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A decisão do presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), de não colocar para votação a MP 814 frustrou a expectativa de grande parte do setor elétrico. No texto, além das emendas conhecidas popularmente como jabutis, havia pontos importantes para solucionar questões como o risco hidrológico e destravar R$ 7 bilhões que estão parados na liquidação financeira do mercado de curto prazo, o endereçamento dos pontos relacionados à venda das distribuidoras da Eletrobras, bem como os estudos para a venda da estatal, entre outros. Agora a dúvida é como ficarão esses pontos ainda mais diante da proximidade de eventos como a Copa do Mundo, Festa de São João e, finalmente, as eleições.
A declaração de Maia foi dada horas antes de iniciar a 15ª edição do Encontro Nacional do Setor Elétrico que ocorreu em 23 e 24 de maio, no Rio de Janeiro. E o assunto permeou as discussões do primeiro dia do evento político regulatório. Essa decisão do parlamentar foi lamentada, pois representava o primeiro indicador de mudanças do setor por tratar de assuntos mais urgentes como o GSF e começava a preparar terreno para as próximas a vir com o PL 1917, da portabilidade da conta de luz, da privatização da Eletrobras e, mais profundamente, da reforma do setor elétrico.
Contudo, a decisão de tirar a MP da pauta e assim destravar o caminho para outras que estavam vindo atrás dessa. Acontece que, lembrou o presidente da Eletrobras, Wilson Ferreira Junior, houve o acréscimo de pontos que levariam a impactos tarifários que deixaram congressistas desconfortáveis com a situação. E que tirar da pauta o tema foi algo compreensível para o atual momento do setor elétrico.
Outro que considerou essa decisão esperada foi o presidente da Abraceel, Reginaldo Medeiros. Ele, assim como o executivo da Eletrobras, relatou à Agência CanalEnergia que havia um certo desconforto dos parlamentares, principalmente, daqueles mais reticentes quando o assunto foi direcionado para ações que culminariam em aumento de preços da energia por conta de ‘inovações’ introduzidas no texto pelo deputado Júlio Lopes. “Muitos parlamentares perceberam o impacto na tarifa e já era perceptível que havia esse clima de pressão na Câmara. Eu já desconfiava de que algo semelhante [a deixar vencer a MP] poderia acontece, não foi surpresa, pois é difícil aprovar qualquer coisa nesse sentido”, disse ele.
Por sua vez, Guilherme Velho, presidente executivo da Apine, já considerava a retirada da pauta como uma obviedade diante do volume de emendas apresentadas ao texto original. Acontece que é necessário que haja uma alternativa substituta ou na própria CP 33 para endereçar o tema do GSF que acumula R$ 7 bilhões em aberto na liquidação financeira do mercado de curto prazo.
“Precisamos equacionar essa questão por duas razões, a primeira é que é um direito inquestionável do gerador e cria as condições para a repactuação desses débitos para assim destravar o mercado e a segunda é reconhecer que é direito dos geradores hidrelétricos não serem penalizados por problemas não hidrológicos, pois isso quebra a lógica do negócio. Perder a resolução do GSF foi a maior perda de não ter a 814 aprovada, mas vamos ver qual pode ser a alternativa”, apontou ele.
Essa busca pela alternativa à MP 814 foi apontada pelo presidente do Fase, Mário Menel, ainda na abertura da edição 2018 do Enase. Ele concorda com o executivo da Apine e aponta o GSF como a prioridade mais urgente do setor elétrico. Uma das alternativas poderia ser a retirada dos demais temas da própria MP 814 para votar essa proposta até a data de seu vencimento, 1º de junho, na prática, 30 de maio por conta do feriado prolongado ao final da próxima semana.
A avaliação do economista e presidente da America Energia, Andrew Storfer, é de que o fator de perda da validade da MP 814 representa um sinal negativo para o mercado. Segundo ele, na prática o país perde economicamente e em termos de eficiência por conta da possível paralisação de venda das distribuidoras da Eletrobras e da solução para o GSF. E ainda é um viés negativo para aqueles que querem um setor mais moderno bem como para os investidores. “Apesar disso confiança ainda não foi perdida, pois essa modernização do setor não ocorreu agora, mas acontecerá em algum momento”, disse o executivo.
Uma das formas de evitar a inclusão dessas emendas, muitas negativas e indesejadas para a matéria principal de um determinado projeto, era a de atribuir mais transparência ao processo legislativo. Até porque, lembrou, nem sempre as emendas podem ser negativas há aquelas que direcionam questões positivas.
O próprio presidente da Eletrobras comentou que apesar da notícia ter atordoado a empresa é preciso olhar para o futuro. Em sua avaliação mudanças como essas são boas e dão a perspectiva de que se está a fazer algo que deve ser feito em termos de legislação por parte do lado político. Ainda mais em um momento e que se discute não só o curto prazo, mas o futuro do setor elétrico e a sua construção para as próximas gerações. “Contudo, só não podemos ignorar as coisas que acontecem no meio do caminho para essa modernização”, advertiu.
Opções jurídicas
Segundo o sócio Rodrigo Machado, do escritório Madrona Advogados, a questão das distribuidoras da Eletrobras apresenta grande complexidade. O primeiro ponto é a manutenção do serviço relacionado ao atendimento dos consumidores dos estados em que a empresa atua como designada. Nesse caso a autorização da Eletrobras vale até 31 de julho e depois a estatal não ficaria mais responsável, o que levaria no processo natural das coisas à liquidação das distribuidoras. O presidente da empresa, Wilson Ferreira Júnior, disse ontem que essa é a pior alternativa.
Contudo, disse Machado, uma solução para esse caso seria a publicação de uma medida provisória prorrogando a delegação dessa operação já que segundo as regras do setor elétrico, na falta de uma concessionária, a União tem o poder de delegar essa operação a uma nova empresa até novo processo licitatório. O que é mais complexo no caso das distribuidoras, comentou ele, a questão das dívidas dessas empresa pode levantar uma discussão sobre a geração de valor para minoritários ao elevar esses débitos para a União.
“A questão da privatização não trouxe novidade porque a sensação era a de que não sairia mesmo esse assunto”, acrescentou. Agora outra preocupação de mais curto prazo é com o GSF e nesse caso, ou o governo edita uma nova MP especificamente sobre o assunto ou vai atrás do STJ para buscar derrubar as ações que estão segurando os valores. “Esse é um ponto importante para o mercado livre, precisa que seja resolvido senão ele quebra”, analisou.
Daniel do Valle, advogado do escritório ASBZ, lembrou que a edição de nova MP pode também criar um problema legal, pois não é mais permitido editar medidas sobre o mesmo tema por se configurar em um governo por meio de MPs. Isso poderia levantar um questionamento jurídico quanto à constitucionalidade de edição de novas MPs. Mas, concorda que pode ser um saída para que questões como a das distribuidoras tenham solução. Uma coisa é certa, por projeto de lei é que não há chances de que os temas da MP 814 possam entrar em vigor ainda este ano.