Entre as propostas colocadas para modernização do setor, estão as chamadas “medidas de destravamento”, cujo objetivo é dar mais dinamismo ao setor e aproximar as realidades da operação e do mercado. Um dos pontos de mudança é a questão de contratar 100% da previsão de demanda do consumidor. Pela proposta, o Ministério de Minas e Energia poderá reduzir a obrigação de contratação a percentual inferior à totalidade da carga.

Essa medida vai levar a separação de lastro e energia. O primeiro tem a ver, segundo o documento, com a confiabilidade do suprimento, que é um bem comum; o outro é questão de gerência descentralizada do risco de mercado, que é um bem privado e pode ser feito por meio da gestão individual de cada agente.

Para o  secretário-executivo do MME, Paulo Pedrosa, a criação do mercado de capacidade separa de maneira muito clara as duas coisas. “Se alguém quiser se arriscar na energia, vai poder se arriscar. Agora, na questão da segurança do sistema, que é uma responsabilidade coletiva, o governo vai ter que trabalhar e apresentar uma proposta”, explicou Pedrosa, em entrevista nesta quinta-feira, 6 de julho.

O secretário destacou que a ideia da proposta lançada em consulta pública é destravar mecanismos. O MME vai formar grupos de trabalho e trazer o mercado para discutir com o governo todos os pontos apresentados. “Aí teremos uma série de decretos em que vamos detalhar cada um desses modelos. Tudo isso vai ser feito com calma.” O novo modelo pretende levar a uma aproximação entre a formação de preço e a operação. Para isso, as propostas tornam possível ao sistema trabalhar com modelos de despacho centralizado por custo ou por ofertas de preços dos agentes. Nesse último caso, seriam necessários mecanismos de monitoramento de mercado para combater práticas lesivas à concorrência.

Mas o Ministério de Minas e Energia assume como pilares das medidas dois pontos: a utilização de preços com intervalo máximo horário até 2020, como elemento de coesão para um mercado mais liberalizado que independa da opção de despacho; e abertura de códigos e algoritmos de ferramentas computacionais de suporte à formação do preço, ao planejamento e à operação.

Essas alterações também mexem com o papel do Mecanismo de Realocação de Energia. “A proposta é destacar o caráter eventual de um mecanismo dessa natureza, uma vez que um modelo de oferta de preço, por exemplo, poderia tornar esse mecanismo disfuncional ou desnecessário”, afirma o texto. O fechamento de posição passaria a ser diário mediante aporte de garantias, o que reduziria o risco de inadimplência nas liquidações. Para o governo, esse fechamento diário estimula a contratação antecipada e é mais compatível com a definição de preço pelo horário.

A operação diária do mercado associada a uma nova modelagem de garantias financeiras e à definição da fronteira entre atacado e varejo são vistos pelo governo como elementos fundamentais para a eventual criação de uma bolsa, com negociações padronizadas e funções de liquidação (clearing house). A bolsa pode contribuir para alternativas de expansão do sistema diretamente pelo ambiente livre; aumentar a credibilidade dos preços; retirar pressão sobre a obrigação de contratação de energia como ferramenta de segurança e tornar ainda mais sustentável a separação de lastro e energia como ferramenta principal de confiabilidade sistêmica.

Também está aberta a revisão dos custos de transação na transmissão e geração. Um dos destaques é a liquidação centralizada da transmissão, desde que isso resulte em redução de custos sistêmicos. Essa centralização seria feita na Câmara de Comercialização de Energia Elétrica. A proposta do governo é enfática em afirmar que a centralização só é válida se houver redução de custos, não sendo realizada se não houver benefício para o sistema. A centralização seria obrigatória apenas para as instalações contratadas após a criação da centralizadora e facultativa para as existentes.

Segundo a proposta, além de reduzir custos, a centralização dos contratos de geração permite uma administração mais eficiente dos contratos, permitindo compensações instantâneas de posições contratuais das quantidades demandadas pelas distribuidoras e distribui melhor os efeitos de eventuais reduções das energias compulsórias ou da aplicação de mecanismos de alívio de sobrecontratação. A CCEE, de novo, poderia atuar como centralizadora, se não houver aumento de custos.

O governo vê a separação de lastro e energia não como solução para financiabilidade da geração, mas para a organização da compra da confiabilidade sistêmica e valoração clara das contribuições do gerador às diferentes necessidades do consumidor.