O Sistema Interligado Nacional (SIN) está sobreotimizado por causa da perda de 5 GW de carga devido aos efeitos da pandemia de coronavírus sobre a economia do país e o setor elétrico. Com isso, o sistema está operando com 70% de geração compulsória, sobrando uma margem “pequena” para o Operador Nacional do Sistema “otimizar” a operação.

Segundo o diretor de Planejamento do Operador Nacional do Sistema (ONS), Alexandre Zucarato, não há espaço para contratação de geração inflexível nos próximos 5 anos. “Dentro de um horizonte de 5 anos à frente, não há espaço para uma geração inflexível de qualquer natureza. Nós já temos 70% da geração compulsória, seja por restrições hidráulicas, uso múltiplo da água, inflexibilidade térmica, eólica, solar… o que sobra para ser otimizado é uma parcela muito pequena”, disse Zucarato.

Durante webinar promovido pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) nesta segunda-feira, 24 de agosto, a diretora da FGV Ceri, Joisa Dutra, questionou o operador sobre a necessidade de contratação de termelétricas para garantir a segurança do SIN, em um paralelo sobre o que está acontecendo na Califórnia, onde o sistema está à beira de um colapso por falta de planejamento energético.

“Com a consequência da redução da carga e da pandemia, o sistema está sobreotimizado. Foram 5 GW de redução de carga que tivemos. Na medida em que a carga crescer, teremos espaço na base para colocar uma geração inflexível, que tecnicamente é bem vinda…. Mas se não tem espaço abaixo da carga leve para colocar uma geração adicional inflexível ali, isso não ajuda, na verdade atrapalha a operação do sistema”, completou o raciocínio o diretor do ONS.

Dutra, que é ex-diretora da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), apontou, adicionalmente, que existem contratos vincendos, a partir de 2023, de 8 GW de térmicas a gás natural e 1,5 GW em capacidade instalada de usinas movidas a óleo.  Na Califórnia, políticas de incentivo as fontes limpas tiram cerca de 9 GW de térmicas que hoje estão fazendo falta. No Brasil, porém, as renováveis não entram no sistema deslocando outras fontes.

Zuracato, em resposta, explicou que o preço negativo (resultante de muita oferta de energia renovável variável e pouca demanda) é uma “resposta do mercado quando se tem geração compulsória demais”.

Sem térmicas, Califórnia sofre com falta de planejamento e descoordenação interestadual

Estudo dirá que o SIN suporta 50% de eólica e solar

O diretor do ONS antecipou o resultado de um estudo onde se constatou que o sistema elétrico brasileiro é capaz de suportar uma matriz com 50% de fontes renováveis variáveis mesmo que a carga atual dobre de tamanho no final do Plano Decenal de Energia 2029.

O estudo, segundo Zucarato, está para ser divulgado e foi contratado pelo Ministério de Minas e Energia, Banco Mundial, com financiamento do GIZ. O exercício foi pegar o final do PDE 2029, dobrar a carga e imaginar como seria esse futuro por “neutralidade tecnológica”.

“O resultado foi que o sistema com 50% de penetração de renováveis, com aquela configuração de estudos de aspectos elétricos e dinâmicos, o sistema fica de pé. A operação fica mais complexa, mas o sistema para de pé, dá pra manter o sistema funcionando mesmo com 50% de geração renovável variável”, disse.

Segundo a Empresa de Pesquisa Energética (EPE), as renováveis variáveis representaram aproximadamente 20% da matriz elétrica em dezembro de 2021 (PDE 2030), considerando eólica, solar e biomassa.

Na semana passada, EPE informou que a pandemia da Covid-19 causou uma postergação de dois anos na necessidade de contratação de potência elétrica, passando de 2024 (PDE 2029) para 2026 (PDE 2030).

Paralelamente, o governo federal ainda não cancelou definitivamente o leilão para contratação de energia térmica que estava previsto para ocorrer em abril de 2020 e que foi suspenso temporariamente por conta da pandemia de Covid-19.

Importância do SIN

Ainda em comparação com a Califórnia, Zucarato destacou a vantagem do Brasil ter um sistema interligado entre estados e regiões. Ele disse que se não fossem as linhas de transmissão e a capacidade de exportação da malha, a região Sul poderia ter sofrido um racionamento no primeiro semestre deste ano, uma vez que a região sofreu um forte seca e não pode contar com todo o potencial hidrelétrico local.

“Nesse primeiro semestre tivemos uma situação na Região Sul muito supercomplexa em termos de atendimento. Ee ela não tivesse pendurada no resto do Brasil estaria em racionamento”, disse o diretor do ONS.

“Só para fins de estudos, tiramos a geração hidráulica para ver o que acontecia, e o sistema parava de pé.  O suprimento de energia em si e de potência são problemas menores do que o suporte de reativos, que passa ser uma outra dimensão, isso permite chegar a uma conexão com essa análise”, concluiu.

O evento virtual sobre a modernização do setor também contou com as participações de Agnes da Costa, Chefe da Assessoria Especial em Assuntos Regulatórios do Ministério de Minas e Energia, e Alexandre Viana, sócio diretor da Thymos Energia.