A perspectiva da entrada de uma oferta expressiva de gás natural no mercado brasileiro deve demandar mudanças estruturais tanto na destinação quanto nas formas de consumo do energético. É o que representantes da academia e de empresas investidoras apontaram no painel “O Futuro do Gás”, durante a 16ª edição do Encontro Nacional de Agentes do Setor Elétrico (Enase), realizado nesta quarta-feira (28) no Rio. Com um potencial estimado na casa dos 120 milhões de m³/dia, o pré-sal é visto como a âncora para o desenvolvimento da cadeia de exploração, transporte e distribuição de gás nos próximos anos, suportado por um ambiente de maior competição e liberalização.
Na visão do professor Edmilson Moutinho, da Universidade de São Paulo, o Brasil precisará de um parque termelétrico operando na base ao longo dos próximos dez ou quinze anos para dar vazão à boa parte da oferta potencial de gás natural oriundo do pré-sal, o que, segundo ele, deverá forçar a rediscussão quanto ao modelo atual do setor elétrico. “Para que as térmicas deem vazão a essa grande oferta de gás esperada, toda a lógica de operação do sistema elétrico brasileiro terá que ser repensada”, destaca Moutinho. Isto porque, explica ele, a expansão da geração nos últimos anos vem sendo fortemente baseada em fontes renováveis, principalmente eólica e solar.
Moutinho destacou em sua exposição no evento que, ao longo dos últimos três anos – 2016, 2017 e 2018 –, os investimentos internacionais no setor de eletricidade superaram os recursos investidos nos segmentos de óleo e gás, diferentemente do cenário histórico. Essa tendência recente, disse ele, reforça a ideia que o escoamento do gás pelo lado da demanda terá que passar por várias alternativas de mercado. “O mercado de ‘power’ ficará cada vez mais difícil para o gás, dado o crescimento das fontes renováveis. Essa já é uma tendência mundial que o Brasil terá que acompanhar”, avalia o professor, sublinhando que a vocação natural do gás é ser um “substituto energético”.
O vice-presidente executivo da Golar Power Latam, Celso Silva, apontou no painel o setor de transportes como uma opção de mercado para absorver parte da oferta de gás prevista com a ampliação da exploração do pré-sal. Atuando há quatro décadas na área de gás natural liquefeito (GNL) em diversos mercados do mundo, a Golar se prepara para iniciar no início do ano que vem a operação comercial do mega projeto em Sergipe, que inclui uma termelétrica de 1,6 GW, um navio de regaseificação a 4 quilômetros da costa e um gasoduto. “É um sistema integrado inédito no Brasil, com um terminal offshore inovador”, diz. O projeto, leiloado em 2015, exigiu investimentos de US$ 1,6 bilhão.