Uma semana antes do término do prazo para a adesão dos geradores à repactuação do risco das usinas hidrelétricas, mais de duas dezenas de empreendimentos com contratos de venda de energia no mercado regulado haviam recebido autorização da Agência Nacional de Energia Elétrica para a assinatura dos termos que permitirão o repasse total ou parcial do risco ao consumidor. A insatisfação com as condições definidas pela agência para os contratos do mercado livre pode deixar, no entanto, boa parte ou a totalidade dos contratos no ACL fora desse acordo, segundo avaliação de empresários e especialistas do setor. Na ultima sexta-feira, 8 de janeiro, a Aneel desmentiu boatos de que haveria prorrogação do prazo de adesão, que termina no próximo dia 15.
“A gente tem expectativa de adesão bem reduzida ou até nenhuma mesmo”, afirma o consultor sênior da Thymos Energia, Renato Mendes. A consultoria tem assessorado alguns clientes com contratos para repactuação no Ambiente de Comercialização Regulada. A avaliação do especialista é de que no ACR a situação pode não ser ideal, mas, dentro do rol de opções ofertados ao gerador, é possível escolher um produto que se encaixe no valor que ele esteja disposto a pagar para transferir parte ou todo o risco do déficit de geração.
“Nosso grupo concorda com essa avaliação, porque, na verdade, o risco é pequeno”, afirma o coordenador do Grupo de Estudos do Setor Elétrico da UFRJ, Nivalde de Castro. Ele diz que os agentes que operam grandes usinas hidrelétricas ficam pouco expostos no mercado livre, porque não oferecem contratos no longo prazo. Grupos grandes e estruturados como a Tractebel e a CPFL, por exemplo, podem assumir um risco que não é tão grande porque têm um portfolio diversificado de fontes.
A quantidade de energia assegurada no mercado livre é maior que a do mercado cativo para as usinas participantes do Mecanismo de Realocação de Energia. São 27.034,26 MW médios ou 54,27% do total, contra 10.823,83 MW médios ou 21,73% do mercado regulado. Essa conta não inclui a garantia fisica dos empreendimentos que estão em sistema de cotas e já têm o risco hidrológico assumido pelas distribuidoras e pago pelo consumidor, caso das hidrelétricas com contratos renovados e de Itaipu.
Em princípio, todos os contratos do ACR fora das cotas e do ACL são passiveis de repactuação, o que poderia parecer, à primeira vista, que a maior parcela da garantia física elegível estaria no mercado livre. A Câmara de Comercialização de Energia Elétrica esclarece, porém, que essa aparente diferença entre o ambiente livre e o regulado é resultante da aplicação do Artigo 1º da Resolução Normativa 684. A norma determina que só poderão se habilitar para a repactuação do risco no ambiente regulado usinas cujos contratos de venda e de outorga tenham vigência mínima até 31 de dezembro de 2016. Por isso, parte desses contratos deve ser considerada pela CCEE como do ACL.
“Acho que a usina que tiver 100% dos contratos no ACL não vai repactuar”, opina o advogado Guilherme Baggio. Ele cita, porém, caso de usina com apenas 30% de contratos no ACR em que, mesmo assim, vale a pena repactuar. Uma das condições para a realocação do risco hidrológico é de que as empresas desistam de ações judiciais ou questionamentos administrativos em andamento ou futuros. O proprietário de uma usina com contratos nos dois ambientes que renegociar a alocação do risco em um deles terá que desistir de ações judiciais para aquele empreendimento, segundo a regra. Mas isso não compremete a decisão a respeito de outros projetos, já que a opção é por usina.
No Ambiente de Comercialização Livre, explica Mendes, o ativo regulatório exigido como contrapartida – a contratação de energia de reserva – nada tem a ver com o risco hidrológico em si. A Aneel trabalha com o conceito de proteção. “Em relação ao preço do mercado hoje, o hedge fica mais em conta que [com a contratação de] energia de reserva”, observa o consultor. Ele lembra que os contratos regulados têm prazo mais longo que os dos mercado livre, o que, por si só, dá condição ao empreendedor do ACL de fazer hedge com energia do próprio portfolio que esteja descontratada.
“Hidrelétricas mais novas como Santo Antonio e Jirau, se tiverem um participação relativamente alta no mercado livre, o que não deve ser o caso, não podem ficar expostas nesse mercado”, afirma Castro. Um dispositivo previsto na Lei 13.203, resultante da Medida Provisória 688, vai possibilitar a participação no próximo leilão A-5 de usinas existentes com menos de um ano de operação comercial, que podem vender energia descontratada a preços melhores, o que, na opinião do especialista, só corrobora a conclusão de que aderir no ambiente livre não é um bom negócio. O certame está previsto para 31 de março desse ano.
A lista das empresas que aderiram até agora no ACR inclui Tractebel Energia, que tem usinas importantes como Salto Santiago (PR-1.420,0 MW), Machadinho (RS-SC – 1.140,0 MW), Itá (SC-RS – 1.450,0 MW), Cana Brava (GO- 450,0 MW), São Salvador (TO- 243,2 MW) e Ponte de Pedra (MS-MT – 176,1 MW). Há também hidrelétricas importantes de outros empreendedores como Estreito (MA-TO – 1.087,00 MW); Foz do Chapecó (SC –RS – 855 MW), Lajeado (TO – 902,500 MW e Campos Novos (SC- 880 MW); além de várias pequenas centrais hidrelétricas como as de Arvoredo (SC – 13MW), Salto Góes (SC-20MW), Varginha (MG- 9MW) e Santa Luzia (SC – 28,5MW), da CPFL Renováveis.