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As reformas que o governo federal prepara são aguardadas com expectativa pelo mercado. Não se esperam inicialmente grandes intervenções até porque é necessária a participação do Congresso Nacional nas discussões por haver a necessidade de dispositivos que regulem diversos aspectos das alterações. Mas discutir as mudanças não é apenas iniciativa que vem do poder central para o mercado. O Instituto Acende Brasil está desenvolvendo um projeto de P&D que será apresentado em seu evento bienal, o Brazil Energy Frontiers 2017.

De acordo com o presidente da entidade, Claudio Sales, será apresentada uma nova arquitetura para o modelo, que será baseada na oferta de preços por parte dos agentes. Um caminho que é visto em vários países do mundo.

Sales conta, em entrevista à Agência CanalEnergia, que vê com otimismo as alterações que vêm sendo implantadas no setor, tais como o posicionamento para a Eletrobras, quebrada no ano passado e que vem se recuperando após anos de pressão política e destruição de valor. E defende, ainda, a privatização das empresas como uma forma de garantir a perenidade das operações sem onerar a sociedade brasileira, uma vez que é esta quem paga pela ineficiência das estatais. Veja a seguir os principais trechos da entrevista:

Agência CanalEnergia: O Instituto Acende Brasil promoverá novamente o Brazil Energy Frontiers em um momento de grandes discussões sobre o modelo setorial brasileiro. O que está no escopo do evento este ano?

Claudio Sales: Essa será a quarta edição. O evento esse ano se propõe a apresentar uma nova arquitetura de mercado.  Hoje, o setor elétrico é ancorado nos parâmetros da operação centralizada, com base em modelo computacional. O PLD é derivado dessa modelagem e os agentes não operam suas usinas, cujos contratos são de longo prazo. Pois bem, vamos apresentar uma nova arquitetura onde a nossa visão é de não ser mais isso. Os agentes devem tomar a sua decisão com base em um arcabouço de regras de oferta de preços individuais. Isso envolverá a adoção de opções (puts e calls) e uma outra visão que está sendo observada no mundo inteiro: liquidação diária, produtos no day ahead e ofertas com antecedência, bem como a programação do dia com base nessas ofertas, mas obviamente com ajustes diários e intraday. Apresentaremos um debate acerca do tema com a experiência internacional do professor Alfredo Garcia, convidado como palestrante, vindo da Universidade da Florida, e um estudo que estamos desenvolvendo como projeto de P&D para ajudar a construir a visão desse desenho. E nosso objetivo é o de responder à questão de como deve ser redesenhado o mercado de energia elétrica no Brasil.

Agência CanalEnergia: Qual é a expectativa quanto à reforma que o governo planeja para o modelo setorial que vem se falando há alguns meses?

Cláudio Sales: Essa é uma medida que está sendo gestada há algum tempo no governo e a expectativa é de que teremos em breve a publicação dessa nota técnica que será colocada em consulta pública. Serão analisadas questões que requerem mudanças legislativas e isso depende da tramitação do Congresso e não há prazo para essa avaliação. Nossa expectativa é positiva e sabemos do empenho dessas pessoas virtuosas que estão à frente do ONS, da EPE e do Ministério e que trabalham para reposicionar o setor. Apesar de jovem, a história vem provando que o Ministro tem acertado na escolha das pessoas que colocou e na liderança que ele tem implementado. Temos que ter como objetivo blindar o setor da interferência política que temos visto para que continue avançando. Temos exemplos de problemas sérios na geração, transmissão e distribuição, além da situação da liquidação financeira do mercado de curto prazo. Tudo acaba sendo herança da MP 579, que desajustou o arcabouço regulatório. Esperamos que nessa nota técnica tenhamos a direção que o governo pretende seguir.

Claudio Sales, do Instituto Acende Brasil

Agência CanalEnergia: Acredita que todos esses pontos devem vir logo de uma vez nesse texto?

Cláudio Sales: Não se espera que venha um modelo detalhado na proposta, mas que traga a correção de rumo, indicação de um norte diferente que contenha mecanismos que sejam regulados posteriormente por outros instrumentos. E, em linhas gerais, na nossa visão, deve abrigar duas coisas: a primeira é equacionar melhor a vulnerabilidade que temos hoje quanto aos diversos problemas em GTDC; e, a segunda é direcionar diversas questões que deem aos agentes a capacidade de administrar seus próprios riscos, inclusive para os consumidores. Essa é uma corrida contra o relógio pois, do jeito que está o setor, vivemos em uma insegurança grande e falta sustentabilidade. A questão da liquidação é um dos exemplos. Há uma série de pontos que a medida deve endereçar, mas é preciso respeitar os contratos que estão vigentes. Ou seja, não tem coisa simples a ser feita no setor elétrico.

Agência CanalEnergia: Daqui a um ano estaremos em plena corrida eleitoral. Há tempo para isso?

Cláudio Sales: Não sei se em um ano será possível, mas o governo está empenhado em avançar. Essa turma que está aí é muito capaz e o Ministro tem se mostrado um grande líder. Temos que aproveitar esse momento virtuoso do setor, com disposição ao diálogo, pois representa um contraste com o que tivemos nos últimos anos.

Agência CanalEnergia: Apesar dos defeitos que hoje estão aí, o atual modelo setorial teve suas virtudes?

Cláudio Sales: Houve um crescimento sim do setor elétrico, mas não podemos esquecer que esteve baseado mais na expansão da economia, o que acabou disfarçando a ineficiência do setor. De bom tivemos a introdução dos leilões de energia, que trouxeram sim uma revolução positiva, pois até então havia sérias dificuldades, inclusive a falta de incentivos para investimentos em expansão, e os leilões vieram e equacionaram esse problema. Os números são expressivos, mas com esse crescimento vieram também projetos que não se sustentavam e projetos com participação forte da Eletrobras, onde não raramente víamos a destruição de valor da empresa.

Agência CanalEnergia: A Eletrobras vem passando por um processo de mudanças que envolve privatizações e redução de tamanho. Como o senhor vê essa iniciativa?

Cláudio Salles: O caso da Eletrobras é um espetáculo, com toda essa mudança na empresa desde que o atual presidente assumiu. Os números apresentados do que era a empresa um ano atrás e o que temos agora mostram a evolução. Mas, mesmo com o atual momento, não se pode considerar a partida ganha, pois ainda há grupos de pressão que, a bem da verdade, são os grandes responsáveis pela destruição de valor da companhia. Esses grupos são o grande empecilho às mudanças na empresa e não podemos menosprezá-los porque têm muita força e estão representados pela política sindical na qual o Brasil foi colocado.

Agência CanalEnergia:  A empresa estatal é tão ineficiente assim? Como é que se pode verificar o impacto desse aparelhamento político em uma estatal ante uma empresa da iniciativa privada?

Cláudio Sales: Um exemplo da diferença entre a eficiência estatal e a privada pode ser apontado com a privatização da geração da Eletrosul em 2002, que foi segregada e chamada de Gerasul. Essa parte representava 5% do tamanho da Eletrobras em 1998. Então, de lá para cá, essa empresa mudou de nome e hoje é o que conhecemos como Engie, uma empresa privada que cresceu e hoje é maior que a Eletrobras em valor de mercado. Ou seja, o que era apenas 5% da Eletrobras, hoje é quase 1,2 vezes o tamanho da empresa de onde foi segregada. Isso mostra que o modelo que está aí é um desastre por conta de seu uso político no grau mais elevado, pois está baseado em políticas sindicais que são inegavelmente destruidoras de valor para a sociedade. Daqui para a frente, esperamos que os marcos mais relevantes apareçam com a privatização das federalizadas e esperamos os próximos passos com o formato da venda das distribuidoras da Eletrobras. Se não for possível vender as seis distribuidoras, sejam vendidas quatro pelo menos.

Uma empresa tem que ser geradora de valor. É um absurdo o que aconteceu na Eletrobras e a sociedade tem que apoiar a holding, que precisa buscar ser virtuosa, e não destruidora de valor. Uma empresa tem que ser criadora de valor. Se não for, a privatização aparece como solução mais óbvia e eficiente para o tratamento dessas questões. E as empresas que não forem privatizadas devem implantar um modelo de eficiência para que sejam mais bem geridas do que hoje. Um dos aspectos a evoluir é que o corpo de funcionários deve ter em mente que sua remuneração deve ser de acordo com sua eficiência, tornando perene essa política. Até porque hoje a diretoria é uma, mas pode mudar, pois estamos falando de uma estatal que, por definição na literatura econômica, é apontada como menos eficiente que uma empresa privada, pois seu objetivo é indefinido.

Enquanto a privada tem esse objetivo claro, que é gerar valor para o acionista, a estatal fica com a discussão sobre qual deve ser seu foco em função de sua “presença estratégica” para o país ou “função social”. Isso acaba desviando o foco. Além disso, não podemos esquecer do uso político, inchaço e burocracia, que levam à ineficiência e não permitem que a estatal tenha a agilidade de uma empresa privada.

Agência CanalEnergia: Um ponto que é questionado é o valor de venda das empresas privatizadas no passado, onde se apontava um valor considerado baixo pelas companhias que hoje valem muito mais…

Cláudio Sales: Isso mais que comprova a tese de que a iniciativa privada é muito melhor para a sociedade que a estatal. Esse é o lado virtuoso. As empresas no passado foram vendidas por um valor e, ao longo dos anos, foram pagando imposto e mostraram que são eficientes. Há vários exemplos no setor elétrico e em outras áreas.

Por: Maurício Godoi, da Agência CanalEnergia, de São Paulo

(Nota da Redação: matéria alterada às 13:27 horas do dia 29 de junho de 2017 para adequação do texto)