O resultado da liquidação financeira das operações de dezembro no Mercado de Curto Prazo conseguiu desagradar até mesmo quem teve prioridade no recebimento de créditos pela venda de energia, caso de geradores termelétricos, de comercializadores e de grandes consumidores beneficiados por decisões judiciais. A inadimplência atingiu a 77,94% dos valores contabilizados e mostrou que pode levar tempo maior do que o previsto para que o mercado retorne à normalidade.
O presidente da Associação Brasileira de Geradores Termelétricos, Xisto Vieira Filho, afirma que o valor pago às empresas associadas foi insuficiente para cobrir os custos de geração das usinas. “Nós estamos bastante insatisfeitos com isso”, disse o executivo. Ele calcula em mais de R$ 1 bilhão o valor ainda pendente a ser pago às usinas térmicas.
Mesmo nos casos em que a Justiça determinou o pagamento, os agentes receberam valores parciais. Foram quitados R$ 1,10 bilhão, ou 22,06% dos R$ 4,98 bilhões em débitos contabilizados. Não houve recursos financeiros para repasse aos demais credores. A maior parte da fatura em aberto, de R$ 3,88 bilhões, é resultante de liminares que suspenderam o pagamento do custo do déficit hídrico das usinas, seja pelos devedores originais, seja por outros agentes que entrariam no rateio desse custo.
A Abraget pretende agir em duas frentes. Uma delas é a apresentação à Câmara de Comercialização de Energia Elétrica do resultado de um trabalho desenvolvido pela Thymos Energia sobre a situação dos geradores termelétricos. A associação também vai relatar o resultado da liquidação de dezembro ao juiz que determinou prioridade às térmicas no recebimento dos valores liquidados. “A gente quer estudar os números para fazer uma proposta à CCEE e ao juiz, porque a gente acha que tem meios de pagar mais, com recursos de outras contas”, explicou Xisto. Um das possibilidades já mencionadas pela Abraget é o uso da Contra Centralizadora de Recursos das Bandeiras Tarifárias, que é destinada a cobrir aumentos no custo de geração energia que estão sem cobertura tarifária ao longo do ano.
Para o presidente da Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais e de Consumidores Livres, Paulo Pedrosa, “esse processo da CCEE exemplifica a atual situação caótica do setor elétrico, em que a judicialização tem sido um instrumento de sobrevivência.” Pedrosa acrescentou que, apesar disso, “o diálogo com as instituições está preservado”, e que é possível “encontrar soluções estruturais”, “recuperar o setor elétrico e devolver competitividade à energia para que o setor produtivo não seja sacrificado.”
Uma das condições para que a liquidação de janeiro de 2016 transcorra sem problemas no mês que vem é a renúncia dos geradores às ações judiciais, no processo de adesão à repactuação do risco hidrológico. A Agência Nacional de Energia Elétrica corre contra o tempo para finalizar os processos de quem aderiu ao acordo de transferência de risco, ao mesmo tempo em que avalia a melhor solução para pedidos de parcelamento feito por grandes devedores, como a Santo Antônio Energia.
O presidente executivo da Associação Brasileira dos Comercializadores de Energia, Reginaldo Medeiros, lembra que, com a homologação dos acordos, a paralisação do mercado deixa de existir, porque os agentes devedores terão de cumprir os compromissos financeiros passados no mercado de curto prazo. “A liquidação de janeiro já vai contemplar a liquidação total do mercado”, acredita Medeiros.
Não há, por enquanto, consenso em relação ao parcelamento de débitos de valor elevado, na impossibilidade de pagamento integral dos débitos em atraso. Para o executivo da Abraceel, a solução cabe ao próprio mercado, pois não se trata de uma questão regulatória. “A nossa avaliação é de que não cabe esse tipo de decisão à Aneel porque os créditos não são referentes ao mercado regulado. São créditos privados líquidos e certos e isso tem que passar necessariamente pelo credor”, disse. Medeiros acredita, porém que se credores e devedores chegarem a um acordo de renegociação da divida, isso pode ajudar a destravar as operações.
Para Xisto Vieira, da Abraget, não faz sentido parcelar o valor da dívida, quando os geradores tiveram que bancar todo o custo do despacho das termelétricas. “Nós não vamos aceitar de jeito nenhum. A gente tem que receber à vista. O que é isso? As usinas térmicas não são banco pra fazer empréstimo”, reclamou o executivo.