A Agência Nacional de Energia Eletrica vai apresentar uma proposta detalhada de resolução que deve permitir finalmente aos geradores avaliar a viabilidade de adesão às condições de repactuação do risco hidrológico previstas na Medida Provisória 688. A quarta fase da audiência pública que discute o tratamento a ser dado ao risco assumido pela usinas participantes do Mecanismo de Realocação de Energia será aberta pela Aneel na terça-feira, 22 de setembro, na reunião pública semanal de diretoria da agência. “A gente vai colocar tudo: o prêmio, as taxas, a regra, como qualifica, quem é que se enquadra em cada ambiente – o regulado e o livre”, informou o relator do processo, Tiago de Correia, após reunião extraordinária nesta segunda-feira, 21.
 
A ideia, segundo o diretor, é trazer a redação final da proposta de regulamento. A regra deve incluir alguma diferenciação no prêmio de risco a ser calculado para as usinas que atuam nos mercados livre e regulado, dentro de uma regra única. Correia garante que houve avanços desde a discussão conceitual feita pelo órgão regulador com os agentes, nas fases iniciais da audiência. “Tem sido um processo de aprendizado. A gente está incorporando as contribuições”, disse.

Os geradores aguardam com expectativa o regulamento, que vai detalhar as condições e os procedimentos estabelecidos na MP para a transferência do risco de geração dos empreendimentos participantes do Mecanismo de Realocação de Energia para o consumidor. A medida prevê como contrapartida o pagamento de um prêmio a ser depositado mensalmente pelo empreendedor na conta das bandeiras tarifárias, no caso das usinas com contratos no Ambiente de Comercialização Regulada; e na Conta de Energia de Reserva, para aquelas com contratos na Ambiente de Comercialização Livre. A adesão dos agentes é voluntária. 

O processo conduzido pela Aneel não havia alcançado um nível de detalhamento que permitisse aos geradores fazer suas próprias simulações antes de decidir se seria viável a adesão ao modelo proposto. O mercado reconhece que o assunto é complexo e a solução reflete essa complexidade, mas cobra mudanças de caráter estrutural para que o aumento de custos provocado pela ampliação do déficit hídrico não volte a gerar problemas futuros, principalmente para projetos estruturantes como as hidreletricas Santo Antônio, Jirau e Belo Monte.

A discussão já passou da fase conceitual, mas as associações que representam os geradores questionam alguns princípios que tem orientado o trabalho da agência. Não há consenso, por exemplo, em relação ao prêmio de risco. A Associação Brasileira dos Produtores Independentes de Energia Elétrica rejeita a ideia de que é aceitável usar a previsão legal de redução de 10% da garantia física das usinas para calibrar a redução das receitas, em razão do pagamento do prêmio, que “deve ser estabelecido exclusivamente com base no valor esperado do deslocamento hidroelétrico.”

Para a Associação Brasileira de Geração de Energia Limpa,  esse valor é questionável porque o desconto a ser dado pelo gerador é muito elevado. A entidade que representa as pequenas centrais hidrelétricas avalia que a preocupação da Aneel é maximizar as adesões ao acordo com uma proposta que permita isso, e não necessariamente encontrar um valor mais justo. 

Os geradores hidráulicos pedem também o expurgo do que consideram alocação indevida de riscos não relacionados à hidrologia, provocada por fatores como a geração termelétrica fora da ordem de mérito de custo; a inserção de energia de reserva e a importação de energia. O assunto já está sendo tratado pela Aneel, que abriu audiência pública após determinação judicial, em liminar obtida pela Associação Brasileira dos Investidores em Autoprodução de Energia. Para garantir que esses custos não serão considerados na definição do prêmio de risco, a Abiape sugeriu uma emenda à MP 688, que prevê a retirada desses parâmetros de risco.

Outra sugestão dos agentes é de que na questão da sazonalização dos contratos seja mantido o direito do gerador de distribuir a garantia física ao longo do ano da forma que ele considerar mais eficiente, inclusive para a mitigação de riscos. “Para aquelas parcelas de garantia física do ambiente regulado que aderirem à repactuação, novas regras poderão ser discutidas desde que não se insira novos riscos aos geradores”, sugere a Apine em sua contribuição.

A Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica aponta a necessidade de adequação do Decreto 8401, que criou a Conta Centralizadora dos Recursos da Bandeira Tarifária, à MP 688. Para a Abradee, a repactuação do risco prevista na medida provisória não deve trazer perdas adicionais às empresas de distribuição e, por isso, terá de se considerar o compartilhamento de riscos extraordinários entre distribuidoras e geradoras.

A associação sugere aprimoramentos no sistema de bandeiras, para mitigar as diferenças entre receitas e despesas. De janeiro a junho, as receitas das bandeiras tarifárias chegaram a R$ 6,8 bilhões e as despesas adicionais das distribuidoras a R$ 8,6 bilhões. Caso os acordos de transferência de risco tivessem sido assinados no início do ano, a rubrica do risco hidrológico chegaria a R$ 6 bilhões, e o degrau de receita entre o acionamento das bandeiras passaria de R$ 800 milhões mês para R$ 1,3 bilhão por mês, argumenta a Abradee. Para a entidade, no entanto, “sempre haverá o descasamento entre receitas e custos do risco hidrológico, em especial, sendo as diferenças carregadas nas CVAs das distribuidoras” como despesas financeiras. Para mitigar os impactos econômicos do aumento dos custos da Parcela A (compra de energia, encargos, etc.), os distribuidores reforçam a necessidade de desconsiderar o risco hidrológico do cálculo das perdas não técnicas das concessionárias e de recalculo da base de calculo do índice de inadimplência na revisão, para que ele reflita de forma adequada o aumento da Parcela A e as variações de custo (CVA), além das receitas das bandeiras.