A incerteza sobre a realização de leilões neste ano está preocupando os investidores em energia elétrica, principalmente para aqueles que dependem da continuidade das contratações para sustentar seus negócios no Brasil. Além da crise econômica – que gera dúvida sobre a demanda futura de eletricidade -, esse clima de incerteza também é alimentado pela expectativa sobre qual será a política energética a ser adotada pelo governo após afastamento da presidente Dilma Rousseff.

Os sinais estão aí. O leilão A-5 realizado em abril contratou apenas 201 MW médios: ou as distribuidoras já estão devidamente contratadas, ou não estão dispostas a arriscar novas compras diante da dúvida sobre qual será seu real mercado daqui cinco anos. Sinal número dois: já estamos na segunda metade do ano e o governo ainda não marcou o leilão A-3 e para piorar o Ministério de Minas e Energia confirmou o adiamento do primeiro leilão de reserva, previsto para 29 de julho, agora sem data para ser executado.

Diante desse cenário, o diretor-geral da Voltalia do Brasil, Robert Klein, admitiu estar preocupado com o momento do mercado. Como os leilões de reserva não dependem da demanda das distribuidoras, mas sim de uma decisão do governo de contratar potência para dar segurança energética, muitos investidores apostavam no LER para garantir a continuidade dos seus negócios. "O LER não é atrelado a demanda das distribuidoras, mas obviamente se há um excesso de energia no mercado pode ser que haja o cancelamento total dos leilões neste ano. O que preocupa é que tem uma cadeia de fornecedores que se criou no Brasil. Há muitos projetos esperando, muitos investidores esperando e se não há potência contratada este ano, pode haver dificuldade para manter a indústria eólica", analisou Klein.

Ele ainda alertou que o país precisa tomar cuidado com uma política "stop and go", pois isso pode custar "muito caro" para a sociedade. "Espero somente que, apesar da redução temporária da demanda de energia, consequência da crise que vivemos, não deixemos de continuar consolidando o setor eólico, para que o Brasil fique cada vez menos dependente de crises hidrológicas", declarou o executivo após a cerimônia de inauguração do Complexo Eólico Vamcruz (93 MW), realizada na última quarta-feira, 29 de junho, em Serra do Mel, no Rio Grande do Norte.

De origem francesa, a Voltalia já colocou em operação 291 MW em parques eólicos no Brasil. Há outros 126 MW sendo construídos ou em fase de pré-construção. Além disso, a empresa tem uma carteira de aproximadamente 780 MW prontos para serem comercializados nos leilões. Klein revelou que a companhia, inclusive, já estuda a construção de uma linha de transmissão no Nordeste para garantir o escoamento da produção dos futuros projetos.

O presidente da Chesf, José Carlos de Miranda, também reconheceu que há uma certa incerteza quando ao crescimento do país nos próximos anos, mas entende que o Governo Federal tem tomados todas as medidas necessárias para reverter esse quadro. Miranda acredita que o crescimento do país será retomado antes que isso venha a afetar a cadeia produtiva eólica. "De fato passamos por um momento de final de crise, e falo final porque sou otimista, pois toda crise passa e essa também vai passar. O crescimento de energia elétrica no Brasil há de continuar. Temos uma população jovem, que vai demandar energia."

Ele continuou: "Acho impossível que não continuemos expandindo a energia eólica, por ser um potencial excepcional do Brasil em termos de vento e de custo. Não acredito que tenhamos um arrefecimento do desenvolvimento da indústria eólica. Podemos ter uma redução momentânea, até porque contratamos 5 anos à frente e certamente daqui a cinco anos vamos estar precisando de energia para o desenvolvimento do país." A Chesf é sócia da Voltalia no Complexo Vamcruz, com 49% do negócio.

Sazonalidade – A indústria eólica no Brasil conta com cerca de seis fabricantes, que juntos somam uma capacidade produtiva anual de quase 4 GW em equipamentos, segundo Sandro Yamamoto, diretor técnico da Associação Brasileira de Energia Eólica. Dessa forma, a ABEEólica defende a contratação mínima de 2 GW por ano para sustentar essa indústria. 

Porém, para o presidente do Sindicato das Empresas do Setor Energético do Rio Grande do Norte, Jean-Paul Prates, a indústria de energia precisa estar preparada para esse tipo de sazonalidade. "Não vejo nenhuma solução regulatória ou política nesse caso. Vejo uma arrumação do lado da indústria para se preparar para esse tipo de ciclo. Você não pode chegar para um presidente da República e pedir que ele crie demanda", defendeu o executivo.

"O Brasil tem um determinado limite de necessidade de energia e há fases que ele precisa de mais e há fases que ele precisa de menos. Então, não se faz demanda artificial. Isso é uma coisa que [a indústria] tem que saber conviver também", completou o especialista que também é presidente do Centro de Estratégias em Recursos Naturais e Energia (Cerne) e esteve em Serra do Mel.

Repórter viajou a convite da Voltalia