A população da região Nordeste do Brasil estaria atualmente racionando energia elétrica caso não tivesse a geração eólica para atender a demanda, afirmou Maurício Tolmasquim, presidente da Empresa de Pesquisa Energia. Os reservatórios hidrelétricos da região estão com 18,22% de sua capacidade, reflexo de uma das piores hidrologias já evidenciadas na história do país. “Não tenho dúvida nenhuma: se não tivéssemos a eólica hoje estaríamos racionando energia no Nordeste. Isso é um fato”, disse o executivo responsável pelo planejamento do setor elétrico brasileiro durante participação no Brazil Windpower, no Rio de Janeiro.
Segundo o Operador Nacional do Sistema, de janeiro de 2014 até junho de 2015, as eólicas no Nordeste geraram o equivalente a 34% da capacidade de armazenamento máximo da região ou 50 mil MW médios. “Para você ver a importância dessa complementariedade”, comentou Hermes Chipp, diretor geral do ONS. Defensor convicto da geração térmica, Chipp admitiu que mudou de opinião em relação à geração eólica e foi aplaudido pela plateia presente no maior evento do tipo realizado na América Latina. “No início, até por considerar a segurança, era de certa forma adversário da energia eólica. Hoje estou surpreso. No dia 11 de agosto, o fator de capacidade eólico foi 80%, enquanto a média mundial é 40%. Essas constatações estão me fazendo realmente mudar de opinião.”
Para o presidente da Chesf, José Carlos de Miranda, não restam dúvidas que o desenvolvimento da geração eólica no Brasil é sustentável e vai continuar crescendo. “Até porque depois da hidrelétrica é a fonte mais competitiva”, lembrou o executivo, ponderando que essa maior penetração vai exigir uma adaptação na forma de operação do sistema elétrico brasileiro. Chipp informou que o ONS tem interagido com operadores internacionais e dialogando com a Agência Nacional de Energia Elétrica para que sejam criados mecanismos que permitam a eólica também contribuir com a segurança do sistema.
O presidente do Conselho de Administração da ABEEólica, Márcio Severi, comentou que o observado no Nordeste foi porque a região concentra o maior volume de usinas. Mas à medida que a capacidade instalada de energia eólica for aumentando gradualmente, essa maior segurança em relação ao atendimento da demanda também poderá ser evidenciada em outras partes do país. “Estamos com 7 GW em operação e temos ainda 11 em construção. Num futuro próximo, vamos também começar a perceber essa diminuição de riscos para o Brasil.”Hoje o risco de desabastecimento de energia no Nordeste é nulo. “Essa complementaridade que a gente sempre defendeu aconteceu e está se tornando visível. Sentimos isso no sistema e vamos sentir mais nos próximos anos.”
Severi, que também é diretor de Relações Institucionais da CPFL Renováveis, ponderou que alguns desafios precisam ser superados para que o setor mantenha seu ritmo de crescimento. Ele listou aspectos como financiamento, transmissão e mão de obra como gargalos a serem administrados pelos agentes e pelo poder público. “Se a gente vai passar por um modelo de no futuro uma participação menor do BNDES, que isso aconteça de uma forma gradual, de modo que os agentes consigam se adaptar a essa nova realidade”, disse em referência a um potencial risco de financiabilidade do setor. “O que o empreendedor espera é que não se mudem as regra de uma forma abrupta.”
A falta de atratividade dos leilões de transmissão também preocupa os agentes. Para Severi, o governo precisa olhar para outras alternativas para garantir o escoamento da energia eólica. “Inventar alguma coisa nova que possa onerar um pouco a transmissão, mas salvar o resto da parcela da energia. Não só no megawatt hora produzido pela eólica, mas por todo benefício que ela traz para o sistema. É muito preciosismo a gente ficar apertando o setor de transmissão como estamos fazendo, ainda mais nesse ambiente econômico”, advertiu.
Severi ainda alertou para a escassez de mão de obra. “Com 7 GW em operação e mais 11 GW em construção, hoje a gente tem uma demanda de mão de obra muito grande. As empresas estão disputando os profissionais. É um desafiado para o setor eólico, mas uma boa oportunidade para o Brasil. Precisamos formar muita mão de obra. Já tem alguma iniciativa nesse sentido, mas precisamos reforçar.” Segundo o executivo, o setor não dispõe de uma oferta suficiente de profissionais qualificados para construir e operar todos os parques em desenvolvimento de forma adequada e avisou que ainda vai ter muito emprego sendo criado pela energia eólica.