O anúncio do Programa de Investimentos em Energia Elétrica, realizado nesta terça-feira, 11 de agosto, pelo governo não foi visto com grande surpresa pelo setor que considerou uma nova roupagem para empreendimentos já conhecidos. Mas, consideraram positivo o fato de que o setor passou a agregar os planos sob um mesmo guarda chuva específico para o setor elétrico. Esse movimento indica que este setor terá prioridade, o que pode levar à atração de mais investidores privados em um momento delicado para a economia nacional.

O PIEE prevê a realização de pelos menos três leilões de energia por ano, nas modalidades A-3, A-5, de Fontes Alternativas e de Energia de Reserva, e, apesar das dificuldades de licenciamento, aposta na inclusão em futuros certames de empreendimentos como as hidrelétricas São Luiz do Tapajós, a maior do pacote de obras, com 8.040 MW, e Jatobá, com 2.338 MW, ambas no rio Tapajós.

Os R$ 116 bilhões em investimentos em geração a serem contratados até 2018 e nos anos subsequentes serão divididos entre projetos de hidrelétricas (11 mil MW); pequenas centrais hidrelétricas (1 mil MW a 1,5 mil MW); usinas eólicas (entre 4 mil e 6 mil MW); empreedimentos de fonte solar (3,5 mil a 4,5 mil MW); térmicas a biomassa (2,5 mil MW), a carvão mineral e a gás natural (3 mil a 5 mil MW). Apenas São Luiz tem investimento estimado em R$ 26 bilhões, enquanto Jatobá deve consumir R$ 10 bilhões, pelos cálculos do governo.

As obras de transmissão incluídas no PIEE formam um conjunto de instalações com estudos já concluídos (23,8 mil km) ou andamento (13,8 mil km). Parte delas estão nos leilões de agosto, outubro e dezembro de 2015. Outras devem ser ofertadas em certames previstos para 2016, como o sistema de transmissão do complexo hidrelétrico do Tapajós; reforços no Sudeste e no Sul para recebimento da energia gerada nesse complexo; expansão da interligação Sul-Sudeste; reforços no Nordeste e Sudeste para escoamento de energia eólica e solar e instalações para atendimento ao estado do Amazonas e reforços do sistema Manaus.

A avaliação do presidente da Associação Brasileira dos Investidores em Autoprodução de Energia, Mário Menel, é de que o programa "dá roupagem nova a uma coisa que já existia", mas melhora o ambiente de negócios do setor, ao sinalizar para uma maior interação do governo com o setor privado. Menel que também ocupa a função de coordenador do Fórum das Associações do Setor Elétrico, lembra que a possibilidade de um bom diálogo com o ministro de Minas e Energia, Eduardo Braga, agrada os investidores. Outro aspecto positivo apontado pelo executivo foi a sinalização da presidente Dilma Rousseff de que é preciso pensar no longo prazo as ações do setor. "Você não trabalha com a energia do amanhã imediato. A gente tem que olhar o país numa perspectiva de cinco, dez anos à frente. E esse sinal está sendo dado", acredita Menel.

Contudo, o presidente da Abiape defende a criação de novos mecanismos de financiamento, agora que BNDES diminuiu sua capacidade de financiar. "Achamos que isso não é uma coisa ruim. Pode ser positiva, porque abre novas fontes e perspectivas, como a composição de empresas com e sem direito a voto", observa. Para Menel, o licenciamento ambiental é outro ponto que está sendo muito bem tratado no programa anunciado hoje.

Essa avaliação de Menel é corroborada por consultorias do setor. A Thymos Energia aponta que o PIEE veio para mostrar que há a intenção de se priorizar a expansão da capacidade de geração e transmissão para o setor privado. "Todo mundo sabe que o governo está sem dinheiro para investir e por isso precisa atrair o capital privado, seja ele nacional ou internacional. Então, com o programa ele quer mostrar que há atratividade para os investidores no Brasil. Isso vai na contramão do cenário econômico nacional onde temos a fuga de investidores ainda mais porque a Eletrobras está sem o fôlego de cinco anos atrás para investir em novos projetos", disse o consultor Marcelo Ajzen.

Paulo Cunha, consultor da FGV Energia, disse que esse plano de investimentos de R$ 186 bilhões não apresenta novos elementos, mas propicia maior visibilidade ao setor elétrico e mostra que há esforços do governo federal em continuar a expansão da oferta de energia no país. "Esse plano é positivo por sinalizar que o governo prioriza o setor, apesar de não ser clara a forma que será dada essa priorização", avaliou o consultor.

Outro ponto que Cunha destacou foi a questão de se criar o fast track para o licenciamento ambiental no setor, que tem sido um dos pontos que tem levado a dificuldades para a execução dos empreendimentos. Esse processo, disse ele, é complexo e envolve diversos agentes e interesses difusos. Por isso, apesar da sinalização, os resultados deverão ser vistos mais no médio prazo pois sua evolução é gradativa e precisa ser aprimorado sem deixar de lado a robustez dos estudos que devem ter qualidade para evitar retrabalhos e evitar atrasos, tanto do lado dos investidores quanto da atuação dos órgãos ambientais, que devem ser aprimorados.

O presidente da Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica, Nelson Leite, também destacou a questão ambiental. "Eu acredito que essas condições serão trabalhadas na medida em que forem colocadas as regras para os leilões, porque aqui é o lançamento de um programa, mas ainda tem que trabalhar nos detalhes para que as condições dos leilões sejam implementadas", afirmou Leite. O executivo da Abradee lembra que essa questão tem se tornado cada vez mais séria porque a obtenção das licenças leva muito tempo. "Os empreendedores reclamam que fica difícil cumprir o cronograma de obras, na medida em que os processos de licenciamento e as condicionantes tornam-se cada vez mais rigorosos", disse. Leite avalia que em linhas gerais o governo tem demonstrado ao setor empresarial que está disposto a respeitar contratos para atrair os investimentos necessários à segurança energética.

Um reflexo dessa avaliação pode ser medida por meio de manifestações de diversos stakeholders do setor. A Cemig, por exemplo, se manifestou interessada. O presidente da estatal mineira, Mauro Borges Lemos, elogiou o plano desenvolvido pelo MME e disse que vai estar atento ao detalhamento das condições regulatórias nas quais os projetos serão apresentados. "O programa é fundamental, são investimentos completamente gigantescos e a Cemig vai estar muito atenta, pois é de nosso interesse se houver algum detalhamento nas condições em que esses investimentos serão oferecidos", comentou em comunicado.

No setor de fornecimento de equipamentos a manifestação veio da Associação Brasileira das Indústrias Eletroeletrônicas. O presidente executivo, Humberto Barbato, destacou que o plano anunciado vem em um bom momento e deve trazer oportunidades para as indústrias do setor que ele representa e que estejam instaladas no Brasil. "Esta sinalização do governo é positiva e os investimentos podem representar verdadeiras alavancas para que o país possa superar o atual momento de dificuldades", disse. Barbato destaca também o fato de o Brasil reforçar a opção pelas energias renováveis, mas conferindo uma maior diversificação de fontes.

Nesse sentido até a caçula das fontes em participação de leilões no Brasil, a solar fotovoltaica está representada no PIEE. Para o diretor executivo da Associação Brasileira da Energia Solar Fotovoltaica, Rodrigo Lopes Sauaia, o volume de contratação apresentado pelo governo para a fonte, entre 2GW e 3 GW até 2018, demonstra um forte interesse pela energia gerada a partir do sol. "Contudo, pequenos ajustes são necessários, em especial, um alinhamento da política de contratação com as metas de atração de cadeia produtivas estabelecidas pelo BNDES. A Absolar entende que é necessário aumentar um pouco essa base de cálculo para pelo menos 1GW por ano. Além disso, a nossa recomendação é de que nos próximos estudos a geração distribuída possa ser computada no modelo, direta ou indiretamente", avaliou.