O Brasil firmou importantes compromissos durante a 26ª edição da Conferência das Partes, a COP26, que está acontecendo em Glasgow, na Escócia, entre eles, de meta de reduzir a emissão de carbono em 50%, mas especialistas veem anúncio do governo brasileiro como um tipo de “pedalada climática” na tentativa de passar uma imagem de ambição ambiental ao mundo.

O anúncio feito por vídeo no pavilhão do Brasil na COP26 pelo ministro do Meio Ambiente, Joaquim Leite, foi o mais criticado. O governo prometeu elevar a meta de corte de emissões de gases de efeito estufa em 2030 de 43% para 50% em relação aos níveis de 2005 e pretende, entre outras coisas, restaurar e reflorestar 18 milhões de hectares de florestas até 2030 e alcançar a participação de 45% a 50% das energias renováveis na composição da matriz energética.

Entretanto, especialistas consideram isso uma espécie de “pedalada climática”, pois o que o Brasil fez foi voltar à meta que tinha sido apresentada em 2015 pela ex-presidente Dilma Rousseff. Segundo o presidente do Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental, Carlos Bocuhy, essa foi uma jogada de marketing.

“O que tivemos foi uma ‘pedalada climática’. O governo diminuiu 400 milhões de toneladas de gás carbônico equivalente (CO2e) da meta e às vésperas da COP26 retornou esse valor como sendo ambição climática, mas na verdade nada mudou”.

O que preocupa Bocuhy é o fato de o Brasil não ter capacidade operacional para manter suas metas e também porque “o Brasil destruiu o sistema de gestão participativa, o Conama, acabando com grande parte da normativa ambiental”.

O Observatório do Clima, em nota, disse que o ministro não esclareceu qual será a base de cálculo utilizada para a atualização, mas ela pode reduzir à metade ou eliminar a chamada “pedalada de carbono”, a regressão na ambição da NDC – a meta nacional no Acordo de Paris – proposta em 2020 pelo governo Jair Bolsonaro, que resultaria numa emissão adicional de 400 milhões de toneladas de gás carbônico equivalente (CO2e) em relação à meta anunciada em 2015 por Dilma Rousseff.

A especialista em gestão socioambiental da Synergia, Gabriela Goulart, acrescenta que os números absolutos de redução de carbono do inventário de emissões não estavam claros sobre as metas brasileiras. Já em relação ao plano de zerar as emissões em 2050, a executiva, afirma que faltou ao Brasil detalhar melhor como isso será feito.

“Sobre a neutralização das emissões até 2050, até hoje nunca foi formalizada uma política. O governo teria que apresentar medidas como a diminuição das emissões e mudanças sistêmicas, investimentos em energias renováveis, agroecologia, ou seja, isso um programa de política mínima para apresentar”, afirma Goulart.

Biometano entra na pauta internacional
Sobre as emissões de metano, o governo brasileiro reconheceu desde o encontro do G-20 que o gás na atmosfera representa uma contribuição significativa para as mudanças climáticas e que a redução pode ser uma das formas mais rápidas, viáveis e econômicas de limitar as mudanças climáticas e seus impactos. Entretanto, a fonte nunca entrou com relevância na matriz energética.

Gabriela Goulart, da Synergia, lembra que embora desapareça mais rápido da atmosfera do que o gás carbônico, o metano tem um potencial de aquecimento cerca de 25 vezes maior, por isso a importância de um olhar diferenciado a esse gás no meio ambiente. Desta maneira, o Brasil se junta a um grupo de quase 100 países em um esforço liderado pelos Estados Unidos e pela União Europeia (UE) para reduzir as emissões deste potente gás de efeito estufa e manter a temperatura global limitada a 1,5°C em relação aos níveis pré-industriais.

Líderes do mundo na foto oficial da COP26. Brasil ficou de fora

Hoje, boa parte das emissões brasileiras de metano vem principalmente do setor agropecuário, já que o Brasil é um dos principais exportadores de carne bovina do mundo. Nos cálculos da Associação Brasileira do Biogás (ABiogás), o Brasil tem um potencial de 41,9 bilhões de Nm³/ano, isso equivale a aproximadamente 16 GW de capacidade instalada.

A meta da entidade é chegar a 30 milhões de m³/dia de biometano e investimentos de mais de R$ 10 bilhões em novos projetos. O presidente da associação, Alessandro Gardemann, que está na COP26, acredita que é preciso atuar na agroindústria e no saneamento, capturando o metano para produção do energético.

“Queremos transformar estes setores em fábricas de produção de gás, para produzir energia elétrica, energia térmica, combustível, biometano (gás natural equivalente intercambiável) e biofertilizante”.

Para Carlos Bocuhy, do Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental, a questão do biometano no Brasil avance, depende mais do setor privado do que do setor público. “O governo pode estimular o setor privado, mas quem de fato põe a mão na massa é a iniciativa privada. É claro que para o setor privado interessa avançar em regularidade ambiental, porque o Brasil já vem sendo prejudicado no comércio internacional por conta da dificuldade com as commodities”.