Em sintonia com a transição energética que atravessa o mundo e, mais especificamente, o Brasil, o Cepel tem investido cada vez mais em estudos e pesquisa voltados à tecnologia de redes elétricas inteligentes, as chamadas smart grids. Ao final deste ano, deverá ser comissionado ao Centro a primeira fase do seu laboratório para a área, um dos primeiros do gênero no país. A infraestrutura, em fase de implantação na Unidade Adrianópolis, em Nova Iguaçu (RJ), permitirá o acoplamento de simulação em tempo real com equipamentos reais operando em carga.
O pesquisador Ricardo Penido Dutt Ross, chefe do Departamento de Tecnologias de Distribuição do Cepel esclareceu que além deste diferencial, o Laboratório de Redes Elétricas Inteligentes terá uma microrrede com um “mix” de gerações fotovoltaicas e convencionais, armazenamento de energia por baterias e cargas elétricas para testar diversos tipos de controladores de tensão e frequência com a microrrede operando ilhada.
Segundo ele, a área de ensaios de componentes, com destaque aos inversores fotovoltaicos, será inaugurada no primeiro semestre de 2020. “Com o advento da geração distribuída em níveis residencial e comercial é necessário ensaiar os inversores”, disse. Atualmente, o regulamento de etiquetagem dos inversores fotovoltaicos do Inmetro prevê ensaios de até 10 KW, mas Ross confirma já existir uma consulta pública sobre o novo regulamento, que prevê o aumento da potência desses equipamentos para 75 KW.
De acordo com Wagner Dubock, pesquisador do Departamento de Laboratórios de Adrianópolis e gerente do projeto do laboratório, a área de ensaios de componentes do Cepel terá a capacidade de até 200 kW e a perspectiva trabalhada é de que haverá muita demanda para este tipo de ensaio nos próximos anos. “Hoje as normas dos testes de inversores estão evoluindo continuamente, inclusive com pesquisadores do Centro envolvidos em sua elaboração. O laboratório estará capacitado a responder a todos estes novos desafios”, assinalou.
Outra área que será inaugurada na primeira fase é a de Power Hardware in the Loop (PHIL). Nela, poderão ser simuladas redes de distribuição e de transmissão operando de forma degradada, verificando-se o efeito da rede na geração distribuída. Como exemplo, pode-se citar a verificação de desligamento de unidades de GD em um sistema de distribuição durante oscilações sistêmicas na transmissão, com eventual necessidade de sinais adicionais de controle nos inversores devido a variações de frequência e tensão nas redes.
Para o pesquisador Ricardo, o laboratório poderá realizar no futuro provas de conceito do peak shaving (corte dos picos de demanda), usando armazenamento de energia com a microrrede operando em modo conectado; analisar a carga e descarga de baterias usadas em geração distribuída; verificar controladores de tensão e frequência com a microrrede operando no modo ilhado; examinar os protocolos de comunicação dos medidores de energia se comunicando com os concentradores; e verificar os riscos à segurança cibernética na comunicação entre equipamentos e sistemas usados em redes inteligentes devido à sobrecarga de comunicação, seja intencional ou não.
Sobre as vantagens das smart grids, o colaborador considera que com a GD localizada próxima ao consumidor, a importância de um sistema de distribuição mais robusto, mais tecnológico, que possa agregar estas novas fontes e realizar a operação da rede através de redes de comunicação como IoT – internet das coisas, torna-se vital. “Estes são conceitos das redes inteligentes”, afirma.
Ross também falou sobre a capacidade das redes inteligentes em observar, em tempo real, as condições de operação e corrigi-las quando for o caso. “A melhoria na automação usando redes inteligentes já está em curso em alguns locais do nosso país, de modo que já é possível reduzir o número de horas que um consumidor fica sem energia após distúrbios elétricos na rede”, comentou, afirmando também que ps novos sistemas de medição que enviam os dados para os Centros de Medição das distribuidoras em segundos estão sendo usados para combater “perdas não técnicas”.
Outro ponto ressaltado é o uso cada vez maior de energia solar e eólica, com armazenamento de energia através de baterias, num claro potencial de impactar a mobilidade urbana através do maior uso de Veículos Elétricos Plugáveis (VEP). A intenção é que, no futuro, o laboratório do Centro possa investigar, também, questões relacionadas a carga rápida de VEP.
Investimentos
Os projetos conceitual e básico do Laboratório de Redes Elétricas Inteligentes foram elaborados pelo instituto alemão Fraunhofer-Gesellschaft, com ampla experiência na concepção e administração de laboratórios do gênero no mundo. Para contratação da consultoria, o Cepel obteve recursos da ordem de 570 mil euros do Projeto META (Projeto de Assistência Técnica de Energia dos Setores de Energia e Mineral), iniciativa do Governo Federal, por meio do Ministério de Minas e Energia (MME), com o Banco Mundial. O Centro era um dos coexecutores da iniciativa.
Além de um panorama dos laboratórios de redes elétricas inteligentes em nível mundial e das principais normas que regem ensaios e provas de conceito, a consultoria envolveu, dentre outras ações, a definição do escopo de atividades e características básicas do laboratório, bem como a especificação técnica de suas áreas e de seus principais equipamentos.
A proposta é que o laboratório seja usado por empresas do setor elétrico e, principalmente, pelas distribuidoras para realização de projetos de P&D. “Com a inauguração, os projetos das distribuidoras poderão evoluir para provas de conceito que precisem ser realizadas em uma infraestrutura laboratorial ‘test-bed’, como a que teremos em breve”, destaca Ricardo, acrescentando que as empresas de transmissão da Eletrobras também poderão usar a localidade para realizar provas de conceito, principalmente na futura área de microrrede.
A implantação conta com recursos de P&D da Petrobras, sócia especial do Centro. Para o biênio 2018/2019, estão sendo aplicados cerca de R$ 9,5 milhões na compra de equipamentos, dentre eles um conjunto de quatro fontes CA programáveis 4 x 50kVA, para gerar potência, absorver potência ou ainda amplifica sinais; um sistema de aquisição de dados da área PHIL; um conjunto de três inversores programáveis 3 x 15kVA para conexão ao simulador de tempo real da área PHIL; um simulador de tempo real; cubículos de média e baixa tensão, transformadores e cabos BT e MT, com cerca de 1 km de extensão.