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Estabelecer um programa de modernização para o parque termelétrico a carvão mineral no Brasil, mantendo um fornecimento energético de 1800 MW para o setor industrial, com mais eficiência e menos emissões de CO2, desponta como objetivo principal da Associação Brasileira de Carvão Mineral (ABCM) no momento, afirma o presidente Fernando Luiz Zancan, sinalizando a previsão de que em 2040 cerca de ¾ da energia mundial será fornecida por combustíveis fósseis.

Em entrevista à Agência CanalEnergia, Zancan defendeu o carvão como fonte firme, flexível e de preços baixos e previsíveis, que independem de commodities e da variação cambial, atributos que podem ajudar na composição da matriz energética nacional, ao conferir maior confiabilidade ao sistema para a expansão das renováveis intermitentes, como a eólica e a solar.

O dirigente elogiou a decisão do governo em manter uma equipe técnica “a altura dos desafios pelo qual passa o setor elétrico”, citando a sobrecontratação das distribuidoras, o GSF e a judicialização do setor. Falou também sobre como andam as conversas com o MME sobre a inserção do carvão na pauta do acordo de cooperação internacional feito entre o presidente Jair Bolsonaro e líder americano Donald Trump, no intuito de viabilizar térmicas mais flexíveis e de partida rápida, uma das necessidades para a segurança energética atual dos países.

O presidente da ABCM participará do 16º do Encontro Nacional de Agentes do Setor Elétrico (ENASE), promovido pelo Grupo CanalEnergia/Informa Markets em parceria com 20 associações do setor. O evento está marcado para os dias 28 e 29 de agosto, no Rio de Janeiro, e terá como novidade o ENASE Gás, que vai discutir o mercado de gás natural no país. Veja a entrevista:

Agência CanalEnergia: Qual a avaliação da Associação quanto ao atual governo e a reforma pela qual o setor elétrico deve passar?

Fernando Zancan: O atual governo foi sábio em manter uma equipe técnica a altura dos desafios por que passa o setor elétrico brasileiro. Depois de 15 anos do modelo anterior que, por um lado, trouxe resultados robustos quanto ao desafio da expansão, atendendo a demanda e dando segurança ao crescimento do Brasil, por outro gerou sérios problemas com a interferência no mercado, através da proposta de reduzir a conta de luz.

Problemas, causados pela recessão e baixo crescimento, desde a sobrecontratação das distribuidoras, do GSF, da judicialização do setor e da inserção de novas tecnologias no setor de energia, fazem com que o modelo tenha que ser revisto. Para tanto o Governo está trabalhando para modernizar o modelo e isso é positivo para o setor.

Agência CanalEnergia: Como o carvão mineral pode ajudar o Brasil no processo de transição energética? O que o senhor destacaria como principais pontos e os desafios?

Fernando Zancan: O conceito de transição energética implica no uso de energia intermitente. Para termos energia 24×7 precisamos de fontes firmes, disponíveis e flexíveis, que tragam serviços ancilares como fornecimento de inércia, e que tenham baixo CVU e preços da energia elétrica previsíveis no longo prazo, ou seja, que independam de preços de commodities e de variação cambial.

Esses atributos o carvão mineral nacional tem e por isso pode ajudar a na composição da matriz energética brasileira. A substituição do parque termelétrico a carvão atual com eficiência média de 29% por um novo parque com usinas mais eficientes na faixa de 40%, além de promoverem a confiabilidade do sistema para a expansão das renováveis não controláveis, diminuirão as emissões de CO2 da matriz elétrica nacional.

Agência CanalEnergia: A estratégia do Presidente dos EUA, Donald Trump, é fomentar e apoiar o uso de energias limpas nos países em desenvolvimento. Como vão as conversas com o governo americano?

Fernando Zancan: O Governo americano está apoiando um Programa de desenvolvimento tecnológico denominado de FIRST (Flexible, Innovative, Resilient, Small and Transformative) que visa desenvolver usinas térmicas a carvão que sejam muito flexíveis com rampeamemto rápido, com capacidade de 50 a 350 MW, modulares com eficiência mínima de 40%. O conceito, busca dar opções tecnológicas para a modernização do parque termelétrico americano e deixar esse produto pronto para o mercado internacional em 2025.

Nós estamos acompanhando esse desenvolvimento e discutindo com o MME a inserção do carvão na pauta do acordo de cooperação feito pelo Presidente Bolsonaro com Trump.  Já estamos desenvolvendo desde 2007 ações conjuntas com o National Energy Technology Laboratory – NETL do Departamento de Energia dos USA, desde capacitação de pessoal, projetos de gasificação e o projeto de captura de CO2.

Agência CanalEnergia: O que é possível comentar sobre uma possível expansão da indústria do carvão no Brasil com uso de tecnologias limpas? Em que nível estamos e para onde podemos ir?

Fernando Zancan: A iniciativa principal da ABCM, neste momento, é estabelecer um programa de modernização do parque termelétrico a carvão e com isso manter a indústria de fornecimento de combustível. Estamos discutindo com o MME para substituir o parque velho por um novo (1800 MW), mais eficiente e com ganhos ambientais, reduzindo o CO2/KWh gerado. Com isso, a tecnologia de usinas supercríticas com eficiência de cerca de 40% teria espaço, ganhando 5 pontos percentuais de eficiência em relação a melhor usina existente que é subcrítica com 35% de eficiência.

Estudos de tecnologias de usinas ultrasupercríticas foram feitos, mas seriam usadas em caldeiras de carvão pulverizado de grande capacidade, cerca de 1000 MW.  A usina de Pampa Sul, que entrou em operação em julho deste ano, traz a primeira UTE de leito fluidizado circulante do porte de 340 MW e vem performando muito bem em termos de eficiência e baixa emissões.

Nosso entendimento é buscar sempre a melhor tecnologia para o uso no Brasil, combinando maior eficiência econômica e ambiental ao mesmo tempo trazendo ao sistema elétrico a flexibilidade necessária para atender o aumento de intermitência do sistema. Por outro lado, como o carvão tem um baixo CVU e pode ser despachado com usina de base, devemos acompanhar a evolução tecnológica das usinas de alta eficiência e baixa emissão (HELE) em especial as de tecnologia de Leito Fluidizado Circulante.

Agência CanalEnergia: Há o desenvolvimento hoje de inciativas de P&D voltadas uso do carvão mineral limpo ou outro tipo de tecnologia para sua obtenção ou utilização?

Fernando Zancan: No mundo existem muitas iniciativas na busca de tecnologias que tornem as usinas mais eficientes, com menores emissões, menor consumo de água, mais flexíveis, além da digitalização para melhorar a performance e principalmente nas tecnologias de captura, uso de subprodutos e armazenamento de carbono. Entre os exemplos há o Centro de Tecnologias como o NICE (National Institute of Clean and Low Carbon Energy) na China e o National Energy Technology Laboratory – NETL no USA.

Países como o Japão e Coreia do Sul também buscam desenvolver tecnologias limpas. No Japão está em desenvolvimento um projeto que usa a tecnologia da gasificação do carvão combinando com célula combustível, sendo que uma planta de demonstração de 166 MW que entrou em operação em novembro de 2016.

Também existem estudos para o aproveitamento de subprodutos, como a cinza para uso em pavimentação e material de construção e produtos de alto valor agregado. Como exemplo, estamos desenvolvendo no Brasil, no Centro de Tecnologia de Carvão limpo da SATC em Criciúma, uma tecnologia para transformar as cinzas de usinas térmicas em zeólitas sintéticas que podem ser usadas em detergentes e na indústria do petróleo. Além disso, o desenvolvimento tecnológico na indústria de produção de carvão está buscando desde a produção de nanografeno, até a obtenção de terras raras.

 

Previsão é de que em 2040 cerca de ¾ da energia mundial será fornecida por combustíveis fósseis

Agência CanalEnergia: Que políticas públicas devem ser criadas ou alteradas para incentivar o desenvolvimento de tecnologias para Captura, Uso e Armazenamento de Carbono?

Fernando Zancan: Todas as previsões sobre energia mostram um mundo resiliente aos combustíveis fósseis, sinalizando que em 2040 teremos cerca de ¾ da energia mundial sendo fornecida por combustíveis fósseis. Especialmente quando vemos que cerca de um bilhão de pessoas não tem acesso à energia elétrica e que no mundo temos 3 bilhões que não tem energia limpa para cozinhar.

O mundo do desenvolvimento aconteceu na Europa no século dezenove e nos EUA no século vinte, e agora vemos no século vinte e um o processo de industrialização e urbanização na Ásia, que depois irá para a África, num processo que será alavancado por combustíveis fósseis, visto que precisam de aço, cimento e energia.

Portanto se quisermos resolver a questão de emissões de gases de efeito estufa, precisamos desenvolver a captura do CO2. Ocorre que no mundo se incentiva as fontes renováveis, e se esquece de promover o mundo de baixo carbono, ou seja, se vai contra as fontes fósseis e não se promove as tecnologias de redução de emissão das fontes fosseis como a da Captura, do uso ou do armazenamento do Carbono. Enfim, a questão energética é comercial e não ambiental. Isso é visto pois os investimentos mundiais em desenvolvimento tecnológico no CCUS até 2016 foram de cerca $20 bilhões de dólares, o que equivale a menos de 1% de todo investimento feito nas energias renováveis.

Nos EUA foi definido uma política pública chamada de 45Q, que deverá prover cerca de USD 50 por tonelada de CO2 permanentemente estocado e USD 35 por tonelada usado para recuperação terciaria de petróleo (EOR) ou outros usos de CO2. Essa política pública pode ser a forma de incentivar a demonstração de projetos e acelerar a curva de aprendizagem da tecnologia de CCUS.

O programa americano visa chegar em 2030 com um custo de captura de CO2 de USD 30 por ton de CO2. A IEA estima que essa política possa alavancar capital novo de cerca de USD 1 bilhão nos próximos seis anos e potencialmente adicionar cerca de 10 a 30 milhões de toneladas de capacidade adicional na capacidade de capturar CO2. A implementação desta política poderá encorajar outros países a fazer o mesmo esforço para desenvolver essa tecnologia essencial para os esforços do Acordo de Paris, visto que, segundo o IPCC, se não usar o CCUS teremos um custo adicional de 140% na mitigação dos gases de efeito estufa.

Agência CanalEnergia: Como a Associação tem atuado no âmbito regulatório e de mercado ou o que está sendo delineado nesse sentido para os próximos anos?

Fernando Zancan: Entendemos que o caminho em curso para a modernização do setor elétrico é necessário e urgente e deve contemplar pontos específicos e um deles é a questão do carvão mineral. O Brasil, comparativamente à sua capacidade instalada e ao uso energético do carvão em termos mundiais, tem uma indústria carbonífera muito pequena, (menos de 2% da capacidade total instalada) se comparada à demanda de todo o país.

Porém o carvão mineral é muito importante para a segurança energética da região sul, e essencial para a economia de municípios das regiões mineiras, onde vivem centenas de milhares de pessoas, conforme restou extensivamente demonstrado no Grupo de Trabalho – GT interministerial Carvão Mineral coordenado pela Casa Civil, GT criado a partir do Aviso MME 198/2017.

Usinas a carvão mineral nessa região já começaram a fechar e continuarão em rota de desativação se for considerar cenário tendencial de nada ser feito. Isto é previsível. No limite, essa tendência do cenário que se formou a partir de algumas posições políticas de gestores governamentais anteriores, conduziria à extinção da indústria do carvão. Neste cenário de extinção da indústria do carvão, importantes impactos negativos previsíveis e imprevisíveis serão experimentados. No limite, grandes oportunidades de desenvolvimento econômico-social e tecnológico também seriam perdidas, conforme demonstrado a partir de diversos estudos, dentre os quais os do GT citado.

O Brasil é de proporção continental e possui importantes diferenças regionais no que concerne demanda e logística de geração e transporte de energia elétrica; possui características pontuais de recursos naturais, fontes de geração e incentivos tributários, entre diversas outras diferenças. O mercado brasileiro de energia e o desenho da comercialização de energia elétrica no país têm marcante característica centralizadora e isto traz muitas oportunidades e soluções de mercado em termos de Brasil.

Por outro lado, para tratar especificidades regionais, é preciso utilizar o mercado sob um enfoque regional, sob risco de prover soluções com aspectos de ineficiência, como, por exemplo, apenas citando um dos diversos aspectos: a alocação inadequada do ponto de vista elétrico de alguns empreendimentos de geração, por exemplo, que acarretam maiores gastos no reforço e ampliação do sistema de transmissão.

Assim, se faz desejável e até imprescindível uma ação direcionada, mas sem perder as boas características de uma solução de mercado, para tratar casos pontuais, limitados a uma fração do território nacional, como a questão específica da modernização do parque gerador a carvão mineral nacional, que está circunscrito em regiões mineiras de cada um dos estados da região sul: Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná.