A redução pela metade no preço do gás natural pode impulsionar investimentos em setores industriais altamente dependentes de energia, que passariam dos US$ 10 bilhões em 2019 para US$ 31 bilhões por ano em 2030. A projeção está em estudo da Confederação Nacional da Indústria sobre os impactos econômicos da competitividade do gás em atividades energo-intensivas como química, cerâmica, vidros, alumínio e siderurgia. Esse tipo de indústria consome 80% da demanda industrial de gás no país.

Os resultados positivos da queda do preço do insumo de US$ 14/MMBtu para US$ 7/MMBtu também se refletirá no faturamento dessas empresas, que pode aumentar em cerca de 40% em dez anos, assim como no resultado da balança comercial. O patamar de US$ 7 é o melhor dos três cenários traçados pela CNI, que prevê a reversão do atual déficit na balança para um superávit comercial de US$ 41,6 bilhões em 2030 nesses setores.

No pior cenário, de US$ 14, pode haver uma deterioração do quadro de importações a partir da recuperação da economia, com o déficit comercial atingindo em torno de US$ 47,8 bilhões. A expectativa se justifica porque os custos da produção doméstica são superiores aos dos produtos importados. Já o faturamento seria US$ 108,8 bilhões menor comparado ao cenário 1.

O impacto da recuperação da competitividade das indústrias de insumos básicos foi estimado a partir de três situações de preço, considerando o contexto atual de valoração do gás e duas situações alternativas de redução. Entre os dois extremos de preço analisados está o cenário intermediário em que o produto atingiria US$ 10,00/MMBtu.

O custo energético, especialmente do gás natural, é apontado pela indústria como um dos fatores que mais contribuiu para a deterioração da competitividade dos energo-intensivos ao longo do tempo. Os outros itens apontados são carga tributária, infraestrutura precária, taxas de juros elevadas e taxa de câmbio desfavorável. Dados da Consultoria Ex Ante mostram que entre 2000 e 2018, o custo unitário do gás para a indústria de transformação teve aumento real de mais de 1.200%.

Dados do ministério de Minas e Energia mostram, porém, que a situação começou a mudar em 2020, a partir da alteração dos contratos da Petrobras com as distribuidoras, firmados já no ambiente do programa Novo Mercado de Gás. Entre dezembro do ano passado e maio desse ano, a redução na cotação do gás chegou a 36%, em dólares americanos. Em reais, segundo o MME, a queda chegou a 15%, em razão das desvalorização da moeda brasileira no mesmo período. Desde janeiro de 2020, o preço da molécula, que antes era calculado a partir das cotações de uma cesta de óleos, passou a refletir a cotação externa do preço do produto.

Com os estragos provocados na atividade econômica pela pandemia do coronavírus, a indústria passou a apostar ainda mais no programa governamental lançado em julho de 2019 com a proposta de promover a modernização e o aumento da concorrência na cadeia de gás natural. Isso seria feito por meio de aperfeiçoamentos do marco legal e regulatório já propostos pelo Programa Gás para Crescer. Medidas infralegais também tentam acelerar a abertura do mercado, para aproveitamento das descobertas de gás natural do pré-sal e da produção de gás em terra, além da mudança do papel da Petrobras como agente dominante do setor.

A especialista em energia da CNI Juliana Falcão afirma que o acordo com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica para a saída da empresa de atividades da cadeia foi importante para essa mudança, mas ainda há um caminho a ser percorrido. Em 2020, reconhece, houve redução média de preços de 10% pela renegociação de contratos da estatal com a nova fórmula atrelada ao petróleo do tipo Brent. Além disso, o preço do petróleo despencou no mercado internacional, o que também afetou o preço do gás. A expectativa é de que em julho tenha mais uma queda de 15%.

A indústria tem pressionado o Congresso pela aprovação do PL 6407, que altera o marco regulatório da Lei do Gás. Para a especialista, há um senso de urgência na aprovação da matéria, mas é muito interessante ver o engajamento também dos estados, que terão um papel fundamental, a partir do novo marco, na modernização regulatória que vai acelerar o desenvolvimento do mercado de gás.