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Não é novidade que a região Nordeste enfrenta uma profunda crise hídrica desde 2013, mesmo assim, os números causam espanto. De 2012 a 2017, a geração hidrelétrica no rio São Francisco reduziu 71%. A empresa mais afetada é a Chesf, pois 90% de sua capacidade de geração, cerca de 9,5 GW, está no Velho Chico.
Para ilustrar melhor a situação, em 2001, ano do racionamento de energia elétrica no Brasil, Sobradinho operou com uma vazão de 1.000 m³/s. Atualmente, a usina de 1.050 MW de potência está operando com uma vazão de 550 metros cúbicos por segundo, quando o normal seria 1300 m³/s.
“Jamais imaginamos que seria possível operar Sobradinho com uma vazão tão baixa como agora”, disse João Henrique Franklin, diretor de Operação da Chesf. “Hoje estamos operando Sobradinho com 115 MW de capacidade, menos que a potência de uma unidade geradora, que é de 175 MW”, lamentou.
Segundo Franklin, se não houvesse a diminuição das vazões a partir de 2014, o reservatório da hidrelétrica de Sobradinho teria secado. A boa notícia é que mesmo nessa situação de escassez hídrica, a população nordestina não corre o risco de desabastecimento elétrico. A região tem sido abastecida pela geração eólica.
Em alguns momentos, as usinas eólicas atendem 60% do consumo da região, se beneficiando de uma capacidade instalada de 9,7 GW. Como muitas usinas no São Francisco estão paradas por conta da crise, elas atendem apenas 15% da carga do Nordeste.
CONFLITO A JUSANTE
Além da geração de energia, a água do Velho Chico é usada para o abastecimento humano, irrigação, piscicultura, turismo e navegação, sendo que o primeiro tem prioridade. A disputa pelo uso da água entre as diversas atividades econômicas tem gerado uma série de conflitos a montante e a jusante do rio.
Franklin conta que há 4 mil demandas judiciais contra à Chesf por conta da redução de vazões. Vale lembrar que essa operação é autorizada pela Agência Nacional de Águas (ANA) e pelo Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (Ibama).
Grande parte das usinas da Chesf tiveram seu regime comercial alterado para cotas em 2013. Desde então, a receita desses empreendimentos é suficiente apenas para operar e manter as turbinas funcionando. Franklin conta que toda vez que há uma nova redução de vazão, a ANA e o Ibama exigem uma série de condicionantes ambientais, gerando custos excepcionais para a Chesf sem cobertura de receita.
“No contexto da crise hídrica, a Chesf vem absorvendo competências através de condicionantes ambientas estabelecidas, com custos associados, que não estão contemplados na sua receita”, disse o executivo. A Chesf entrou com um pleito na Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) para que a Receita Anual de Geração (RAG) contemple também os custos relacionais a melhoria e às exigências ambientais por conta da crise.
“A impressão que nos dá, é que o rio São Francisco caminha para ter outra prioridade que não é energia. Mas é importante que esse caminho que está sendo construído respeite as outorgas concedidas. É questão de segurança jurídica”, disse Franklin.
O diretor da Chesf participou nesta quarta-feira, 7 de março, de workshop sobre “Outorga da água para geração hidrelétrica”, promovido pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), em São Paulo.
PERDA DE CAPACIDADE DE ARMAZENAMENTO
71% da capacidade de geração de energia do Brasil é composta por hidrelétricas e esse percentual deve se manter próximo de 68% em 2021. Trata-se de uma energia armazenável, limpa e com custo de operação dependente de afluências e quantidade de reservatórios.
Desde 1980 para cá, o país optou por expandir seu parque hidrelétrico com usinas conhecidas como a fio d’água. Segundo informações do Operador Nacional do Sistema (ONS), a capacidade instalada cresceu 40% entre 2006 e 2017, porém a energia armazenada máxima expandiu apenas 13% no mesmo período. Dos 154 empreendimentos em operação, 69 usinas possuem reservatórios e 85 não tem capacidade de armazenamento.
Em 2001, o país tinha capacidade de atender a carga elétrica com hidrelétricas por 6,3 meses. Em 2017, essa taxa é de 4,4 meses, sendo que as projeções apontam que chegará a três meses na próxima década. Hoje o subsistema Sudeste/Centro-Oeste concentra 70% da capacidade de armazenamento do país. O Nordeste vem em seguida, com 18%; Sul com 7% e Norte com 5%.
Na opinião de Vinicius Forain Rocha, gerente de Recursos Hídricos e Meteorologia do ONS, será preciso revisar o histórico de vazão adotado no planejamento da operação do Sistema Interligado Nacional (SIN), em razão da situação de não “estacionaridade” e de eventuais efeitos de mudanças no clima.
Além disso, o país precisará investir em novas tecnologias de previsão hidrológica e meteorológica e climática para aprimorar a representação das afluências e sua incerteza no planejamento da operação do SIN. Rocha também participou do evento da Fiesp em São Paulo.