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A decisão do governo federal em reduzir sua participação na Eletrobras é vista como uma decisão positiva para a gestão da companhia. Apesar de ainda não se ter o conhecimento de como será a venda das ações da estatal, altos executivos do setor elétrico apontam que a companhia deverá ganhar mais agilidade, gestão profissional e deixará os vícios que caracterizam uma empresa que sofre influências e pressões políticas e fisiologismo. Contudo, pelo que se tem até o momento, a indicação é de que diferentemente da onda de venda de ativos da década de 1990 no setor, essa venda deverá pulverizar o capital da empresa e não deverá ser uma negociação para a transferência do controle. O tempo para que o governo efetue essa venda é colocada como um possível impeditivo.

Na avaliação de José Luiz Alqueres, ex-presidente do conselho da estatal, o fato é positivo no sentido da empresa, segundo suas palavras, voltar a ser a líder que era no passado. Contudo, destacou que o processo de privatização apenas como forma de buscar recursos para contemplar o buraco do orçamento da União, que este ano e em 2018 está projetado em quase R$ 160 bilhões é algo condenável.

O processo de privatização apenas como forma de buscar recursos para contemplar o buraco do orçamento da União, que este ano e em 2018 está projetado em quase R$ 160 bilhões é algo condenável, José Luiz Alqueres, ex-presidente do Conselho de Administração da Eletrobrás.

Dos ativos que hoje formam a estatal, Alqueres sugere que fosse feita a venda de blocos regionais, ou seja, as sua subsidiárias para cada região do país, à exceção da Chesf por conta da importância da gestão da água na região Nordeste, não apenas para a geração, mas por conta dos seus usos múltiplos. No caso das distribuidoras, que estavam à venda, ele ironizou ao apontar que essas empresas poderiam ser até mesmo doadas para companhias que possam fazer um trabalho de recuperação, assim como ocorreu com a Equatorial, que por R$ 1 comprou a Cemar.

No geral, Alqueres, que já ocupou a presidência da estatal e a presidência do Conselho de Administração da Eletrobras, afirmou que a empresa precisa melhorar seus indicadores. Apesar de hoje estar com a relação dívida líquida sobre o resultado ebitda (antes de juros, impostos, depreciação e amortização) em cerca de seis vezes ante as 10 x quando assumiu o cargo em abril de 2016, esse índice ainda é o dobro do ideal.

“Foi uma melhora fantástica, mas ainda está alto e deveria ser metade disso, a empresa foi uma das que mais se valorizou na Bolsa, mas continua aquém dos valores dos seus ativos. Ninguém pode apostar na gestão de uma diretoria e de  gestores com pessoas desqualificadas em função do governo ter necessidade de apoio”, afirmou. Não sou contrário ao governo reter uns 20% com vagas no conselho e os poderes de veto para temas previamente selecionados, isso é possível, agora, essas empresas têm que ser geridas como as privadas, com a devida meritocracia e com dividendos reais”, acrescentou.

Alqueres deixou em suspeição a sua avaliação de que em seis meses a venda possa ser efetuada, pois o atual governo tem menos de um ano antes da corrida eleitoral de 2018 seja iniciada oficialmente. Em nenhuma oportunidade de venda e compra de empresas onde o valor se aproxima de R$ 5 bilhões houve agilidade suficiente para que em seis meses o processo fosse concluído.

O diretor presidente da Engie Brasil Energia, Eduardo Sattamini, comentou que o  processo ainda precisa ser avaliado, mas o perfil desse negócio indica que um provável comprador poderia ser uma instituição financeira como ocorreu no caso do Bradesco na privatização da Vale. O fato de o governo manter a golden share e o controle em termos de operação dos ativos pode ser uma barreira a outros players do mercado – como a empresa que ele dirige – em adotar uma postura compradora das ações.

“Quem entrar será minoritário e um compartilhamento de controle acaba sendo um fator de difícil atração para outras operadoras. É mais fácil para uma instituição financeira entrar como investidor do que um parceiro estratégico”, avaliou ele antes do evento de comemoração de cinco anos da BBCE, realizado em São Paulo.

“É mais fácil para uma instiuição financeira entrar como investidor do que um parceiro estratégico”, Eduardo Sattamini, diretor presidente da Engie Brasil Energia

Agora, disse ele, esse anúncio pode representar uma mudança sim, a sua gestão passaria a ser mais profissional, uma posição mais difícil de se alcançar quando se é uma estatal. A Engie, comentou ele, tem interesse nos ativos que a Eletrobras opera hoje em regime de cotas e que poderão ser recolocados em licitação por meio da mudança do marco regulatório do setor. Mas entrar no capital da empresa conforme se mostra essa venda de ações estaria descartado pela geradora. Aliás, ele acredita que a venda de ações poderia recolocar a Eletrobras na disputa pelas usinas que hoje operam no regime de cotas.

André Dorf, presidente executivo da CPFL Energia, uma empresa recentemente adquirida pela chinesa State Grid, comentou que ainda é cedo para avaliar essa privatização, pois não se tem mais detalhes do processo. Contudo, avaliou que essa decisão do governo é corajosa e poderá ajudar nas contas e melhorar a gestão da empresa. Com o fato de deixar de ser uma empresa controlada pelo Estado, pode ter mais dinamismo e agilidade, além de adotar práticas de gestão e de tomada de decisão e isso é positivo.

“Já vimos esse modelo funcionar no mercado e até no Brasil com Vale e Embraer. Ele tem sido bastante utilizado no mundo e o mercado enxerga como positiva a redução de participação do governo. Mas o modelo anunciado ainda vai ser mais analisado, é cedo para falar da modelagem”, contemporizou o executivo que lembrou fazer parte da obrigação da empresa, avaliar todas as oportunidades de mercado. Mas, acrescentou que a perspectiva de venda deverá indicar a pulverização desse capital na mão de diversos investidores, diferentemente das privatizações passadas onde havia a venda em bloco para um agente apenas.

Para o consultor Ricardo Lima, medidas como essa indicam que o governo quer atribuir maior agilidade à empresa de forma geral. E que esse modelo não é inédito no mundo, muito pelo contrário. Ele listou países como França que adotou a medida com a EDF, a Espanha com a Telefonica, Endesa e Iberdrola e Portugal com a EDP. “Essas empresas tornaram-se grandes corporações globais mas com o governo por trás e grandes empresas mas com a redução da pressão política e consequentemente mais eficientes e eficazes em seus campos de atuação”, afirmou ele.

Ele confirma a percepção de que a venda, como anunciada deverá levar a uma maior pulverização dos investidores que poderão aderir à essa capitalização da Eletrobras. Segundo ele, não será venda de ativos e sim chamada de capital para atrair investidores que atuam e até os que não atuam na Bolsa. Segundo ele, uma oportunidade interessante de atrair novos investidores ao mercado de capitais, principalmente pessoas físicas. Mas lembra que ainda é preciso avaliar a modelagem da venda.

Oportunidade interessante de atrair novos investidores ao mercado de capitais, principalmente pessoas físicas, Ricardo Lima, consultor.

Para Miguel Setas, presidente executivo da EDP no Brasil, esse anúncio representa que efetivamente o Brasil começou a reforma do setor elétrico. Ele lembra que essa possibilidade já estava sendo vislumbrada até mesmo na CP 33. “Vemos como uma sinalização positiva do setor, que é de transformação no mais alto nível”, definiu. Contudo, corroborou a avaliação de que ainda é cedo para falar sobre  processo, pois a modelagem está sendo estudada.

Hoje, disse ele, a EDP é 100% privada desde 2012, quando o governo português vendeu sua participação de cerca de 25% para a chinesa China Three Gorges. Mas lembrou que o governo tinha direitos especiais na empresa desde que abriu o capital da empresa a outros investidores. Sobre o interesse nessa operação, Setas já delimitou que a empresa olha com interesse apenas três ativos, entre eles a UHE São Manoel, cujas propostas já foram devidamente entregues.