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Faltando apenas três meses para a Comissão Permanente de Programas Computacionais do Setor Elétrico (CPAMP) validar o novo modelo que vai viabilizar a implementação do preço horário em 2020, especialistas ouvidos pela Agência CanalEnergia acreditam que pode estar acontecendo um movimento para criar obstáculos e dificultar a aplicação do Dessem.

O Dessem é um programa computacional que está sendo desenvolvido pela CPAMP e utiliza cálculos matemáticos para precificar, em base horária, o custo real da energia no Sistema Interligado Nacional (SIN). A ideia é que o preço da energia à vista (conhecido tecnicamente pela sigla PLD) deixe de ser calculado em patamares (pesada, média e leve) e semanalmente, para ser calculado diariamente e com uma granularidade maior durante o dia.

A nova modalidade estava planejada para entrar em vigor em janeiro de 2019, porém acabou sendo adiada para janeiro 2020. No entanto, para que isso se concretize, a CPAMP precisa validar o modelo Dessem até 31 de julho. A reportagem apurou que os agentes têm feitos pedidos para incluir uma série de coisas no programa computacional que tem atrapalhado o andamento dos trabalhos. “A gente participou de algumas reuniões da força tarefa e o que a gente tem observado é que muito agentes estão fazendo pedidos para incluir restrições no modelo bastantes específicos e isso têm tornado o processo de validação do Dessem mais lento e também tem tornado o modelo, em algumas situações, mais lento para ser rodado”, disse Bernardo Bezerra, diretor da PSR.

A posição da PSR é que o modelo poderia ser implementado com um escopo reduzido. Os aprimoramentos poderiam ser incluídos gradualmente de acordo com a necessidade dos agentes. “O recado é que alguns entraves que a gente está observando são preocupações que podem ser contornadas através da aplicação do modelo com um nível menos detalhado a partir de janeiro de 2020. Isso já vai ser melhor do que o modelo Decomp em patamares”, reforçou Bezerra. “Tenho sérias dúvidas se na verdade não têm um processo de criar dificuldades para implementação do modelo Dessem, porque no final do dia, hoje a gente tem uma operação que não tem nenhum guia”, acrescentou.

Tenho sérias dúvidas se na verdade não têm um processo de criar dificuldades para implementação do modelo Dessem, porque no final do dia, hoje a gente tem uma operação que não tem nenhum guia

O ex-diretor da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e atual vice-presidente de Estratégia e Novos Negócios da Electra Energy, Edvaldo Santana, concorda com a avaliação da PSR. “Essa é uma discussão que tenho evitado participar dela. Têm mercados menores do que o Brasil em que o preço é a cada 15 minutos. E aqui está se discutindo o preço horário e há mais resistência do que gente favorável”, disse em palestra na última quinta-feira, 25 de abril, em São Paulo.

O executivo acredita que se o Governo ficar sensível a esses pedidos, há uma grande chance do preço horário ser adiado novamente. “Ninguém questiona se o custo da energia varia ou não de acordo com as horas do dia, o que se questiona é: isso é bom ou ruim para mim? Acho que os agentes deviam pensar mais no setor elétrico, pois na medida que você vai aceitando algumas imprecisões, outras passam. Acho que não faz muito sentido essa resistência tão grande ao preço horário”, opinou ele, que disse ter visto resistência de geradores hidrelétricos e eólicos.

PONTOS DE ATENÇÃO

A reportagem teve acesso a contribuição conjunta das associações Apine, Abrage e Abragel para a revisão dos submódulos dos Procedimentos de Rede impactados pela implementação do Custo Marginal da Operação (CMO) em base horária. Os agentes questionam que os procedimentos deveriam estar disponíveis já no início da operação “sombra”, iniciada em 2018, para que os efeitos indesejados pudessem ser corrigidos nesse período.

“Nesse sentido, manifestamos nossa preocupação de o ONS estar enviando à Aneel uma proposta não testada pelo Operador, tampouco pelos agentes de geração, principalmente se considerarmos que o Projeto Dessem engloba não somente a formação do preço em base horária, mas também a elaboração da Programação Diária da Operação”, diz a carta.

Ninguém questiona se o custo da energia varia ou não de acordo com as horas do dia, o que se questiona é: isso é bom ou ruim para mim?

Pelo cronograma dos trabalhos, as minutas dos procedimentos de rede serão enviadas para audiência pública em 13 de maio de 2019, para posterior abertura de audiência pública. No último dia 24 de abril, terminou o prazo para que o Operador Nacional do Sistema recebesse contribuições previstas para construção dessa minuta.

Segundo avaliação da Thymos Energia, houve muitos avanços na metodologia, mas vários pontos ainda não estão suficientemente acertados e o período “sombra” de validação não será robusto e extenso o suficiente para um planejamento adequado dos contratos, nem para a previsibilidade dos impactos que esta mudança acarretará. “O Operador Nacional do Sistema (ONS) avançou em diversas questões, mas ainda há muitos desafios. É preciso estabilizar o modelo, cuja metodologia ainda não estava fechada até o começo de 2019”, explicou a especialista. Até os primeiros meses de 2019 o Dessem apresentou problemas, como tempo elevado de processamento e falta de procedimentos claros caso haja a ocorrências de Custo Marginal de Operação (CMO) negativo”, relata Daniela Souza, gerente na Thymos Energia.

Para a consultora, para um teste eficaz, é necessário pelo menos um ano de testes completos, de modo a avaliar o impacto de um preço ‘sombra’ com o modelo finalizado e estável, antes de adotar a modalidade oficialmente. Para avaliação de Erico Brito, presidente da consultoria Excelência Energética, os agentes de comercialização já assimilaram a ideia do PLD horário, muito embora grande parte dos agentes não saibam como se comportará efetivamente. “Posto isto, acreditamos que o adiamento da sua adoção deverá ocorrer somente caso constatados erros que comprometam sua utilização.”

NECESSIDADE DE SINALIZAÇÃO HORÁRIA

A presidente da Consultoria Engenho, Leotina Pinto, questiona a necessidade de uma sinalização horária. Para ela, num passado recente era realmente necessário, pois o despacho térmico do Nordeste era chamado a opera intensamente nos momentos de maior carga e baixos ventos.

“Se analisarmos o momento atual, isso não mais acontece. Por exemplo, em março, de todo o despacho térmico do SIN (quase 8 GWmed), apenas aproximadamente 1,5 GWmed estão na ordem de mérito (18,75%). Por isso, os preços estão baixos. Uma parte expressiva está inflexível (não forma preços nem na ponta nem fora dela). Assim, com quase toda a geração térmica sem compor preços, o custo marginal de ponta não é muito diferente do custo marginal fora da ponta, e a sinalização horária perde a importância, mesmo que o modelo esteja (estivesse?) correto e confiável”, explicou a especialista.

Leontina sugere mais tempo para os testes do Modelo de Otimização Hidrotérmica Diária (Dessem). “Quem sabe até um olhar melhor para a fundação dos preços (Newave/Decomp) antes de olhar para qualquer edificação sobre a fundação. Os preços horários, neste momento, não foram validados pelo setor, não ganharam credibilidade e não são sequer um sinal necessário.”

“Temos acompanhado de perto os resultados publicados pela CCEE, e percebemos que os dados de entrada não são consistentes com os dados do Decomp. Não é possível estabelecer uma correspondência, uma sinalização. Então, não há qualquer indicativo sobre o desempenho do modelo – bom ou ruim”, disse Leontina.

Ela continua: “Vale notar entretanto que o próprio conjunto Newave/Decomp é considerado volátil, e muitas vezes seus resultados não são compreendidos – ou são contestados – pelos agentes. O Dessem seria mais um modelo sem o apoio setorial. Além de tudo, se não há uma confiança na cadeia Newave/Decomp, há uma desconfiança automática no seu refinamento (Dessem), que parte dos cálculos a mais longo prazo.”