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Para quem não sabe aonde quer ir, qualquer caminho serve, já dizia o romancista Lewis Carroll, autor do clássico no “Alice no País das Maravilhas”. A frase sintetiza a entrevista que o presidente da consultoria internacional PSR, Luiz Barroso, concedeu à Agência CanalEnergia nesta quinta-feira, 28 de março. Para ele, o principal desafio do setor elétrico brasileiro é ter clareza sobre onde se quer chegar.
“Temos que decidir se queremos um ambiente de mercado, com decisões e gestão de risco mais descentralizadas, onde os riscos são alocados aos agentes que conseguem gerenciá-los e possuem instrumentos de mitigação, ou se queremos um ambiente de decisões e gestão de risco mais centralizadas na mão do Estado, com riscos sendo repassados frequentemente para o consumidor final. Uma vez tendo claro qual o norte, podemos discutir os aprimoramentos regulatórios e comerciais para chegar lá”, disse o executivo.
Mais do que um especialista respeitado no setor elétrico, Barroso tem propriedade para criticar a falta de objetividade que existe entre os agentes, que pedem um modelo setorial menos intervencionista e mais pró-mercado, mas resistem bravamente sempre que os privilégios são ameaçados.
Barroso foi presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) durante a gestão do ministro Fernando Coelho Filho, entre os anos de 2016 e 2018. Contribuiu decisivamente para construção da Consulta Pública 33, documento que reúne propostas para modernizar as regras comerciais, regulatórias e operacionais do setor elétrico brasileiro. As propostas, porém, seguem travadas no Congresso Nacional.
Na próxima terça-feira, 2 de abril, Barroso estará no Workshop PSR/CanalEnergia, analisando os principais desafios do setor elétrico. O evento será no Rio de Janeiro, no Centro de Convenções SulAmérica. A seguir, confira a entrevista com o diretor presidente da PSR.
Agência CanalEnergia: Quais são os assuntos que a consultoria pretende levantar nesta edição do Workshop PSR?
Luiz Barroso: Discutiremos nesta edição propostas de solução para os passivos do setor elétrico (MRE, inadimplência na CCEE, etc), problemas atuais (Tratado de Itaipu, aprimoramento da formação de preços), aperfeiçoamentos para preparar o setor elétrico brasileiro pra o futuro (abertura do mercado, expansão do sistema) e ferramentas necessárias para os agentes maximizarem valor em um setor moderno. Teremos muita interação com os participantes assim como um bloco especial sobre aspectos empresariais centrados em tecnologia e inovação, como discussão sobre inteligência artificial e seu papel no setor e na agregação de valor para as empresas no novo ambiente, seja ele de mercado ou não.
Agência CanalEnergia: Quais são os desafios que antecedem o processo de aprimoramento dos modelos regulatório e comercial do setor elétrico brasileiro?
Luiz Barroso: O principal desafio é o setor elétrico brasileiro ter clareza sobre onde quer chegar. Temos que decidir se queremos um ambiente de mercado, com decisões e gestão de risco mais descentralizadas, onde os riscos são alocados aos agentes que conseguem gerenciá-los e possuem instrumentos de mitigação, ou se queremos um ambiente de decisões e gestão de risco mais centralizadas na mão do Estado, com riscos sendo repassados frequentemente para o consumidor final. Uma vez tendo claro qual o norte, podemos discutir os aprimoramentos regulatórios e comerciais para chegar lá.
Agência CanalEnergia: Existe uma receita pronta para resolver definitivamente os problemas do MRE e do GSF. Em caso afirmativo, qual seria?
Luiz Barroso: Os problemas do GSF podem ser divididos em três grupos: (i) questões relacionadas à redução da produção total hidrotérmica, afetada pela queda da demanda e pelo aumento da energia de reserva; (ii) questões relacionadas à redução da produção hidrelétrica, fruto do aumento do despacho termelétrico e da entrada de renováveis com maior produção no período seco e (iii) questões relacionadas à repartição da produção hidráulica entre as hidrelétricas participantes do MRE. No workshop discutiremos propostas de solução para cada um destes diferentes problemas. Algumas demandam soluções legais, outras infralegais. Já no caso do MRE, existem vários aperfeiçoamentos possíveis, que serão discutidos no seminário. Obviamente que revisar a garantia física é o principal, porém não é o mais fácil, pois existe todo um processo regulatório para tal, uma metodologia que precisa ser aperfeiçoada e uma necessidade de coletar melhores dados.
Agência CanalEnergia: Quais premissas precisam ser observadas para se realizar uma expansão eficiente da matriz elétrica brasileira?
Luiz Barroso: Primeiro, critérios objetivos para a tomada de decisão. Segundo, a consideração de diversos fatores para a expansão eficiente, como : (i) criação de um mercado de eletricidade de curto prazo, que permita formar um bom preço de energia e também de custos adicionais ao serviço de produção de energia elétrica (custos de modulação da carga, confiabilidade, reserva operativa, etc); (ii) necessidade de coordenar expansão da geração e transmissão; (iii) alocação para o setor elétrico apenas dos custos relativos ao setor, com políticas energéticas ou industriais explicitadas; (iv) redução de incentivos e subsídios; (v) alocação justa dos custos das expansão entre os consumidores livres e regulados.
Agência CanalEnergia: Na avaliação da PSR, quais temas podem comprometer a agenda de abertura do mercado livre?
Luiz Barroso: Primeiro, a decisão sobre o que se quer da vida. Quem não sabe o que quer não chega a lugar algum. Segundo, acho que seria o tratamento do custo dos contratos já firmados no mercado regulado (contratos legados), a coordenação da expansão do sistema em um ambiente de menor participação dos leilões do mercado regulado e a alocação de custos e entre os consumidores. Um mercado livre salutar é aquele onde os consumidores escolhem o provedor que melhor gerencia os riscos do produto energia elétrica, e não aquele onde a escolha é baseada em evitar arcar com custos de contratos firmados no passado ou para obter isenção de algum encargo setorial.
Agência CanalEnergia: Como será o setor elétrico no futuro?
Luiz Barroso: Independente do que o setor escolha pelo lado do ambiente de mercado, o setor elétrico do futuro terá inevitavelmente a participação cada vez mais ativa dos consumidores; maior complexidade devido à penetração de renováveis, redução da participação hidrelétrica e surgimento de novas tecnologias. Integração e flexibilidade são as palavras chave para sucesso neste novo ambiente. E é por isso que temos uma seção dedicada a estes temas, comandada pelo melhor inovador que conheço, o Mário Veiga, que vai fechar o evento tirando todo mundo da zona de conforto, discutindo o estado da arte da inovação setorial em ciência dos dados, estudos e ferramentas para extrair valor no novo ambiente. E isso independe da escolha regulatória a ser feita.