O governo costura um acordo com a Aneel para permitir o cancelamento dos contratos de energia solar comercializados no emblemático leilão de reserva de 2014. A ideia é aproveitar mudanças recentes na regulação e a sobrecontratação das distribuidoras para tirar esses projetos do planejamento, possibilitando que os investidores recoloque-os em condições melhores nos próximos certames.
Segundo Eduardo Azevedo, secretário de Planejamento Energético e Política Energética do Ministério de Minas e Energia, a ideia é incentivar uma “descontratação voluntária” oferecendo como contrapartida a redução das penalidades previstas nos contratos.
Até por ainda estar em negociação, o representante do governo não revelou qual seria o tamanho desse “benefício” oferecido aos empreendedores, mas explicou que hoje os agentes estão sujeitos a execução da garantia de fiel cumprimento depositada no momento do leilão, mais uma penalidade que varia entre 0,01% a até 10% do valor do investimento, mais a entrega de um ano de fornecimento de energia pelo preço que o agente vendeu no leilão.
Azevedo explicou que a proposta em discussão busca implementar uma regra para o leilão de energia de reserva análoga ao Mecanismos de Sobras e Déficits de Energia Nova (MCSD), onde os contratos possam ser ajustados por conta da sobra de energia. Ele afirmou que a Agência Nacional de Energia Elétrica já deu seu aval para o prosseguimento da proposta, que deve ser apresentada pelo governo nas próximas semanas.
“Queremos anunciar que estamos na fase final para lançar um programa onde a gente possa fazer uma descontratação voluntária desses projetos, de forma que não penalize [os empreendedores] pelo pioneirismo e mantenha a isonomia do processo de contratação de energia do Brasil”, afirmou Azevedo. “Pensando de forma objetiva, a gente tem na sobrecontratação a chance de rever o primeiro leilão de solar que aconteceu no Brasil em 2014… Que pelo pioneirismo, diante das mudanças da econômica, não tiveram chances de ‘performar’ como planejado”, completou.
Realizado em 31 de outubro de 2014, o certame viabilizou 62 empreendimentos, sendo 31 usinas fotovoltaicas e 31 usinas eólicas. Em um leilão disputado, a energia solar sofreu um deságio de 17,9%. O preço da energia solar caiu de R$ 262/MWh para R$ 215/MWh. Na época, o presidente da Empresa de Pesquisa Energética, Mauricio Tolmasquim, chegou a comemorar a contratação de energia solar por menos de US$ 90 o MWh.
Neste ano, seis empresas vencedoras do LER2014 protocolaram na Aneel pedidos de postergação de cronograma de seus empreendimentos. O certame, considerado o mais disputado da história, com mais de oito horas de duração, marcou a entrada da energia solar fotovoltaica na matriz elétrica brasileira. Contratualmente, esses projetos precisam entregar energia em 2017.
Os pedidos partiram da Renova Energia, Canadian Solar, Lintran do Brasil, FRV Solar, Usina Fotovoltaica Inharé, Rio Alto Energia Empreendimento e Participações. Juntas essas empresas representam 64% da potência contratada naquele certame (570 MW de 890 MW). A Enel Green Power, que conquistou 210 MW, segue desenvolvendo os seus projetos, porém a proposta a ser colocada pelo ministério também pode ser estendida à EGP.
As companhias alegam que houve alteração “imprevisível e extraordinária” das condições macroeconômicas então vigentes na época do leilão, como elevação da inflação, das taxas de juros e forte desvalorização do Real frente ao dólar. Esses fatores, somados a ausência de uma cadeia produtiva nacional voltada ao atendimento do setor fotovoltaico brasileiro, comprometeram as condições de financiamento para custear os vultuosos investimentos incorridos na implantação desses projetos.
“Num momento de crise, que uma parte do setor está menos acelerada, nós temos uma oportunidade de fazer uma mudança de rumo. Essa mudança passa por rever o modelo de planejamento energético, as premissas, os dados que estão colocados, e com isso encontrar novas formas de fazer acontecer”, disse Azevedo.