A revolução digital que o mundo vem sofrendo nos últimos anos não está deixando de fora as utilities do setor elétrico. Além do aspecto tecnológico, esse movimento também deve trazer transformações na relação consumidor e distribuidora. A inserção de renováveis nas redes, aliada a liberalização do mercado de energia, serão fatores importantes na consolidação desse processo. A descentralização da energia e o protagonismo do consumidor começam a formatar um novo mercado em que haverá autonomia na decisão final sobre o consumo de energia.

De acordo com Caius Malagoli, diretor de Engenharia da CPFL Energia, a concessionária passa a ter uma relação diferente com o consumidor, uma vez que neste mercado moderno ele estará mais empoderado por ter mais controle sobre o seu consumo, e pode dispor da sua energia. Já a distribuidora é quem vai viabilizar todas essas operações e ainda vai poder melhorar a gestão do cliente. “A distribuidora vai passar a ter um apelo fundamental nesta relação de poder”, avisa Caius. No aplicativo da CPFL, já estão disponíveis dezenas de serviços, como segunda via de conta, consulta de débitos em aberto, falta de energia e histórico de consumo. Isso leva o consumidor a ter mais comodidade nos serviços e acompanha a tendência de aumento do uso dos canais digitais para os clientes para se relacionarem com a empresa. Além da reformulação da versão mobile, com a validação das informações cadastrais por e-mail, não há mais a necessidade de ir até os postos de atendimento.

Oferecendo toda a variedade de um portfólio de digitalização, a Siemens consegue ir até a casa do consumidor com as suas soluções digitais. Proteção, automação e digitalização de subestações, qualidade da energia, medição inteligente, geração distribuída e microgrids, big data analytics, cibersegurança e softwares para simulação e gerenciamento do sistema de energia são algumas das soluções oferecidas. Para o diretor da área de Digital Grid da empresa, Sergio Jacobsen, cada região do mundo teve uma motivação para o pontapé. Na Europa, foi tornar a energia mais verde, enquanto no Brasil foi o combate às perdas. Para ele, o consumidor está cada vez mais consciente do seu papel e a geração distribuída pode ser um segundo motivador para uma onda mais intensa no Brasil. Poder gerar a própria energia, vendê-la da forma que julgar mais conveniente sinaliza um elemento desencadeador de processos. Todos estes movimentos deixam o foco no consumidor mais intenso, já que ele sempre estará buscando uma melhor experiência com o consumo de energia.

Atualmente, a Siemens está no projeto Smart City Barueri (SP), da AES Eletropaulo, fornecendo a plataforma para gerenciamento da medição de energia. Um software vai coletar as medições, processar e fazer o cálculo de consumo automaticamente. O projeto vai proporcionar que o cliente gerencie seu consumo em tempo real, evitando utilizar energia nos horários de pico, por exemplo. A distribuidora também terá ganhos, como a redução dos custos diretos e indiretos com o corte-religa remoto, a transmissão de dados da medição em tempo real e maior segurança contra fraudes.

Outro projeto que ela participou foi o Energia +, para as distribuidoras da Eletrobras, já com resultados concretos sobre a avaliação de perdas de energia. Jacobsen conta que as soluções precisam de adaptações quando são usadas no Brasil. Para isso, a Siemens tem um centro de pesquisa responsável pela tropicalização dos softwares no Brasil, de forma a atenderem requisitos técnicos e regulatórios locais.

Em outros países onde a digitalização já se encontra em patamar mais avançado, a Siemens participa de forma ativa na evolução dos processos. No Canadá, a Algonquin College, faculdade com reconhecida atuação na área de inovação, quer zerar sua pegada de carbono até 2042. Ela vem investindo na questão da sustentabilidade e desenvolveu, dentro do campus, uma microrrede que permite gerar e armazenar a sua própria energia. Além disso, incluiu o tema nas disciplinas da graduação. Para cumprir a meta, ela conta com o auxílio da Siemens. A plataforma digital para Microrredes da empresa gerencia a energia produzida por painéis solares e cogeração, além de determinar quando a energia é direcionada para consumo ou para armazenamento. A infraestrutura montada para eficiência energética possibilitou uma economia anual de US$ 3,2 milhões para a Algonquin College.

Nos Estados Unidos, mais precisamente no Brooklyn, em Nova York, a concessionária local trabalha com a startup LO3 Energy, a Siemens Digital Grid, e a Next47, braço da Siemens para investimentos em startups, em um projeto de microgrid cooperada. Os moradores podem gerar, consumir e comprar energia dentro da região, com uma plataforma de transação de energia habilitada por blockchain. A plataforma registra todas as transações de energia e o sistema de gerenciamento da unidade Digital Grid da Siemens provê o controle e balanço energético da rede.

O ambiente disruptivo vem proporcionando a criação de empresas que atuam em serviços da seara das concessionárias. Na CPFL, o programa Inova avalia startups que trazem novas tecnologias, de modo que possam ser criadas futuras parcerias com a elétrica brasileira. “Criamos um programa para firmar parcerias ou desenvolver produtos ou sistemas que possam nos agregar valor ou novos negócios baseados nessas plataformas tecnológicas”, explica Malagoli, da CPFL. Ele dá como exemplo as divisões de eficiência energética e a de painéis solares da empresa – fora do negócio da distribuição – mostrando que a disrupção já está no radar do grupo. “Vai ter uma série de oportunidades para que a gente possa entregar não só energia, mas ser o agente que vai viabilizar novos negócios”, promete.

Para Jacobsen, da Siemens, as distribuidoras já têm a consciência desses novos ‘players’ que poderão surgir competindo com as distribuidoras. Ele considera o movimento como irreversível, mas acredita que elas estejam atentas a esse direcionamento nos negócios. “Se não mudar vão abrir uma janela para os outros, algumas já estão se preparando”, conclui.