A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) foi obrigada a suspender o repasse de recursos que a hidrelétrica Binacional Itaipu faz mensalmente aos estados e municípios afetados pela construção da usina a título de compensação financeira. A interrupção, porém, não decorre de inadimplência da produtora de energia, mas, sim, em razão de um desasamento orçamentário causado pelo aumento do cotação dólar nos últimos meses.
Em nota, a Aneel informou que: “A dotação orçamentária para ação de royalties de Itaipu, em função do aumento do dólar nos últimos meses, tornou-se insuficiente para honrar as transferências dos recursos aos beneficiários previstas a partir do mês de outubro deste ano.”
No dia 3 de agosto, o dólar estava cotado a R$ 3,70. Vinte dias depois, atingiu R$ 4,12. O valor máximo foi alcançado em 13 de setembro, quanto a cotação bateu R$ 4,19. Ontem fechou a R$ 3,68. A volatilidade da moeda norte-americana se dá em função de fatores externos (como a guerra comercial entre EUA e China, principalmente) e por conta das eleições para presidente no Brasil.
Para tentar resolver a questão, o Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão enviou ao Congresso Nacional, por meio da Mensagem nº 572, de 10 de outubro de 2018, um projeto de lei que abre aos Orçamentos Fiscal e da Seguridade Social da União crédito suplementar no valor de R$ 1,24 bilhão para reforço de dotações constantes da Lei Orçamentária vigente. Do total informado, R$ 214,9 milhões referem-se à transferência de cotas-partes da compensação financeira do Tratado de Itaipu.
“Diante desse cenário, a Aneel informa aos beneficiários destes recursos que as transferências para Estados e municípios referentes aos royalties estão suspensas por insuficiência orçamentária até aprovação do projeto de Lei citado e disponibilização da dotação orçamentária”, escreveu a agência reguladora em nota divulgada na última quarta-feira, 17 de outubro.
O QUE DIZ ITAIPU
“Em relação às matérias publicadas na imprensa sobre a suspensão do repasse de royalties da Itaipu por falta de dotação orçamentária da União, a binacional esclarece que o pagamento pela empresa à União está sendo feito normalmente. Devido à explosão da cotação do dólar nos últimos meses, a previsão orçamentária do governo foi insuficiente para garantir o repasse em dia. As providências necessárias para o reforço da dotação já estão em tramitação. O Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão enviou para o Congresso Nacional pedido de suplementação”, esclareceu Itaipu após ser procurada pela Agência CanalEnergia.
A Itaipu faz dois pagamentos mensais relativos ao repasse de royalties à Secretaria do Tesouro Nacional (STN): o “principal” e o “ajuste do dólar”. Esses valores são repassados pela Aneel uma vez por mês. Ou seja, a Itaipu encaminha dois pagamentos por mês ao STN, e a Aneel os repassa mensalmente de uma só vez aos beneficiários. A Itaipu faz o recolhimento para a União e quem faz os cálculos da distribuição e os repasses aos municípios é a Aneel.
No que compete à Itaipu, o cálculo do valor dos royalties é determinado por três variáveis: a produção de energia, o fator de ajuste do dólar e a taxa de câmbio. A distribuição é feita de acordo com a legislação de cada país – Brasil e Paraguai.
O valor dos royalties principal é uma remuneração aos governos devido à utilização do potencial energético, ou seja, depende da geração de energia. Então, ao final de cada mês é verificado quanto foi gerado em gigawatts-hora. Este valor é multiplicado por US$ 650 e, depois, por 4. O número final é divido igualmente para o Brasil e o Paraguai. Como cada país distribui os royalties em sua moeda, a alteração da taxa de câmbio acaba influenciando no valor final.
Um fator importante é que o pagamento do repasse principal está diretamente vinculado à quantidade de energia gerada e, com isso, uma eventual diminuição na produção, independentemente do motivo (como a estiagem nos últimos meses, por exemplo), impacta diretamente no seu valor. Em 2018, por exemplo, a produção do mês de junho ficou em 32,90% inferior a de março, influenciando no valor do repasse.
Já o ajuste do dólar tem o objetivo de manter o valor real do dólar constante ao longo do tempo. O cálculo anual é feito da seguinte maneira: é somado todo o valor de royalties principal devido no ano anterior e aplicado um fator de ajuste, que leva em conta a inflação americana acumulada desde 1985 (este fator é obtido pela média aritmética acumulada de dois índices americanos). O valor é, então, divido por 12 parcelas e pago a cada mês no ano seguinte. A quantia também leva em consideração a taxa de câmbio do dia do pagamento.
O pagamento de royalties começou em março de 1985 e, desde então, os governos do Brasil e do Paraguai já receberam, juntos, mais de US$ 11 bilhões. No lado brasileiro, 347 municípios (16 direta e 331 indiretamente) influenciam o reservatório de Itaipu e, por isso, recebem a compensação financeira. Segundo dados da Aneel, Itaipu repassou R$ 878,9 milhões em royalties em 2016; R$ 812,8 milhões em 2017; e R$ 704,6 milhões em 2018.
MUDANÇA EM 2019
No Brasil, em maio de 2018 entrou em vigor a Lei 13.661/2018 que altera os porcentuais de distribuição dos royalties: 65% aos municípios (era 45%), 25% aos estados (também era 45%) e 10% para órgãos federais (Ministério do Meio Ambiente, Ministério de Minas e Energia e Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico).
Como o Ajuste do Dólar se refere à produção do ano anterior, ele ainda não sofreu os efeitos da nova lei, sancionada em maio de 2018, mas obedece às proporções da Lei 8.001/1990 (45% para os municípios, 45% para os estados e 10% aos órgãos federais). Somente a partir de 2019 o Ajuste do dólar também passará a ser afetado pela nova regra de distribuição. Ou seja, por enquanto, a alteração na lei impacta apenas um dos dois repasses feitos pela Itaipu ao STN, o Principal. O outro repasse, o ajuste do dólar, ainda fica na proporção anterior (45%).
Do porcentual de 65% destinados aos municípios, 85% do valor repassado é distribuído proporcionalmente aos lindeiros, ou seja, aos diretamente atingidos pelo reservatório da usina (15 no Paraná e um no Mato Grosso do Sul). Os 15% restantes são distribuídos entre municípios indiretamente atingidos por reservatórios a montante (rio acima). Para os estados, também se aplicam os porcentuais de 85% e 15% para os diretamente e indiretamente afetados, respectivamente.
O repasse pela Aneel aos municípios é feito até o 15º dia de cada mês. O primeiro pagamento com o novo porcentual de distribuição para parcela principal aconteceu no último dia 13 de julho, encaminhado pela Itaipu no dia 10 de julho. A ele foi somada a parcela do ajuste do dólar pago pela Itaipu no dia 29 de junho, ainda com o porcentual da legislação anterior.