A descontratação de térmicas cujos contratos estão próximos de terminarem é uma opção que poderá ser analisada para reduzir a sobrecontratação das distribuidoras nos próximos anos. Esse seria uma alternativa para evitar os impactos da redução do consumo de energia decorrente da desaceleração da economia e que resultado até na revisão extraordinária da carga para o período até 2024. Mas os estudos ainda estão em andamento, pois há a necessidade de avaliar diversos fatores antes da tomada de decisão.
O presidente da Empresa de Pesquisa Energética, Thiago Barral, comentou em sua participação em webinário promovido pelo Instituto de Defesa do Consumidor (Idec) que entre os fatores que são necessários avaliar estão a necessidade de planejamento para o descomissionamento dessas usinas – inclusive em nível municipal, onde a usina opera – a eventual necessidade de recomposição dos contratos das distribuidoras, preocupação com os horários mais críticos do sistema, dentre outros. E sem esquecer do respeito aos contratos firmados, pois o Brasil é um país que respeita esses acordos.
“Nossa matriz mudou e continuará mudando. No momento que deixamos de contar com as térmicas é necessário avaliar o risco de contratar outra para o lugar, e não necessariamente podemos substituir integralmente essa fonte, pois o sistema necessitará da flexibilidade típica das térmicas”, comentou ele. “Há cuidados a serem tomados em relação à previsibilidade e competitividade da matriz, então o planejamento é importante”, acrescentou.
O secretário de Energia do Ministério de Minas e Energia, Rodrigo Limp, lembrou que essa deve ser uma ação de médio prazo. E ainda, que já existem outros mecanismos para a descontratação como o MCSD e o MVE, bem como as negociações bilaterais entre as partes. Mas concorda que considerando a retração da demanda talvez seja necessária alguma medida adicional e que nesse espaço pode ser considerada uma proposta para esses ativos que estão próximos de ter os contratos vencidos.
“Essa é uma quantidade significativa de térmicas, até 2024, por exemplo, são mais de 2 GW com CVU acima de R$ 300 por MWh”, ressaltou. E acrescentou ainda que é necessário saber como avançar com esse caminho uma vez que não se sabe se o sistema precisará dessa potência. E ainda que o governo tem estudado o tema, sendo esse caminho possível de ser seguido, reiterando que toda a equação de atendimento à demanda deve ser considerada. “Esse é o ponto que temos estudado, a preocupação com a segurança energética. Precisamos de flexibilidade e potência no sistema e como deveremos tratar esse tema após o encerramento dessas usinas.”, pontuou ele, que reforçou ainda a premissa de respeito aos contratos firmados.
No evento realizado pela internet foi apresentada uma proposta para a descontratação dessas térmicas como forma de mitigar o impacto aos consumidores. Segundo o acadêmico José Goldemberg, ex-secretário de Meio Ambiente do Estado de São Paulo, encerrar antecipadamente os contratos levaria a uma redução das emissões de gases de efeito estufa na casa de 10 milhões de toneladas de CO2 e a eliminação de cerca de R$ 1 bilhão em subsídios se considerar usinas que somam 1,5 GW em capacidade instalada. Ele citou ainda os impactos ambientais locais das usinas a carvão no sul do país e comparou-os a crateras da lua.
Goldemberg citou ainda entre as vantagens que essa antecipação ajudaria a promover a modernização do setor ao substituir usinas térmicas com baixo nível de eficiência por outras que, apesar de se utilizarem do gás são mais eficientes, bem como por renováveis, dentro do possível.
“Com o gás natural não é o ideal, mas qualquer usina dessa tecnologia tem eficiência entre 40% a 50%, já as usinas mais antigas estão na casa de 20% a 25% de eficiência, principalmente aquelas a carvão no sul”, afirmou ele.
Aliás, a modernização do setor foi um tema bastante debatido. Estavam presentes ainda o senador Marcos Rogério (DEM-RO), presidente da Comissão de Infraestrutura do Senado, e o deputado federal Lafayette Andrada (Republicanos-MG). Ambos destacaram a necessidade de acelerar a tramitação dos projetos que estão no Congresso Nacional que estão parados, o PLS 232 e o PL 8975 que trata do GSF e ainda o código brasileiro de energia.
Rogério disse que esse conjunto pode proporcionar a modernização que o país precisa, mas que é necessário criar o ambiente para a aprovação das matérias. Até porque, atualmente o Congresso Nacional tem focado nos assuntos que estão mais relacionados ao combate à pandemia de covid-19. Ele apontou que para destravar esse ambiente tem conversado com os parlamentares que apresentaram recursos sobre o PLS 232 para que o projeto seja liberado para envio à Câmara dos Deputados. São 12 recursos apresentados por diferentes senadores e que se alguns deles tirarem seus pedidos, a matéria pode avançar.
Por sua vez, Andrada comentou que o primeiro relatório sobre o código brasileiro, que é o relator, deverá ser apresentado em breve. Destacou a necessidade de que as regras do setor tenham clareza para evitar questionamentos jurídicos e que dessa forma o país possa ser mais atrativo aos investidores. Em sua análise o PLS 232 vai nessa direção.
Em comum há a concordância de que a modernização precisa incluir a separação entre o lastro e energia. Essa medida proporcionaria melhor conhecimento de custos da distribuidora que deve ser a responsável pela gestão da rede e o custo da energia que é consumida. Não somente os debatedores defenderam essa ação, bem como a audiência que contribuía nos comentários, entre eles pessoas que exerceram ou exercem cargos de liderança no setor, como o ex-diretor geral do ONS, Luiz Eduardo Barata, e o presidente da Abradee, Marcos Madureira.
Limp destacou que após as ações de curto prazo nas quais o governo tem trabalhado é necessário olhar no médio e longo prazo. E nesse sentido o PLS 232 deixará o setor mais moderno com a correta alocação de custos. Até porque, a tarifa de energia é um fator fundamental para a retomada da atividade econômica.