A separação entre lastro e energia está no topo das preocupações de geradores com financiamentos junto ao BNDES. A questão preocupa os investidores justamente pelo fato de que os contratos são usados como a garantia dos empréstimos para a expansão do sistema em projetos de energia nova. Essa é a percepção que os especialistas em energia do escritório ASBZ Advogados, Daniel do Valle e Rafael Janiques. O principal problema dessa proposta que consta da consulta pública no. 33 do Ministério de Minas e Energia é como ficará a questão dessa financiabilidade, pois vender somente o lastro não garante o projeto do ponto de vista financeiro.
“Hoje, discutir a financiabilidade dos projetos é a principal preocupação do setor elétrico. Essa separação de lastro e energia afeta diretamente o negócio dos geradores. Precisamos tomar cuidado de como será tratado o tema. E mais, cada segmento de geração tem um nível de preocupação. Essa consulta é bastante abrangente e muda a base do setor e elétrico que atualmente é um Frankenstein dela mesma com todas as mudanças que foram acrescentadas ao longo do ano”, comentou Janiques em referência à coexistência do regime de cota, geração para o mercado livre, entre outros pontos.
Por isso, os advogados afirmam que o momento seria propício para que o setor encarasse um novo acordão para zerar as pendências e começar tudo de novo. Valle lembra que esse tipo de ação já ocorreu no país em um passado não tão distante, mas admite que hoje essa medida seria mais complexa de ser tomada uma vez que o setor aumentou em tamanho e em volume de agentes, inclusive, com investidores internacionais que dificilmente veriam com bons olhos essa tentativa de remodelagem do setor.
Apesar disso, o acordão ainda é considerado o mais viável mesmo com questões complexas que podem trazer insegurança aos investidores que é essa questão da mudança de contratos já firmados com os agentes. Essa instabilidade pode afetar a confiança, e assim, o país traria uma instabilidade jurídica que é vista com aversão por investidores com perfil mais conservador.
“O governo precisa ter força política o que não se mostra atualmente”, Daniel do Valle, especialista em energia do escritório ASBZ Advogados
E por conta desse perfil conservador, a depender do caminho que a consulta tomar, podemos passar por períodos de incertezas já que se espera uma medida provisória derivada dessas discussões. O problema é que uma MP tem data de validade e precisa passar pelo crivo do Congresso Nacional e o momento político que o governo passa não é visto pelos advogados como muito favorável. “O governo precisa ter força política o que não se mostra atualmente”, comentou Valle.
E acrescentou Janiques, “o legislativo deveria liderar essas discussões, como está partindo do governo podemos ter a alteração de um marco regulatório com prazo de validade. E se o Congresso não aprovar a medida pode durar 120 dias apenas, o Brasil viraria uma piada diante dos investidores”.
A opinião dos especialistas é de que há a probabilidade de a consulta pública não apresentar as soluções pra todas as questões que estão ali colocadas. Isso porque classificam o sistema elétrico nacional como o mais complexo do mundo, o que dificulta tomar uma decisão que afete tão profundamente o setor como a CP está propondo. Nesse sentido estão as discussões acerca dos subsídios cruzados e a sua eliminação, a quebra de contratos que pode ocorrer com a descotização das usinas, a abertura do mercado livre até 2023 para consumidores de até 75 kW de carga.
Segundo eles, o governo precisa tratar os contratos e sua titularidade quando o mercado livre abrir e as distribuidoras não tiverem mais a demanda que contrataram no passado, mas lembram que o respeito a esses instrumentos deve ser perseguido. Pode existir a quebra unilateral dos acordos, mas que isso é ruim para a segurança jurídica. E ainda voltam ao ponto da preocupação da quebra de contrato entre o gerador e a distribuidora que é a garantia do financiamento dos projetos de expansão do atual modelo. O encerramento dos subsídios podem afetar os geradores também porque no cálculo de venda de energia, principalmente nas fontes renováveis há essa variável considerada. Enfim, comentaram, há um alto nível de detalhamento que deverá ser considerado e que abre espaço para mais um bloco de judicialização no setor.