O ex-secretário de Energia Elétrica do Ministério de Minas e Energia (MME), Fábio Lopes Alves, concedeu sua primeira entrevista à Agência CanalEnergia como presidente da Chesf, subsidiária do Grupo Eletrobras com atuação na região Nordeste do país. O executivo defendeu o processo de pulverização do capital do grupo estatal em tramitação no Congresso, destacando que há muita desinformação sobre a proposta do Governo Federal. “Algumas preocupações não são procedentes e decorrem muito mais de desinformação do que qualquer outro fator.”
Alves disse que assume a Chesf em uma situação “muitas vezes melhor” do que a empresa estava em meados de 2016, ou seja, antes da administração do ex-presidente da companhia Sinval Gama (este que por sua vez foi deslocado para o cargo de diretor de Operações no Operador Nacional do Sistema Elétrico).
Alves se mostrou otimista e disse que a Chesf investirá mais de R$ 1 bilhão neste ano para concluir empreendimentos que estão em diferentes fases de desenvolvimento, principalmente obras do setor de transmissão de energia elétrica. Em um tom mais cauteloso, o CEO disse que a companhia estuda seu retorno aos leilões de geração, de olho no crescimento da fonte solar fotovoltaica.
“A Chesf já começa a estudar a voltar a investir na área de geração de energia, principalmente solar, que é uma fonte onde o Nordeste tem muita vocação para produção de eletricidade”, disse o executivo. ” Começamos a estudar a possibilidade de entrar em leilões para entrega futura. Se a gente não fizer uma carteira de obras, a gente vai paralisar [a área de geração]“, completou.
Desde o processo de renovação dos contratos de concessão em 2012/2013, as empresas do grupo Eletrobras perderam o protagonismos nos leilões de geração e transmissão, seja pela falta de capacidade financeira para seguir assumindo novos compromissos de investimento, seja por barreiras regulatórias impostas pela Aneel para limitar a participação de empresas com histórico de atrasos em obras no setor elétrico.
Fábio Alves, que na gestão do deputado Fernando Coelho Filho fazia parte da equipe do MME, tratou de esclarecer que não existe preconceito, por parte do atual Governo, com a palavra “privatização”. Segundo ele, a expressão “desestatização” é o termo oficial que está na lei Nacional de Desestatização, portanto, seria o termo oficial para tratar do processo envolvendo a Eletrobras, pois o Governo não está saindo do negócio e sim abrindo mão de exercer a função de sócio majoritário.
No caso da gigante do setor elétrico, a desestatização se dará pelo lançamento de uma oferta primária de ações, sem o acompanhamento do acionista majoritário, portanto, provocando uma diluição do capital da companhia. A justificativa para esse modelo é que a empresa hoje não tem capacidade financeira para tocar seu plano de investimento e a União, que junto com o BNDES, controla cerca de 63% do capital social da Eletrobras, não teria condições de fazer frente a essas necessidades. A solução é buscar dinheiro novo vindo do capital privado, daí o termo privatização.
Pelo projeto de lei em tramitação no Congresso, nenhum acionista poderá ter mais do que 10% do capital votante da Eletrobras. Além disso, mesmo sendo minoritária, a União terá uma ação de classe especial, conhecida como Golden Share, permitindo a ela vetar decisões da diretoria que vão contra os interesses ao Governo.
Apenas na hipótese da União não conseguir reduzir sua participação para menos de 49% do capital social haverá uma oferta secundária de ações. Nesse cenário, a União vende sua posição no mercado secundário. A avaliação do Governo é que fundos de pensão serão os potenciais compradores dessas ações.
Permeando essa disputa política, existe a preocupação sobre como se comportará a tarifa de energia elétrica no Brasil após esse processo. Durante a tramitação da Medida Provisória 814, um conjunto de emendas foram adicionadas no projeto original. “Vários dos projetos de iniciativa da Casa Legislativa vão o sentido de conceder subsídio para um determinado segmento e alguém vai ter que pagar essa conta”, reconheceu Alves.
Para ele, porém, esse é um “movimento natural” do Legislativo, cabendo as associações do setor acionarem suas bases parlamentares para combater aquilo que vai contra os interesses do setor elétrico. “Não dá para ficar no banco de reserva. Eles precisam acionar suas bases parlamentares para defenderem aquilo que acharem razoável”, acrescentou.
Alves disse ter compreensão que a energia elétrica é um insumo importante para o desenvolvimento econômico do país. Ele reconheceu que a Eletrobras teve um papel importante no desenvolvimento do setor elétrico brasileiro, mas argumentou que a situação atual da empresa não a coloca em condição de competir com grupos internacionais. “O que o projeto [de privatização] busca de fato é assegurar que a Eletrobras continue como um grupo nacional com condição de competir nesse mercado”, disse ele lembrando a ausência da companhia nos últimos leilões.
Alves também fez questão de afastar o rumor de que a privatização da Eletrobras significa a privatização do rio São Francisco. Ele lembrou que a Agência Nacional de Águas (ANA) e o ONS são as autarquias que, de fato, tomam as decisões sobre o fluxo de água, os usos múltiplos e geração de energia na bacia do São Francisco e que esse cenário permanecerá após a pulverização do capital da Eletrobras.
“Essa retórica de que desestatizar a Eletrobras é privatizar o rio São Francisco não tem sustentação técnica. É só uma afirmação de quem não conhece ou de quem quer criar um fato contra o processo”, lamentou.