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A entrega da Medida Provisória 1.031/2021 pelo governo ao Congresso Nacional na noite da última terça-feira, 23 de fevereiro, teve diversas possíveis simbologias. A principal é que se trata de uma forma de acelerar o processo de desestatização da empresa, iniciado no governo de Michel Temer e que está parado. A consequência de haver mais demora na avaliação desse tema pelo Poder Legislativo é de que a venda pode ficar para depois das eleições presidenciais de 2022.

Uma outra questão é que o governo quer mostrar que, apesar das declarações sobre a Petrobras, ainda tem seu grau de liberalismo na forma de conduzir a economia do país.

A opção pela apresentação de uma MP, que tem prazo de validade e força de lei quando apresentada, é o instrumento que serve para dar esse ‘empurrão’ para o legislativo avaliar o tema. O que não ocorreu com o PL que estava na Câmara dos Deputados, que nem relator tinha designado pelo ex-presidente da casa, o deputado federal Rodrigo Maia (DEM-RJ).

Outro fator que o diretor presidente da Dominium Consultoria, Marcelo Moraes, apontou como importante para que o governo apresentasse a MP é o atual momento na relação entre o Executivo e o Legislativo.

“Foi inteligente da parte do governo apresentar a MP nesse momento. Estamos no início do ano então temos todo o tempo para tratar do tema”, comentou Moraes. “Não temos eleições nesse período e é um tema sensível. É ainda uma resposta ao mercado financeiro pelo episódio da Petrobras e a interferência, mostrando que há liberalidade no governo. E, por fim, a nova mesa do Congresso foi recentemente eleita, e a relação entre os Poderes está no seu melhor momento”, acrescentou o especialista durante o CanalEnergia Live transmitido na manhã desta quarta-feira, 24, pelas redes sociais Youtube e Twitter.

Para Moraes, os 120 dias deverão ser suficientes para a discussão do projeto de desestatização da Eletrobras. Para ele, se a MP caduca, só se retomará o assunto, eventualmente, pós-2022.

Contudo, há um certo ceticismo com o andamento dessa medida no Congresso Nacional. Rodrigo Machado, do escritório Madrona Advogados, acredita que o calendário joga contra o governo nesse momento. Segundo ele, o desafio está no trabalho para a modelagem econômica da Eletrobras e não apenas na MP que precisa ser avaliada no Congresso Nacional.

Ele lembra que não há grandes diferenças entre o PL e a MP que foi apresentada, houve o acréscimo de pontos que justificam a medida que é ter pontos considerados de urgência. A principal vantagem da MP, em sua análise, é o comando legal para que o BNDES inicie os estudos para a desestatização, uma vez que a elétrica não estava inserida no Programa Nacional de Desestatização (PND) do qual a estatal foi retirada pela lei no. 10.848 de 2004.

“Acho que é um desafio o prazo para não caducar a MP”, avaliou ele. “Há muitas questões sensíveis em que a Eletrobras está envolvida, mas a modelagem é sem dúvida um grande problema”, acrescentou ele.

Machado lembra do processo de desestatização da paulista Cesp, do qual participou. Pela sua experiência nesse assunto acredita que os estudos deverão ser mais extensos diante dos desafios como o empréstimo compulsório, a RGR, os valores das outorgas a serem pagos, as regionalidades de cada subsidiária e a gestão de ativos que transcendem a energia elétrica, como a água em Furnas e Chesf.

“Uma das críticas ao modelo é o não fatiamento da empresa em várias unidades”, disse o advogado. “Dá tempo para ocorrer a desestatização até o início de 2022, mas eu não acho que acontecerá”, alertou.

Já Raphael Gomes, do escritório Lefosse, diz que o prazo que o ministro Bento Albuquerque apontou recentemente, que a capitalização ficaria para o primeiro trimestre de 2022 é realista sim. Na análise dele, as questões de modelagem estão mais no campo financeiro. O fato de que a desestatização se dará por meio de uma oferta pública de ações na B3 ajuda a acelerar o processo, é menos complicada a modelagem. Até porque, com a MP o BNDES já pode iniciar os estudos.

“Como já há um processo em andamento há anos não se partirá do zero como foi em casos como da CEB”, disse Gomes. “Eu acredito que a Eletrobras já tem levantamento das informações para a modelagem, o Wilson Ferreira Junior [CEO da empresa até 15 de março] assumiu esse posto já pensando na desestatização”, lembrou Gomes que, por sua vez, concorda que, se o processo demorar e passar para o terceiro trimestre de 2022, perderá o timing de ser realizado.

Com um viés mais pessimista está Urias Martiniano Garcia Neto, do escritório Tomanik Martiniano Sociedade de Advogados. Ele disse que um sinal que pode ser interpretado como indicativo é a saída de Ferreira Jr do cargo de CEO. “Infelizmente digo que é muito difícil e remota a possibilidade de que a MP seja aprovada porque esse tipo de assunto demanda muita articulação, e não vejo que o governo tenha essa capacidade porque a Eletrobras está envolvida em muitas questões relacionadas a políticas e locais onde atua”, justificou.

Para o advogado, as concessões feitas na MP não devem ser suficientes para que ela possa passar pelo crivo dos parlamentares. Por isso, ele acredita que o prazo de 120 dias será insuficiente para que essa articulação seja feita, e assim, será mais uma medida que deverá caducar.

“Eu acho que o projeto é de extrema importância para o setor elétrico brasileiro e para a Eletrobras. Eu quero estar errado, mas infelizmente estou pessimista, precisamos ver ainda quantas emendas serão apresentadas e como o projeto ficará se passar”, finalizou ele.