A diretoria da Agência Nacional de Energia Elétrica decidiu não vincular diretamente o diferimento de parte da demanda contratada por consumidores do Grupo A ao decreto que autorizou o empréstimo da Conta Covid. Em vez disso, recomendou às distribuidoras que promovam a livre negociação dos pedidos de alteração do faturamento de demanda desses consumidores durante a pandemia para o valor efetivamente medido, a partir de balizas já existentes na regulamentação em vigor.
A decisão foi tomada nesta terça-feira, 19 de maio, quando a agência retomou a análise do pedido de postergação no pagamento da parcela não medida dos contratos de demanda, defendida pela Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres. A agência reguladora deve tratar ainda esta semana da regulamentação do Decreto 10.350, que estabelece as diretrizes para contratação das operações de crédito de socorro às empresas de distribuição.
A suspensão da cobrança de parte da demanda faturada por três meses representaria um diferimento de R$ 587 milhões para os consumidores do Subgrupo A4 e de R$ 282 milhões para os demais atendidos em alta tensão, segundo o diretor-geral da Aneel, Andre Pepitone. O cálculo considera a hipótese de que todos tivessem queda de 30% nos montantes contratados e todos solicitassem e tivessem o pedido de adiamento negociado com as distribuidoras. “Evidente que isso não vai acontecer”, lembrou Pepitone.
Autor do pedido de vistas que adiou a deliberação do tema pela diretoria no dia 28 de abril, Pepitone propôs inicialmente a publicação de uma resolução pela agência com as linhas básicas que orientariam a negociação, mas acabou concordando com os demais diretores que essas balizas já estão previstas na Resolução 414, de 2010.
Para a diretoria da Aneel, o próprio processo de liberação de recursos da Conta Covid vai dar às distribuidoras a liquidez necessária para que elas negociem acordos com os consumidores. A agência deverá atuar como mediadora nas negociações bilaterais, mas caberá às distribuidoras propor as condições na mesa de negociação.
O decreto publicado nesta segunda-feira (18) determina que o recursos contratados pela Câmara de Comercialização de Energia Elétrica para a Conta Covid serão usados na cobertura de déficits ou na antecipação de receitas das distribuidoras. Ele atende o pleito dos grandes consumidores industriais de energia, ao permitir a postergação do pagamento da diferença entre a demanda verificada e a contratada, ao sinalizar que uma parcela do empréstimo poderá ser usada na cobertura dessa diferença.
O valor será pago depois por cada consumidor beneficiado pelo diferimento, sem subsídio cruzado a ser bancado pelos demais consumidores. Para o Ministério de Minas e Energia, a possibilidade encaminha não apenas uma solução para o problema financeiro enfrentado pelos grandes consumidores, mas também o econômico, ao evitar que eles tenham de recorrer individualmente ao mercado para a tomada de crédito.
O presidente executivo da Abrace, Paulo Pedrosa, calculou entre R$ 150 milhões e R$ 200 milhões o valor a ser diferido entre abril e julho desse ano. Esse é o período proposto pela indústria para que seja feito o diferimento da cobrança. Ele defendeu que o mesmo tratamento seja dado aos consumidores conectados à Rede Básica.
O presidente da Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica, Marcos Madureira, reforçou que o segmento é favorável ao pleito dos consumidores, desde que o risco de uma eventual inadimplência não tenha que ser assumido pelas distribuidoras. “Acreditamos que a medida mais adequada é que esse risco fosse um risco sistêmico e não da distribuidora”, afirmou o executivo. Para Madureira, caso isso não seja possível, a alternativa é que o financiamento da conta Covid seja feito mediante a apresentação de uma garantia desse consumidor à distribuidora.
O diretor de Assuntos Econômico Financeiros da Associação Brasileira das Empresas de Transmissão de Energia Elétrica, Tiago Aragão, manifestou a preocupação das transmissoras com os contratos de acesso à Rede Básica. Aragão destacou que o pleito dos consumidores em relação à contratação de demanda das distribuidoras tem similaridade com a situação em relação à transmissão, e que uma eventual decisão nesse sentido impactaria na disponibilidade de recursos para investimentos que são obrigatórios. Pepitone frisou que ainda não há uma encaminhamento para esse assunto.
Pepitone destacou que já existem diversas ações de consumidores contra distribuidoras nos estados da Bahia, Mato Grosso, Minas Gerais, Piauí e São Paulo. Esses pleitos judiciais, caso acolhidos, disse, provocarão tratamento assimétrico entre os próprio consumidores, beneficiando apenas alguns. Para Pedrosa, a redução temporária do faturamento dos contratos evita a judicialização no setor.