diretor de Risco e Inteligência da Ecom Energia, Carlos Caminada.
Marcelo Parodi, sócio-diretor da Compass explica que o cenário de elevação de preços com o deplecionamento mais acelerado das UHEs não aconteceu porque houve despacho mais elevado até mesmo depois da decisão de desligar as UTEs fora da ordem de mérito, principalmente no Norte e Nordeste. Nessas regiões a hidrologia não foi tão boa e a geração eólica não foi tão expressiva. Tanto que a UHE Tucuruí não teve o vertedouro aberto pela primeira vez em muitos anos. Além disso, citou as chuvas mais elevadas no Sudeste. Tanto que o sinal de preços para julho chegou a até R$ 55/MWh. Segundo a plataforma BBCE, no dia 8 de junho houve negócios de R$ 51/MWh. “A melhoria da hidrologia e a carga reduzida têm mantido os preços mais reduzidos ao ponto de que nem o desligamento de térmicas influenciou os valores”, indico o executivo da Compass.
Com essa recente queda os preços da incentivada apresentaram aumento do gap entre esses produtos. Isso porque a energia incentivada segue em um sentido contrário à convencional. Hoje a diferença que estava na casa de R$ 25 a R$ 30/MWh já pode alcançar R$ 55/MWh. Antes os preços da incentivada estavam em cerca de R$ 160/MWh e hoje é possível ver esses valores R$ 30 mais altos. “Como a grande onda de migração para o ACL é de consumidores especiais há uma pressão natural nos preços da incentivada, mas ainda assim a vantagem nesse ambiente ainda pode chegar a até 25%”, estimou Parodi.
Caminada, da Ecom, lembra ainda que há uma sobra estrutural de energia no mercado e que tem um efeito grande sobre os preços. Os valores projetados para 2017 estão na casa de R$ 130/MWh um patamar que está bem próximo ao histórico desse ambiente de contratação. E essa deverá ser a tendência para os próximos anos já que os valores não tendem a subir de forma acelerada haja vista o momento da economia brasileira. Mas, lembrou, as incertezas acerca dos próximos passos do Brasil deixam o setor indefinido, pois não se sabe para onde caminhará a formação de preços de curto prazo, um balizador para o ACL.
Na avaliação do diretor comercial da Brasil Comercializadora, Alessandro Carmeli, as indefinições sobre as mudanças regulatórias que podem ser vistas no país ainda tem segurado as tendências de preços para 2017. Segundo ele, as decisões que forem tomadas têm capacidade de influenciar diretamente no patamar a ser praticado a partir do ano que vem. Mas, por enquanto, os valores estão em cerca de R$ 130/MWh, um nível mais próximo de quando o mercado opera dentro de sua normalidade.
Raimundo Batista, sócio da Enecel Energia, avaliou que o país está em um momento oposto a 2014, quando houve o que classificou como o racionamento branco, ou seja, o preço estava tão alto que as empresas deixaram de produzir de forma espontânea. Naquele momento estávamos vivendo ainda a economia em crescimento com a demanda em alta ao mesmo tempo em que a seca castigava o país. Já em 2016 é o contrário, chuvas volumosas para o período de economia e demanda em queda.
“Hoje a tendência de preços para o ano de 2017 está entre R$ 120 e R$ 130/MWh para a convencional. Os anos de 2016 e de 2014 foram atípicos e mostraram extremos do setor, resultado de erros do governo. O mercado deverá se regular e provavelmente deverá convergir para o que sempre foi e facilitar assim o planejamento”, comentou o presidente da Enecel. Na avaliação do presidente da Kroma Energia, Rodrigo Mello, enquanto a economia não reagir os preços tendem a ficaram baixos ainda mais com a entrada de novos empreendimentos de geração, o que injeta mais energia no mercado ao passo que as distribuidoras ainda apresentam sobrecontratação.
Apesar dessa melhoria do nível dos reservatórios esse ano, o diretor da Tradener, Luís Gameiro, avalia que os reservatórios não deverão conseguir manter a carga. E, naturalmente, o país deverá ter novamente o despacho térmico, mas este, dentro da ordem de mérito, o que deverá naturalmente elevar o PLD. O problema, contudo, é que o indicador de preços no mercado de curto prazo deveria refletir a última térmica despachada, o que não ocorre.
“Todo despacho deveria estar refletido no PLD para que não se tenha sinalização econômica equivocada, como vemos desde MP 579. E, com economia não tem desculpa por erros, não é à toa que vivemos a pior crise econômica do país”, ressaltou Gameiro. Ele lembrou ainda que a situação ainda é o resultado de um modelo que não reflete a possibilidade de retração de carga pela qual passamos. Por isso, destacou, é necessário que o modelo de precificação seja revisto, pois em sua avaliação, o atual está exaurido e não reflete mais o mercado brasileiro.