Em entrevista exclusiva à Agência CanalEnergia, a ex-senadora Marina Silva (Rede) não poupou críticas à participação do governo brasileiro na 26ª edição da Conferência das Partes, a COP-26, que acontecerá em Glasgow, na Escócia. Segundo ela, o governo destruiu as políticas de proteção do meio ambiente, abandonou o plano de controle de desmatamento, se esconde atrás de uma política de crédito de carbono controversa e não tem nada a contribuir.
No evento, a delegação brasileira deve oficializar a meta de reduzir as emissões em 43% até 2030 e alcançar a neutralidade de carbono em 2050, além de apresentar uma proposta sobre crédito de carbono. Todavia, para ela, esses compromissos precisam ser detalhados e o Brasil não está preparado para o que o mundo espera.
“O mundo está discutindo taxar produtos carbono intensivo. Se nós tivéssemos nos preparado para ser o país que gera produtos de baixo carbono ou carbono zero, nós estaríamos oferecendo para múltiplos nichos do mundo todo produtos que são desejados por um grupo muito grande de consumidores”.
Para a senadora, o Brasil era para ser o pioneiro em políticas ambientais, já que tem as melhores condições de ter um modelo de desenvolvimento para fazer frente à crise ambiental global, mas chega sem ter muito a oferecer em termos de acordos e metas concretas.
“Estamos indo para a 26ª conferência do clima e a gente verifica que a humanidade através de seus governantes e uma parte de suas empresas parece que querem continuar caminhando rumo ao precipício”.
Política energética equivocada
A senadora é enfática ao dizer que o Brasil está na contramão dos compromissos ambientais, já que em plena pandemia da covid-19, em 2020, o país teve um aumento de 9,5% nas emissões de gases poluentes em 2020, segundo dados do Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SEEG), do Observatório do Clima, enquanto a média global de emissões sofreu uma redução de 7%.
Esse número, lembrou a ex-ministra do meio ambiente, foi puxado pelas queimadas nos biomas brasileiros. Já no setor elétrico, o Brasil é considerado referência em energias renováveis por ter uma das matrizes elétricas mais limpas do mundo. Entretanto, Marina considera que nossa matriz poderia ser mais diversificada, sem tamanha presença de hidrelétricas e nem precisar de recorrer tanto às termelétricas.
“Temos condições de ter uma matriz totalmente limpa sem precisar inclusive de nuclear, porque o potencial de vento e sol no Brasil é enorme e incomparavelmente maior do que qualquer país do mundo. Somando-se a isso, temos o potencial da biomassa”.
Ela afirma que o planejamento energético “é uma caixa-preta”, já que no seu entendimento não há transparência nem planejamento na política energética brasileira. Sobrou até para o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) as críticas, visto que o órgão não tem nenhum membro da sociedade civil. “É hoje [o CNPE] é feito por um clube de forma a não considerar a contribuição que a academia tem a acrescentar nessas decisões”, ataca.
Veja a entrevista completa:
Licenciamento ambiental
Marina Silva defendeu a não aprovação do licenciamento de algumas usinas quando ela ministra, como as hidrelétricas de São Luiz do Tapajós e Belo Monte. Segundo ela, muitas pessoas pensam apenas na viabilidade econômica dos empreendimentos e não levam em conta a viabilidade do ponto de vista socioambiental.
Marina ressalta que as licenças precisam da comprovação de viabilidade do ponto de vista econômico, social e ambiental. “Quando essa equação não fecha, não tem como ser viabilizado. A questão econômica não pode se sobrepor a todos os outros vetores”.
A questão da hidrelétrica de Belo Monte, de 11 mil MW de potência, mas é uma usina a fio d’água que gera um terço da potência em certas épocas do ano. Ela ressalta que foi um planejamento errado e que envolveu corrupção.
“Quando fui ministra do meio ambiente, eu não dei a licença [da usina de Belo Monte] porque não apresentava viabilidade econômica, nem social e nem ambiental. Nem mesmo do ponto de vista técnico havia viabilidade”, afirma.