A venda de ativos da Petrobras é vista por especialistas como um desafio e, ao mesmo tempo, como uma oportunidade para a revisão da política de gás natural e a expansão da atividade no país. Estudo apresentado pela Confederação Nacional da Indústria nesta quinta-feira, 16 de junho, conclui que entraves legais e regulatórios terão de ser superados nesse processo para permitir a retomada dos investimentos e garantir aumento da oferta e queda nos preços do insumo.
O documento elaborado pela consultora Ieda Gomes, da FGV Energia, aponta barreiras também dos pontos de vista econômico e logístico que impedem o desenvolvimento da oferta e do mercado de gás no Brasil. Ele dá como exemplos o desconhecimento do potencial das bacias terrestres; dificuldades de acesso à infraestrutura de regaseificação, transporte e comercialização de gás e afirma que “a desaceleração de investimentos e a venda de ativos de gás da Petrobras poderá contribuir para obstacularizar o desenvolvimento do setor, caso não se tenha uma formatação regulatória que evite a manutenção e transferência para o setor privado do atual monopólio” da estatal.
Para a especialista, é necessária a revisão da Lei do Gás para garantir o livre acesso a todos os participantes desse mercado. Gomes afirma que a proposta de venda dos ativos de transporte da Petrobras não estabelece a obrigatoriedade de investimentos pelo novo proprietário na expansão do sistema, ou do acesso de terceiros à infraestrutura existente. Além de sair do setor de transportes, é importante que a Petrobras venda suas participações no segmento de distribuição de gás, o que deve ser feito “preferencialmente por distribuidora, de maneira a se multiplicar o número de agentes compradores de gás.” Seria necessária também a desconcentração de mercado na comercialização do gás, com a avaliação pelo Conselho Adminsitrativo de Defesa Econômica da possibilidade de fixação de um teto para participação no mercado pelo agente dominante.
A venda de usinas termelétricas e de terminais de GNL também será pouco atrativa, porque hoje essas usinas compram gás a preços abaixo dos preços no city-gate, mas o investidor privado será obrigado a importar GNL a preço de mercado, “sem poder contar com um portfólio de suprimento similar ao da Petrobras.” No caso de campos de petróleo e gás maduros, também não haverá atratividade para o investidor se a estatal não refinar o petróleo desses campos ou dar acesso aos seus gasodutos a preços e condições competitivas.
As reformas propostas para o setor passariam pela definição de um calendário anual de rodadas de exploração e produção de petroleo; adequação de questões relacionadas a royalties, garantias, conteúdo local, acesso à infraestrutura e programa mínimo; garantia de financiamento; condições para desenvolvimento de mercados secundários de GNL; revisão das condições dos leilões A-5 para que valores do Indice de Custo Beneficio e do Custo Variável Unitário sejam realistas com contratos de suprimentos de gás importado, e que o aviso de despacho de termelétricas seja feito com antecedência de 120 dias, em vez de 60 dias; além da garantia de livre acesso aos participantes do mercado de gás.
O professor Edmar Almeida, da UFRJ, que também foi convidado pela CNI para falar sobre o futuro do mercado de gás natural, afirma que a redução da participação da Petrobras no mercado levanta o debate sobre a nova configuração do mercado. Ele defende a necessidade de reorganização da indústria de gás para atrair novos investidores e garantir o crescimento da oferta; além do estabelecimento de um nível aceitável de concorrência para evitara substituição do monopólio da Petrobras por um oligopólio privado.
Almeida acredita que a competitividade desse mercado será alcançada pelo aumento da concorrência, com a redução de barreiras para entrada de novos players e maior número de empresas ofertantes, e menor dependência de importações com o aumento da produção doméstica de gás natural. Esses objetivos seriam alcançados com ações de curto, médio e longo prazo.