A Secretaria de Estado de Meio Ambiente do Mato Grosso (Sema-MT), por meio da Diretoria de Unidade Desconcentrada em Sinop (DUD Sinop), autuou a Companhia Energética de Sinop em R$ 50 milhões por poluir parte do rio Teles Pires e causar a morte de mais de 13 toneladas de diferentes espécies de peixes.
A mortandade foi identificada no dia 4 de fevereiro pela equipe multidisciplinar da Sema e está atrelada ao enchimento do reservatório da UHE Sinop, iniciado no dia anterior. Segundo o relatório técnico da equipe, a operação de fechamento da quinta adufa e abertura de três vertedouros ocasionaram uma alteração de turbidez na água. No momento da abertura das comportas, foi identificado uma modificação específica feita por um sedimento aprisionado na bacia de dissipação da usina, cuja responsabilidade é do setor de engenharia civil do empreendimento, já que se trata de parte integrante da estrutura de construção da barragem.
De acordo com as avaliações, foi detectado que os sedimentos em suspensão na água provocaram a obstrução dos órgãos respiratórios dos peixes, as chamadas brânquias. Ao constatar o dano ambiental, a Sema informou que determinou imediatamente a não movimentação das comportas para que não fossem lançados mais sedimentos na bacia abaixo.
Peritos da Perícia Oficial e Identificação Técnica (Politec) e do Ministério Público Estadual (MPE-MT) atribuíram a mortandade a uma manobra irregular de enchimento do reservatório da hidrelétrica de Sinop, que não respeitou a supressão total da vegetação da área de alagamento. Durante vistoria realizada após o incidente, técnicos detectaram que diversos pontos do rio apresentavam concentrações de oxigênio insuficientes, o que é letal à fauna aquática.
Dados apresentados pelo empreendedor no licenciamento revelam que foram submersos mais de 15 mil hectares de vegetação arbórea ou arbustiva, além de áreas de pastagens que também apresentam fitomassa. Rosangela Guarienti Ventura, perita da Politec, explicou que quando uma barragem é construída, a água passa a não ter o regime de escoamento correto, formando nesse caso uma lagoa com vegetação encoberta. Com o alagamento, todo o substrato em questão entra em decomposição e vai se sedimentando até uma porção da comporta, por onde escoa o rio.
“Verificamos que a abertura do vertedouro se deu de forma abrupta, liberando no rio uma água muito rica em sedimentos e com baixo teor de oxigênio, sendo suficiente para causar a mortandade de peixes por asfixia’’, definiu a perita.
A multa de R$ 50 milhões representa o valor de patamar máximo aplicável pelo órgão fiscalizador, que levou em consideração a gravidade dos fatos, uma vez que o rio Teles Pires possui grande importância para a região Norte do Mato Grosso e é fonte de renda para diversas famílias que sobrevivem da pesca profissional, além de servir de opção de lazer para os moradores da região. Os autos também levaram em consideração a condição econômica do infrator, uma vez que os investimentos no empreendimento são estimados em mais de R$ 3,2 bilhões.
“A Secretaria reconhece a importância do empreendimento para desenvolvimento econômico de Mato Grosso, mas acredita que tudo deve ser feito buscando as melhores práticas de conservação e proteção ambiental. Por isso, estamos todos empenhados em cessar o dano e buscar as devidas responsabilidades no fato”, destacou Mauren Lazzaretti, secretária da Sema.
A autuação foi fundamentada na Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6938/1981), Código Estadual do Meio Ambiente (LC n°. 38/95, alterada pela LC 232/2005) e decreto 6514/2008 que dispõe sobre as infrações e sanções administrativas ao meio ambiente.
Em nota divulgada à imprensa, a Sinop Energia restringiu a causa do acontecimento à “primeira abertura das comportas do vertedouro e fechamento das adufas”, informando que assim que detectou o ocorrido comunicou-o a todos os órgãos competentes e como medida imediata alertou às comunidades locais para não consumirem os animais mortos. Equipes foram mobilizadas para o recolhimento ou resgate dos peixes, da mesma forma que para empreender a coleta de dados e medições da qualidade da água em 18 pontos à jusante da usina, sendo 4 pontos junto ao barramento da UHE Sinop e mais 14 pontos distribuídos a cada 2 km ao longo do rio Teles Pires, na parte de remanso do reservatório de outra hidrelétrica, a Colíder.
No dia 6 de fevereiro, a usina foi autorizada pela Sema para abertura do vertedouro com uma vazão de 411 m³/s, movimentação que possibilitou melhoria da qualidade do rio abaixo da barragem, uma vez que a água do reservatório da UHE apresenta boa qualidade.
Mais punições e responsabilidades à vista
Já no último sábado (9), o Ministério Público do Estado de Mato Grosso (MPMT), através da 15ª e 16ª Promotorias de Justiça de Defesa do Meio Ambiente de Cuiabá, ingressou com uma ação civil pública com pedido liminar requerendo a suspensão do enchimento do reservatório de Sinop e que se aumente gradativamente a vazão a jusante para esvaziamento parcial e retirada significativa do material vegetal que se encontra submerso na área da usina.
Para os promotores de Justiça, Marcelo Caetano Vacchiano e Joelson de Campos Maciel, as vistorias realizadas no local constataram que os fatos são graves e que todas as previsões de desastres ambientais anunciadas pelo Ministério Público e pela UFMT se concretizaram.
“Essa mortandade demanda imediata adoção de providências por parte do Estado para que o crime não mais se prolongue neste tempo, gerando danos inestimáveis e irreversíveis”, destacaram.
Segundo o MPMT, uma notificação recomendatória foi enviada à Sema no ano passado externando a preocupação com o uso da modelagem matemática de qualidade da água. Na ocasião, foi recomendado aos técnicos que não autorizassem o enchimento sem a completa supressão, na medida em que se evidenciavam os riscos.
“Alertamos que o enchimento do reservatório sem a total supressão da vegetação resultaria em impactos ambientais imensuráveis e irrecuperáveis”, afirmaram os promotores. “Caso a Sema tivesse acatado a recomendação do Ministério Público, não haveria essas mortes e a deterioração da qualidade de água na região”, esclareceram, afirmando que por isso foi pedido o afastamento dos servidores responsáveis pela análise da modelagem matemática que justificou a manutenção da floresta submersa em contrariedade ao que manda a lei.
Em sua ação, o Ministério estadual também requereu liminarmente a indisponibilidade de bens e valores da Companhia Energética Sinop S.A e da EON Consultoria e Planejamento SC Ltda, no montante de R$ 20 milhões, para garantir a efetividade da eventual condenação para fins de reparação dos danos advindos da mortandade de peixes ocorrida entre 4 a 8 de fevereiro.
Além das companhias energéticas, o Estado de Mato Grosso também figura no polo passivo da ação. Em outro pedido a Delegacia Especializada de Defesa do Meio Ambiente (DEMA) e o MP requerem que os diretores do empreendimento sejam submetidos a monitoramento eletrônico e impedidos de sair do país já que são suspeitos de crimes ambientais graves.