O momento é de transição quanto a precificação da energia. Em cerca de três meses passam a vigorar os novos parâmetros do CVaR e a perspectiva é de que em 2018 seja adotada a Superfície de Aversão ao Risco (SAR). Ambos podem ter efeito sobre os valores da energia convencional e incentivada no curto prazo e pouco no longo prazo. Contudo, a maior pressão nos preços deste segundo produto está sendo exercida pelo aumento da demanda decorrente da continuidade do fluxo de migração do ACR para o ACL. Nesse primeiro trimestre, os valores alcançaram o maior spread já registrado no país entre os dois produtos, está na casa de R$ 70/MWh, patamar muito acima do que normalmente o mercado estava habituado e que ficava entre R$ 20 a R$ 25/MWh.
Com a chegada, em maio, da safra das usinas de açúcar e álcool essa pressão tende a ser aliviada, mas a tendência é de que o spread continuará mais elevado do que o normalmente verificado. Agentes do mercado acreditam que o alívio será menor do que em outros anos, poderá recuar a um patamar de R$ 50 a R$ 55/MWh, ainda assim o dobro do considerado valor histórico desse indicador.
De acordo com a plataforma eletrônica de negociação de energia BBCE, a mudança de parâmetros de risco do CVaR já foi precificada em outubro do ano passado, quando a medida foi anunciada pelo governo. O preço médio ponderado para o ano, com base nos contratos fechados por meio da plataforma, aponta um valor de R$ 145/MWh. Essa conta, explicou o presidente da BBCE, Victor Kodja, toma como base negócios nos produtos janeiro a abril e maio a dezembro que estão disponíveis ao mercado. Enquanto no primeiro o preço está na casa de R$ 122/MWh o segundo é de R$ 156/MWh para a energia convencional no submercado Sudeste/Centro-Oeste.
“Acho que essa proximidade da alteração do risco não traz uma reação de muito significativa dos preços no produto convencional esse ano, por diversos fatores, mas o principal é o nível de carga e demanda”, comentou o executivo. “Já para a incentivada onde a demanda com a migração está elevada tivemos negócios nesse ano com preços R$ 76/MWh acima do PLD”, comparou.
Na avaliação da especialista em Inteligência de Mercado da Delta Energia, Débora Mota, no momento é visto uma elevação de cerca de 100% no ágio para a energia incentivada. Esse patamar está na casa de R$ 50 a R$ 55/MWh ante um nível histórico de R$ 25/MWh. Essa elevação, explicou ela, decorre basicamente desse aumento de demanda por este tipo de geração pelo forte movimento migratório de consumidores para o ambiente livre, o que tem pressionado os preços mais do que na energia convencional. “Mesmo com esse aumento do ágio podemos dizer que o consumidor que escolher migrar agora para o mercado livre ainda consegue obter uma economia que na média está entre 15% e 20% quando comparada à tarifa do mercado cativo”, indicou.
Segundo a Delta, atualmente o preço da energia incentivada está na casa de R$ 210/MWh com variações leves um pouco para cima ou para baixo no cenário de 2018. Segundo a especialista, o mercado hoje ainda está com incertezas para 2018 por questão de mudanças do modelo de risco. Isso, associado à demanda que não está tão elevada, conduz o setor a uma liquidez que ainda está em patamar reduzido.
De acordo com o diretor de Inteligência de Mercado da Ecom, Carlos Caminada, para 2017 o que se vê é o reflexo de uma frustração do período úmido em janeiro. A reação dos preços principalmente para o ano inteiro. Essa curva subiu e o que se tem é uma nova elevação de maio e dezembro por conta dos novos parâmetros do CVaR onde preços para a fonte convencional está no patamar de R$ 156 a R$ 158/MWh. Já para 2018 as incertezas acerca do que teremos no ano que vem ainda prevalece e com isso a precificação fica mais complicada de se fazer. “Até o final de março deveremos ter sinalização do que o CPAMP trará de atividades para 2017 e é possível que aí tenhamos a indicação do que virá no ano que vem”, explicou. Por enquanto, acrescentou, os preços para o produto convencional ainda estão a reboque do cenário de 2017.
Já no mercado de incentivada, Caminada corrobora a visão de seus colegas de mercado e vê uma grande pressão nos preços com as migrações, mesmo com a entrada da geração das usinas a biomassa com o início da safra de cana, no inicio de maio. “Sim, há uma pressão de preços porque na tomada de decisão de migração os consumidores veem o custo de oportunidade que é avaliada na comparação com a tarifa do mercado cativo, como os valores no ACR continuam elevados, cria essa pressão nos valores da incentivada porque a demanda está mais elevada o que reflete-se no spread”, comentou ele. “Enquanto não tiver oferta de incentivada esse novo patamar de preços veio para ficar, essa é a nova realidade”, acrescentou.
A visão do sócio diretor da Compass, Marcelo Parodi também é a mesma. Ele avalia que o mercado já precificou os preços para a convencional até abril. De maio em diante há um salto de R$ 35/MWh para algo entre R$ 150 a R$ 155/MWh. Nível que é o visto no atual momento do setor que vive a incerteza se o governo confirmará a SAR em 2018. Para a energia incentivada ele acrescentou ainda que, depois do primeiro quadrimestre, com a entrada em operação da biomassa, os valores do spread tendem a redução, contudo o alívio não será o dos anos anteriores. Ele citou que um parâmetro que indica a expectativa de mercado sem essa sazonalização natural para a energia incentivada é a curva de preços para o ano de 2018. “Temos visto no ano que vem os spreads para os 12 meses na casa de R$ 45/MWh, um valor que passa uma boa estimativa de patamar de preços para esse produto”, comentou.
Quanto ao início da aplicação de um modelo de risco mais conservador, o presidente da Comerc, Cristopher Vlavianos, afirma que já havia essa expectativa de mudança, o que faz com que haja uma sensibilidade maior a qualquer variação que tenhamos na hidrologia. E que isso afeta os preços para cima ou para baixo. Assim, é preciso esperar o final do período úmido que ainda tem mais cerca de 60 dias de possibilidade de chuvas intensas para que se possa ter um desenho mais claro das variações de curto prazo. E, dependendo desse movimento, pode ser que mesmo esse aumento de risco possa ser mitigado pelo período hidrológico. Ele lembra que 2016 foi um ano de aumento de capacidade instalada recorde no Brasil e com redução de carga, o que traz uma situação de menos estresse e mais conforto para o atendimento a demanda e que pode ajudar na formação dos preços.
Agora, no sentido contrário está o mercado para a energia incentivada. Segundo ele, não há falta de oferta, mas o aumento da demanda vem pressionando os preços a ponto de chegar ao que classificou como o maior spread já visto por conta da entressafra de biomassa e cenário de migrações em andamento. Alívio nesse mercado somente em 2019 com a liberação de cerca de 1 mil MW médios de energia que devem ficar liberados com a mudança de consumidores com cargas de 3 MW e tensão de 69 kV que hoje são obrigados a consumir de fontes incentivadas e poderão passar para a convencional.
Segundo ele, o governo precisa ficar atento a essa questão do consumidor especial e do lastro de incentivada para não penalizá-lo ao limitar as opções de contratação, o que de certa forma limita a expansão do mercado livre ao espremê-lo nas incentivadas sendo que há sobras de convencional no mercado. “Uma forma seria reduzir os limites de tensão e demanda ao invés de não permitir o crescimento por escassez de incentivada e isso, afeta o equilíbrio do setor”, analisou Vlavianos. “Hoje está se pagando R$ 70/MWh de ágio o maior que já vimos. Esse ágio está muito alto e trazendo custo adicional, ao ajustar os limites de tensão e demanda de 3 MW para 1 MW, por exemplo, você tem maior liberdade e reduz a pressão na incentivada uma vez que a convencional está mais barata, o que pode trazer equilíbrio”, sugeriu o executivo ao lembrar que essa alteração não depende de lei, podendo o próprio Ministério de Minas e Energia efetuar a mudança.
(Nota da redação: matéria alterada às 11:51 do dia 3 de fevereiro de 2017 para adequação de informação no 7º parágrafo)