Publicação divulgada pela Associação Brasileira de Armazenamento e Qualidade de Energia põe em xeque a eficácia de duas ações recentes do governo federal. Uma delas é o dispositivo da Medida Provisória 998 que permite a captura de recursos dos programas de Pesquisa e Desenvolvimento e de Eficiência Energética para a Conta de Desenvolvimento Energético. A segunda, estudo recente da Empresa de Pesquisa Energética concluindo pela inviabilidade econômica do uso no Brasil de sistemas de armazenamento de energia por baterias “atrás do medidor”, no horizonte decenal.

A MP determina que pelo menos 30% dos recursos dos programas regulados pela Aneel, que não estavam comprometidos com novos projetos até 1º de setembro de 2020, deverão ser destinados à CDE em favor da modicidade tarifária até 31 de dezembro de 2025. A edição atual da Carta Abaque lembra, porém, que em entrevista à Agência CanalEnergia, o diretor-geral da Aneel, André Pepitone, estimou uma redução no impacto tarifário de apenas 0,8% nesse período.

Pepitone informou na ocasião que os repasses previstos para a conta setorial somarão R$ 7,37 bilhões, considerando R$ 4,6 bilhões que estão em caixa mais R$ 2,77 bilhões que serão retirados do valor aplicado anualmente pelas empresas do setor elétrico, considerando o percentual mínimo de aporte.

“A mudança da destinação destes recursos, ainda que com um objetivo nobre, configura um desvio de finalidade em uma Política de Estado, comprometendo a continuidade da P&D do Setor elétrico no país, com resultados extremamente modestos sobre o valor final da tarifa de energia”, pondera o informativo. Para a Abaque, a redução da tarifa de energia depende de investimentos em tecnologia e inovação para modernizar o setor , e “qualquer outra abordagem trará apenas efeitos de curto prazo, sem atacar a “causa raiz” do problema.”

A rejeição à proposta da MP tem unido pesquisadores de diferentes instituições. A medida recebeu uma série de emendas de parlamentares, restringindo o alcance pretendido pelo governo.

De acordo com a associação, em 20 anos de existência o programa P&D das empresas do setor elétrico aplicou R$ 10 bilhões em cerca de 4.500 projetos, a um custo médio de R$ 2,2 milhões por projeto. Considerando um custo médio unitário de R$ 3 milhões até 2025, os recursos retirados pela medida permitiriam a contratação de aproximadamente de 2.500 novos projetos.

Armazenamento

O documento da EPE sobre o uso dos sistemas de armazenamento de energia no país é parte dos estudos do Plano Decenal de Energia 2030, que tem sido divulgados em cadernos temáticos. Intitulado “Micro e Mini Geração Distribuída & Baterias”, ele aponta para um custo ainda elevado da tecnologia, cujo preço final estaria na faixa de R$ 4.500/kWh, considerando uma solução de armazenamento turn-key , tanto para uso residencial quanto comercial.

As premissas que balizaram as conclusões da estatal são vistas como equivocadas pela Abaque,  que  insiste na proposta para que se desenvolva um “roadmap” sobre o tema. A entidade afirma que não pode divulgar os preços praticados por seus associados, mas garante que os sistemas de armazenamento de energia estão sendo cotados, comercializados e instalados entre U$ 380 e US$ 500/kWh.

As diferenças de preços ocorrem por várias razões. Os sistemas híbridos isolados tendem a ter valores menores pela menor complexidade de sistemas de controle; o custo está relacionado aos processos de interligação com as redes; sistemas de armazenamento maiores tem custo menor pelo ganho de escala e os projetos são contratados em diferentes condições de câmbio.

A entidade também questiona o cenário de vida útil de dez anos para as baterias, utilizado no estudo. “Isso está contra toda a literatura comercial contida em propostas, que indica o prazo de 20 a 25 anos como vida útil para baterias. Portanto, não há razão para descontar o fluxo de caixa por somente 10 anos, comprometendo o resultado do VPL (Valor Presente Líquido) e TIR (Taxa Interna de Retorno) resultantes destes cálculos.”

Há críticas também a um suposto custo baixo das térmicas à diesel, citado no estudo da estatal. Além de produzirem energia cara, afirma a Abaque, existem de 7GW a 9 GW em geração a diesel despachados diariamente no horário de ponta que contribuem para a péssima qualidade do ar e o aquecimento global.

As baterias também seriam também inviáveis como alternativa para adoção da tarifa branca, segundo a EPE. Em relação a esse ponto, a associação avalia  que o problema está no sinal oferecido pela modalidade tarifária, que não pune o uso da energia na ponta, nem incentiva o deslocamento do chuveiro elétrico para fora da ponta.