O resultado da liquidação financeira do mercado de curto prazo referente às operações de julho e agosto é o reflexo da situação de descompasso que vive o setor. Com um não pagamento de 56,4% do total contabilizado para o período, sendo que 51,62% estava travado por decisões judiciais, o acordo é a única saída para que os demais processos de pagamento sejam diferentes. Apesar desse volume em aberto há quem veja o sinal como positivo ou negativo.
Na avaliação do presidente da Thymos Energia, João Carlos Mello, o que o setor viveu nesse período não é tão bom nem tão ruim. O lado positivo da história lembrou, é que o mercado funcionou mesmo diante dessas decisões judiciais. E o negativo é justamente o processo, plenamente justificado, de judicialização. Para ele, a liquidação e o sentimento do setor é o reflexo da demora em se obter um acordo sobre o tema que já vem sendo alertado desde o ano de 2014, quando o tema GSF começou a aparecer e que por um bom período não houve ressonância desse debate na Aneel ou no MME.
“A liquidação é importante para a segurança, pois precisamos pagar o combustível da geração térmica e a conta de energia de reserva. No outro sentido, cria uma situação que coloca o mercado parado e é ruim ainda mais em um momento em que o país tenta atrair o capital externo para investir um montante significativo”, destacou Mello.
Para ele a lição desse processo todo é que se deve resolver todo o problema, pois o setor elétrico não foi concebido para alcançar o limite do stress financeiro e de segurança de abastecimento, com contas impagáveis chegando aos agentes, para aí sim, depois entrar na discussão do problema.
O presidente executivo da Associação Brasileira dos Comercializadores de Energia, Reginaldo Medeiros, se mostrou confiante com o resultado da liquidação das operações acumuladas do MCP de julho e agosto. Segundo ele, esse sinal é positivo pois mostra que o mercado, apesar desse alto nível de valores que ficaram em aberto, pode funcionar mesmo diante da enxurrada de liminares que protegem das mais diversas formas os agentes do setor elétrico nacional.
“Essa notícia [a liquidação] é uma grande vitória, pois com uma situação como a que estamos vivendo e ainda assim liquidar o montante que é incontroverso e permitir que o mercado contine a funcionar é importante para a credibilidade. Dessa forma o mercado tem reflexos importantes no seu fluxo de pagamento e até mesmo na atração de investimentos”, avaliou Medeiros que lembrou ainda que foi a Justiça a responsável pelo travamento do mercado por conta das liminares.
Em sua opinião, é importante que o mercado continue funcionando e que não fazia sentido a paralisia vista e as incertezas que levaram até mesmo a um deságio no valor da energia negociada a um patamar nunca visto anteriormente de R$ 50/MWh. Com o resultado de inadimplência de 52% – já se considerando as liminares – uma nova paralisia dessas não deverá mais ser vista, até porque, indicou Medeiros, a CCEE, em sua opinião, teve muita habilidade nessa ocasião para que o mercado voltasse a funcionar.
Do lado dos grandes consumidores, a percepção sobre o atual momento ainda é de incertezas. Segundo a avaliação da coordenadora de energia da Abrace, Camila Schoti, o resultado dessa operação somente corroborou o cenário de preocupação dos associados da entidade com o futuro próximo. Segundo ela, essa situação de mais de 50% dos valores em aberto deixa um clima de insegurança, ainda mais nesse momento do ano, no qual as empresas trabalham no planejamento do próximo ano.
“O spread de R$ 50/MWh negativos que vimos é um sintoma de que o mercado está preocupado e a dificuldade de se enxergar o que acontecerá nos próximos meses traz uma incerteza que é muito ruim para o mercado”, disse Camila. “O resultado da liquidação continua a afetar o fluxo de caixa das empresas que têm créditos a receber”, destacou.
A coordenadora lembrou ainda que esses valores em aberto ocorrem em um momento delicado para a indústria, que vem registrando queda na produção e redução de competitividade. E que o acordo para o GSF, causa do impasse do setor elétrico, tem que ser sanado. Essa é a forma para que o cenário ideal, que é o retorno da normalidade do mercado, seja retomado.
Na última quinta-feira, 15 de outubro, a CCEE informou que a liquidação do MCP teve uma contabilização de R$ 4,27 bilhões sendo que foram efetivamente liquidados R$ 1,86 bilhão, uma inadimplência total de 56,4%. Segundo a Câmara, a inadimplência real, descontadas as liminares, ficaram em 4,7%.
Na lista de agentes vendedores que figuraram na lista da CCEE com ajustes de contratos apareceram cinco companhias. Dentre estas consta a CPFL Renováveis por meio da SPE que controla a usina solar de Tanquinho de 1 MW. Nesse caso, o presidente executivo da companhia, André Dorf, explicou que a presença deveu-se a um erro no envio do arquivo ao banco na hora de aportar as garantias financeiras, fato que foi corrigido assim que se percebeu o problema de um montante financeiro de R$ 2,7 mil.