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Nos próximos três anos, a presidência da Comissão de Especial da Direito de Energia da OAB de São Paulo será ocupada pela primeira vez por uma mulher. A economista e advogada Maria João C.P. Rolim, sócia da área de energia do escritório Rolim, Viotti e Leite Campos Advogados, é personalidade respeitada e conhecida no mercado e atua há 20 anos no setor elétrico.
PhD em Direito da Energia e Sustentabilidade pelo Centre for Energy, Petroleum, and Mineral Law and Policy (CEPMLP) na Universidade de Dundee/Escócia, a advogada também ocupa a presidência da Comissão de Regulação da Comissão Especial da OAB/Minas Gerais.
Maria João recebeu a Agência CanalEnergia em seu escritório próximo a avenida mais conhecida de São Paulo e falou sobre o atual momento de sua carreira e os desafios que precisarão ser enfrentados pelo setor elétrico nos próximos anos.
“Vivemos um dilema. Queremos soluções, mas sabemos que temos que esperar um pouco. Ao mesmo tempo a gente é empurrado pela tecnologia, por pressões econômicas e pela agenda regulatória. O pior dos mundos é o da indefinição onde nada acontece e não se sabe para onde vai. Eu não vejo o momento atual assim. Vejo o momento atual positivo”, comentou a especialista. Confira a seguir os principais trechos dessa conversa:
Agência CanalEnergia: Como se sente nesse novo desafio?
Maria João Rolim: Fiquei muito satisfeita por ter sido escolhida. É uma oportunidade desafiadora, porque São Paulo tem uma demanda muito grande. Digo isso porque também assumi a Comissão de Regulação Econômica de Minas Gerais. Mas por ser uma pauta mais horizontal eu consigo trabalhar com diversas comissões. Em São Paulo, além do número de advogados ser maior, é uma demanda muito direta. Entendo que fui escolhida pela minha capacidade técnica e tem todo esse desafio de ser uma mulher no setor de energia, que é uma pauta que tem sido muito debatida em segmentos mais técnicos ligados a engenharia.
Agência CanalEnergia: Qual é o papel da Comissão de Energia da OAB?
Maria João Rolim: A OAB sempre teve um papel muito relevante de resguardar o direito, e na Comissão de Energia o nosso papel também é esse, de resguardar direito, apoiar a regulação, às boas práticas, a transparência e dar conhecimento ao mercado do que está acontecendo.
A OAB tem várias comissões e em vários estados. A de São Paulo em particular é bastante requisitada e ativa. O papel da OAB na comissão de Energia é acompanhar os temas relevantes sob a perspectiva jurídica. Muito voltado a acompanhar pautas no Congresso e no Judiciário que envolvam a perspectiva jurídica, não necessariamente com a intenção de influenciar nas pautas, mas buscando resguardar que os direitos sejam garantidos.
Agência CanalEnergia: Estamos em um momento em que as relações institucionais estão sendo questionadas em nosso país. Como a doutora vê essa situação?
Maria João Rolim: Essa pauta do relacionamento institucional está muito quente dentro do mundo jurídico. No setor de energia está mais acirrada em particular por causa do momento de muitas ações judiciais. É muito importante separar quando eu falo como presidente e como advogada, sócia do escritório Rolim. Existe um papel relevante de quem está na Comissão da OAB de garantir que seja preservado o direito de acesso ao judiciário, que não seja confundido como o direito de prejudicar ou travar o setor.
Por outro lado, é preciso ter senso crítico para reconhecer que em alguns momentos o judiciário não é o melhor lugar para se decidir algumas questões. É preciso ponderar essa relação, pois afinal, é o que sustenta o nosso Estado Democrático de Direito. Sem os advogados não temos a garantia de que serão preservados os direitos e a democracia. A ordem não existe para proteger a classe e resguardá-la de qualquer crítica.
Agência CanalEnergia: Mas a senhora não acha que as relações estão um pouco tensas nesse momento. Isso seria preocupante?
Maria João Rolim: Na minha visão, não estamos mal como a maioria pensa. Estamos num momento mais tenso porque os assuntos são tensos. O país vem atravessando um momento político de polarização de ideias. A gente está atravessando um momento de mudanças estruturais no setor elétrico e isso de alguma forma causa uma polarização de posições. Pode não ser o ideal, mas que faz parte desse movimento. É um processo que tem impulsionado mudanças na regulamentação.
Agência CanalEnergia: Em sua opinião, as instituições do setor elétrico têm feito o seu papel?
Maria João Rolim: A gente tem várias instituições, temos o Ministério de Minas e Energia, Aneel, CCEE, o operador do sistema. Essa divisão de competências entre eles funcionou por um certo tempo, mas precisa ser revista. Outros entraves que foram para o judiciário foram por causados pela discussão de competência, por exemplo: CNPE nº03, Portaria 455. As liminares acabaram sempre sendo dadas em cima de limitação de risco e competências.
Agência CanalEnergia: Para onde vamos em termos de solução da judicialização do risco hidrológico?
Maria João Rolim: Essa discussão está muito no sentido de uma negociação natural do setor. Existe a ponderação das empresas, pois parte do acordo exige desistir da demanda judicial. Acho que as empresas sempre põem a conta na mesa, elas têm acionistas e precisam prestar contas. E o benefício as vezes não é só financeiro, mas o de destravar a liquidação na Câmara de Comercialização de Energia Elétrica. Essa é uma discussão que depende essencialmente das duas partes cederem de alguma forma. O bom negócio nem sempre é em termos de dinheiro, mas do que temos pela frente.
Hoje a grande discussão é que as empresas não têm gestão do risco hidrológico e do despacho das usinas e por isso elas não deveriam arcar ilimitadamente com o risco associado. Como esse foi o cerne da discussão, precisamos pensar em como vamos alocar de forma eficiente esses riscos.
Agência CanalEnergia: Qual a sua avaliação do trabalho feito pelo MME até agora?
Maria João Rolim: Há sempre a intenção de resolver. O fato é que não dá para prever o tempo de como as coisas vão se resolver. O grupo de trabalho é muito importante quando você não pode ponderar valores que não são hierarquicamente comparáveis. O que é mais importante: o meio ambiente e segurança energética? Os direitos humanos ou a liberdade de expressão?
O grupo de trabalho vai pegar o que estava andando na CP 33 e rediscutir dentro do novo governo. Talvez tenha sido até ingênuo achar que resolveria o GSF em 30 dias, mas teve o lado positivo de fazer o grupo. Ele vai ter a missão de fazer isso, ainda que seja mais lento do que a gente queira que acontecesse. Pelo menos o grupo deu uma perspectiva, estabeleceu o processo para uma solução.
Agência CanalEnergia: Temos tempo para aguardar essa solução?
Maria João Rolim: Vivemos um dilema. Queremos soluções, mas sabemos que temos que esperar um pouco. Ao mesmo tempo a gente é empurrado pela tecnologia, por pressões econômicas e pela agenda regulatória. O pior dos mundos é o da indefinição onde nada acontece e não se sabe para onde vai. Eu não vejo o momento atual assim. Vejo o momento atual positivo.
Existe uma proposta de tentar resolver, existe alguém pensando organizadamente como resolver e a sociedade está vendo isso. Não é o que a gente queria de fato, a gente queria uma solução mais rápida, mas não vejo muito como ter uma solução rápida quando a gente precisa mudar algumas coisas estruturalmente. Eu vejo uma tendência de liberar o mercado e acho que isso é o que o mercado quer.
Agência CanalEnergia: Qual a sua avaliação sobre os cenários macroeconômico e setorial?
Maria João Rolim: Vivemos um cenário econômico difícil. Tivemos uma eleição acirrada, uma mudança de orientação e talvez a gente esperasse nesses primeiros 100 dias um pouco mais de processos legislativos acontecendo e a coisa não mudou tanto e isso acaba tendo reflexo na economia como um todo.
No cenário setorial, acho que tem um papel interessante de planejamento, que deveria estar mais rápido sim. Para a gente ter projetos, precisamos ter um regulamento mais fino, saber detalhes da legislação que virá e isso a gente não tem. Existem discussões sobre quais medidas que precisam ser tomadas para destravar o investimento em infraestrutura.