A Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica reforçou em contribuição à Consulta Pública 35, que aprimora a resolução que regulamenta o decreto 10.350/2020, a tese de que as empresas tem direito ao reequilíbrio econômico dos contratos de concessão, com o reconhecimento da perda de mercado, da inadimplência e da sobrecontratação involuntária resultante da pandemia. O documento de 87 páginas foi entregue à Agência Nacional de Energia Elétrica na última segunda-feira, 5 de outubro, data final para envio de manifestações dos interessados.
A contribuição é embasada em pareceres dos juristas Carlos Ari Sundfeld, Carlos Ayres Britto, Maria Sylvia Zanella di Pietro, Marçal Justen Filho e Mauricio Portugal Ribeiro, que sustentam o direito à recomposição integral dos impactos decorrentes da crise sanitária do coronavírus e das medidas adotadas para o enfrentamento do problema. A análise jurídica ocupa um espaço maior que a própria proposta técnica da entidade.
Para a Abradee, o reequilíbrio integral é necessário, “e não há problema se isso ocorrer ao longo dos próximos anos, de forma amena.” Em nota divulgada nesta terça-feira, 6, o presidente da associação, Marcos Madureira, reafirmou que o empréstimo da Conta Covid não ficou com as distribuidoras. Os valores foram usados pelas concessionárias no pagamento a geradoras e a transmissoras e no recolhimento de tributos e encargos, mesmo com a queda de receita e o aumento de inadimplência. A medida também diluiu reajustes tarifários previstos antes da pandemia ao longo de cinco anos, a partir de 2021.
“Por outro lado, as diferenças de perda de mercado que impactaram a receita das distribuidoras, a sobrecontratação involuntária e o aumento das receitas irrecuperáveis não foram equacionadas ainda”, alertou Madureira. O executivo destacou que as empresas “apuraram números com profunda diligência” e “reuniram argumentos técnicos, econômicos e jurídicos” para subsidiar a Aneel na tomada de decisão.
Nos últimos dez anos, o segmento de distribuição foi o único que teve redução no custo pago pelo consumidor na tarifa de energia elétrica, argumentou o executivo da Abradee. “Se a conta de energia tivesse apenas o custo da distribuidora, esta seria 40% mais barata do que dez anos atrás. Isso não ocorre porque a carga de encargos, tributos e geração tiveram aumento no mesmo período.”
Proposta
Para a associação, que representa as distribuidoras, a proposta apresentada à Aneel “simplifica a regulação e se concentra no objeto da apuração, sem caminhos indiretos.” A Abradee entende que recomposição econômica da perda de faturamento deve considerar a diferença entre o faturamento esperado para 2020 e o realizado em cada área de concessão.
A expectativa de faturamento é obtida pela média de crescimento do mercado por um período de dez anos. “Nada mais natural que essa expectativa observe o mesmo horizonte utilizado pela própria Aneel para cálculo da justa remuneração regulatória, inclusive do prêmio de risco específico da atividade de distribuição”, afirma no documento com as contribuições.
Nessa linha, as distribuidoras propõem o uso do crescimento médio geométrico da energia injetada entre 2009 e 2019 para construir o cenário de referência para o ano de 2020, usado no cálculo da sobrecontratação involuntária. O repasse tarifário dessa diferença estaria condicionado ao exercício do máximo esforço das concessionárias para participação nos eventos de alívio contratual realizados após a aprovação da metodologia. A redução de contratos pode ser feita, por exemplo, por meio do Mecanismo de Compensação de Sobras e Déficits.
Descontentamento
A Abradee tem demonstrado desde o início descontentamento com a metodologia defendida pela Aneel para a análise dos pedidos de reequilíbrio econômico dos contratos. Na proposta de regulamentação do Artigo 6º do Decreto 10.350, a autarquia sugere aprimoramento das regras atuais, para casos extremos de atingimento do gatilho de desequilíbrio, e a criação de uma nova regra para casos não extremos, sem atingimento de desequilíbrio, mas com fatos geradores associados aos efeitos da pandemia.
Os impactos da crise podem ser tratados, dessa forma, por meio de Revisão Tarifária Extraordinária, se for constatado o desequilíbrio da concessão; ou por meio de Mecanismo de Flexibilização Tarifária Opcional (MFlex), condicionado a contrapartidas para os consumidores. Essa possibilidade de submissão dos pedidos de Recomposição Tarifária Extraordinária a uma espécie de “teste de admissibilidade” é justamente o que incomoda as distribuidoras.
Elas afirmam que a decisão da Aneel, “baseado em cláusula contratual não relacionada ao presente caso” violaria o que consideram um direito à recomposição integral. A agência argumenta que pretende evitar o reconhecimento no processo de ineficiências anteriores à crise desencadeada pelo coronavírus.
Outro ponto questionado é a limitação temporal para apresentação dos pedidos de RTE, que devem ser feitos preferencialmente a partir de março de 2021, para que a Aneel consiga calcular a inadimplência regulatória e as receitas irrecuperáveis decorrentes da crise sanitária. Já as solicitações de flexibilização tarifária devem ser protocoladas entre 1º de março e 30 de abril de 2021.
O cálculo do reequilíbrio das receitas irrecuperáveis deverá ser feito a partir de dezembro do ano que vem, para ambos os casos, “quando será possível observar os primeiros 12 meses da curva de envelhecimento dos faturamentos dos meses mais críticos da pandemia.” O resultado ficará na tarifa por 12 meses, a partir do próximo processo tarifário. Se for feita a correção da Parcela B, os efeitos serão aplicados até a próxima revisão tarifária.