O Tribunal de Contas da União realizou auditoria em Furnas para avaliar os instrumentos e mecanismos de planejamento, gestão e controle utilizados pela companhia em negócios estruturados sob a forma de Sociedade de Propósito Específico. A auditoria do TCU verificou que a empresa não possui política ou norma geral que oriente as subsidiárias quanto a padrões mínimos de planejamento, controle, gestão ou rentabilidade para os empreendimentos constituídos por SPE. O trabalho vem de um levantamento anterior sobre os riscos existentes no gerenciamento de Furnas sobre as SPEs.

O TCU determinou que Furnas regularize, em 90 dias, a situação das designações de representantes da estatal nas SPEs e elabore regulamentação interna sobre mecanismos de controle nos casos de SPEs em que sócios também atuam como fornecedores, além de outras medidas. O tribunal também recomendou que a Eletrobras tome ações para o fortalecimento da gestão das empresas do sistema quanto ao monitoramento das SPEs.

O estatuto da empresa prevê que a criação ou participação em sociedades depende de anuência do Conselho de Administração da Eletrobras. Furnas tem 81 SPEs em fase de implantação ou de operação. O total investido é de cerca de R$ 48 bilhões, dos quais Furnas responde diretamente por R$ 7,9 bilhões. Para os próximos anos, estão previstos R$ 2 bilhões em novos aportes a serem realizados pela estatal para as SPEs já constituídas, e ainda há projeções de investimento futuro de outros R$ 8 bilhões em leilões de energia. 

O tribunal também identificou fragilidades no gerenciamento das SPEs por Furnas. A seleção dos parceiros é feita por uma única área da estatal, sem regras centrais de controle e transparência. A forma com que os funcionários de Furnas são escolhidos para atuar nos conselhos diretivos das SPEs também chamou a atenção. Não há norma que estabeleça procedimento de seleção dos representantes. Cada funcionário da estatal cedido para as SPEs atua, em média, em 6,5 conselhos diferentes, existindo caso de funcionário representando a estatal, simultaneamente, em 29 cargos distintos. A remuneração média anual percebida por tais empregados é de cerca de R$ 40 mil, com valores de até R$ 134 mil.

O processo de indicação de conselheiros também não observou as exigências estatutárias de Furnas. Muitos empregados que exercem cargos nas SPEs não tiveram seu processo de seleção ratificado pela administração superior da empresa nem pela controladora. O tribunal constatou ausência de conselho fiscal em 24% das SPEs, ao contrário do que dita a legislação do tema. Se forem tomadas as dez SPEs de maior capital social de Furnas, com capital acima de R$ 900 milhões, seis não possuem conselho fiscal, nove não contam com auditoria interna, nenhuma dispõe de comitê de auditoria permanente, oito não têm código de ética e nenhuma detém regra sobre contratações de bens e serviços.

A fiscalização constatou, também, sócios privados atuando como fornecedores de SPE, a exemplo de 12 participações societárias em que eles eram contratados diretamente para prover bens ou executar obras para a parceria. Esses empreendimentos somam R$ 15,8 bilhões em investimentos, com participação direta de Furnas de R$ 5,8 bilhões. De acordo com o ministro relator do processo, Vital do Rêgo, quando um sócio pode influenciar decisão da sociedade que resulte ou possa resultar em ganho pessoal, sem prevalecer os desígnios institucionais da parceria, está-se diante de inegável caso de conflito de interesses. Dez SPEs tiveram redução nas taxas estimadas de rentabilidade e atrasos nas datas de operação. Para a maioria das SPEs, a estatal considera o investimento em sua carteira como se os cenários econômico-financeiros estimados no início da implantação não tivessem sofrido qualquer alteração. Há situações de grandes investimentos em que a deterioração da taxa de retorno estimada chega a mais de 50%.