O grupo de entidades empresariais identificado como União pela Energia enviou nesta segunda-feira (14) carta aos senadores reforçando os argumentos contrários à inclusão dos chamados “jabutis” no projeto de conversão da medida provisória da Eletrobras. O texto da MP 1031 está em tramitação no Senado e pode entrar na pauta do plenário desta semana, conforme indicação do presidente da casa, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), e do relator da matéria, Marcos Rogério (DEM-RO).

No documento, os empresários alertam sobre os riscos de aprovação da MP de privatização da Eletrobras com as mudanças incluídas na Câmara dos Deputados. O grupo formado por dezenas de associações do setor elétrico e de setores industriais afirma que as alterações propostas aumentam os custos da energia para o consumidor, comprometem a governança, enfraquecem o planejamento e a regulação do setor elétrico e ampliam a insegurança no ambiente de investimentos.

“As alterações do PLV (projeto de lei de conversão) com as reservas de mercado introduzidas interferem diretamente na competição e na transparência, que deveriam ser as bases para a modernização do setor”, reitera a carta. De acordo com o grupo “os custos impostos pelos “jabutis” aos consumidores poderão equivaler ao custo de outra Eletrobras.”

O União pela Energia questiona informações divulgadas na imprensa que apontam benefícios para o consumidor da aprovação da MP da Eletrobras. Um desses documentos é uma nota do Ministério de Minas e Energia, que fala em redução de até 7,4% nas tarifas dos consumidores do mercado regulado com a aprovação do texto da Câmara.

Quatro pontos são questionados pela indústria e segmentos do setor elétrico: a contratação obrigatória de até 6 GW de térmicas a gás inflexíveis, localizadas em regiões distantes de grandes centros de consumo e sem acesso ao combustível; a contratação de 2 GW de pequenas centrais hidrelétricas, que terão prioridade nos próximos leilões de energia nova; a prorrogação por 20 anos dos contratos do Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia e a destinação apenas ao mercado regulado da parcela do bônus de outorga que vai para a Conta de Desenvolvimento Energético.

Segundo o grupo, as premissas usadas nos estudos que apontam impactos positivos para o consumidor dessas medidas não consideram um cenário de expansão competitiva, resultante da interação do planejamento com os leilões de contratação. Em vez disso, a comparação parte de cenários de custos mais elevados decorrentes de decisões do passado, para apresentar alternativas que supostamente seriam mais vantajosas.

As avaliações apresentadas também não consideram os impactos das alterações aprovadas na Câmara em apenas uma semana de discussão sobre o planejamento setorial, a regulação e próprio papel do governo em formular políticas públicas. “A intervenção no planejamento é um grande erro conceitual, fonte de instabilidade regulatória e quebra legítimas expectativas – e potencialmente direitos, de quem confiou nas regras do mercado”, afirma o documento, que fala em fragilização da Empresa de Pesquisa Energética no cenário institucional.

No cenário econômico, também haveria efeitos sobre os investimentos, e, em última instância, a própria modernização do setor seria afetada. Haveria incorreção conceitual também no uso do Plano Decenal de Expansão de Energia, que é meramente indicativo no caso da geração, para justificar as térmicas na base e as PCHs.

Haveria equívocos ainda na combinação de medidas que naturalmente trarão impactos positivos para o consumidor, como a revisão das cláusulas comerciais do acordo de Itaipu, que deve reduzir as tarifas da usina a partir de 2024, com os efeitos de medidas estranhas à MP, para apresentar um saldo final positivo.

Alterações

Sobre a contratação de térmicas regionais, há uma justificativa de que elas substituirão antigas usinas a óleo, gás, carvão e biomassa com contratos encerrando entre 2022 e 2027. As associações afirmam que toda a capacidade de usinas a óleo diesel e a óleo combustível será substituída, na verdade, por termelétricas a gás natural já contratadas em leilões e que entrarão em operação até 2025.

Nesse período, devem entrar 4.500 MW dos projetos a gás das UTEs GNA I, Marlin Azul, Porto Açu, Barcarena e Parnaíba, sem contar a UTE Porto Sergipe I (1.500 MW), que começou a operar no ano passado. Somando os empreendimentos com contratos a vencer nos próximos seis anos, a capacidade é de 3.650 MW de UTEs e diesel e a óleo combustível, mais 1.100 MW de térmicas a gás. Para as entidades empresariais, o custo da contratação deveria ser comparado não com o das térmicas mais caras que já foram substituídas na prática, mas com projetos mais eficientes que perderão espaço no futuro.

Há críticas também à compra de energia das PCHs, cuja contratação deve superar os 2GW citados no projeto de conversão, considerando que elas terão 40% de reserva de mercado nos leilões até 2026. Além disso, limitações regionais tendem a encarecer o preço médio da energia dessas usinas, em razão dos custos de transmissão e da própria produtividade dos projetos. A energia das PCHs poderia ser atendida por renováveis mais baratas, diz a carta.

Outro ponto questionado é a extensão por 20 anos dos contratos do Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia, que vencem em 2026, como compensação pela alteração do índice de atualização monetária de IGP-M para IPCA. No caso do Proinfa, foi considerada apenas a economia que seria obtida pela redução de preços no período inicial, sem levar em conta os custos decorrentes da extensão dos contratos, alegam as associações.

A comparação mais adequada, segundo as entidades, deveria usar o valor presente dos contratos por toda extensão proposta no projeto de conversão da MP, levando em conta que eles podem ser substituídos em processos competitivos de contratação de fontes renováveis. A indústria calcula que com a renovação do programa poderia haver reduções de preço significativas para empreendimentos eólicos, reduções muito inferiores para pequenas centrais hidrelétricas e até aumento de preços para usinas a biomassa.

Já em relação aos aportes na CDE que virão do pagamento das outorgas das usinas descotizadas da Eletrobras, o argumento das associações empresariais é de que esse valor deve ser usado para abater os custos de todos os consumidores, já que os industriais contribuíram para a construção dessas usinas, por meio de empréstimos compulsórios. A carta também destaca que as MPs 998 e 1010 aumentaram recentemente o custo da CDE em R$2 bilhões ao ano, e a MP da Eletrobras também terá impacto no preço de produtos e serviços oferecidos à população.