Parada desde 2015 por denúncias de corrupção, as obras de Angra 3 devem ser devidamente retomadas em três meses, o que exigirá esforços consideráveis de engenharia e contratação de insumos e mão de obra qualificada. A ideia é concluir todo o processo e comissionamento da usina até 2027. A previsão foi passada nessa terça-feira, 26 de abril, pelo diretor técnico da Eletronuclear, Ricardo Santos, durante o painel da manhã do Nuclear Summit 2022.

“Assinamos um contrato recentemente para prosseguir com a construção civil e temos 80 funcionários já preparando a volta aos trabalhos, com expectativas de retomada em agosto”, pontua o executivo.

O próximo passo é definir a contratação de apoio para acompanhamento dos trabalhos, não só quanto ao controle de qualidade mas na supervisão da própria construção. Santos também mencionou algum trabalho necessário nos designs eletromecânico e civis, contratando empresas para apoiar essas atividades, além da realização do desenho de um novo prédio para o simulador digital próprio da usina.

“Minha expectativa é que a questão para construção do simulador vá ao mercado na forma de licitação em aproximadamente 2 meses, até o final de junho”, aponta, ressaltando que todos os pontos de implementação desse projeto específico já foram definidos.

Angra 1

Quanto aos processos de modernização das outras centrais, o diretor lembrou que Angra 1 terá sua licença expirada em 2024 e a Eletronuclear vem trabalhando na modernização da usina para pedir as autoridades brasileiras a extensão da vida útil do ativo em mais 20 anos. Os trabalhos deverão passar por melhorias nos sistemas primários e na modificação de parte da engenharia da planta para garantir a segurança e confiabilidade, melhorando também a saída de energia.

“Não há outra opção se não modernizar todos os sistemas. Trocador de calor, válvulas e outros componentes precisam ser substituídos, sob o pano de fundo do envelhecimento”, define Santos, ressaltando não ter ainda a equipe técnica necessária para implementar todas as modificações.

Simulador digital e sistemas de contenção estão entre os itens críticos para avanço de Angra 3 (Eletronuclear)

Entre as alterações ele cita a atualização da estação de água desmineralizada de Angra 1 para todos os sítios das outras usinas, numa tentativa estratégica contra risco de desabastecimento; o sistema de resfriamento e ar-condicionado na sala de controle e outros locais; proteção contra incêndios e a troca da caldeira secundária por uma mais eficiente e confiável, num caso típico de obsolescência e envelhecimento.

Angra 2

Com relação a Angra 2, em operação há 20 anos, o dirigente cita dois aspectos diferentes: o envelhecimento da planta e em alguns casos a evolução de algumas tecnologias trazendo o efeito da obsolescência, com a companhia não conseguindo encontrar alguns componentes no mercado como em 2002.

“Em Angra 1 não temos uma usina tão forte em termos de tecnologia de instrumentação e controle, diferente de Angra 2, que possui uma geração mais moderna e suscetível a obsolescência, sentindo mais as consequências do que a primeira unidade”, atenta Ricardo Santos.

Segundo ele, o trocador de calor está com deficiência de design para 40 anos de operação e há oportunidades de melhorias nos sistemas secundários elétricos, como regulador de voltagem e o interruptor de quebra de carga da central, responsável por parar a produção de energia, além dos sistemas de segurança e supervisão, trabalhando nesse momento para colocar em prática a segunda revisão de engenharia da unidade, para depois tomar algumas decisões pertinentes relacionadas a área de segurança.

Mão de obra e renegociação de contratos

Outro ponto abordado no evento foi a qualificação e disponibilidade de mão de obra no país, com a estratégia da Eletronuclear recaindo em recrutar mais funcionários nesse ano para treinamento e trazer empresas de engenharia temporariamente e algumas parceria de longo prazo que possam fornecer equipe para operacionalização e gerência das atividades, com pessoas experientes no mercado internacional.

“Temos a equipe para operacionalizar as usinas e mantê-las em funcionamento. Temos margem de design mas não temos a equipe necessária para dar apoio a todos esses desafios mencionados anteriormente”, comenta Santos, dando o exemplo que a modernização de uma máquina de recarga exigiria o suporte de companhias estrangeiras.

Nuclep pode fornecer maioria dos componentes para a modernização e expansão do parque nuclear (Nuclep)

Para o executivo, a coisa mais importante que o Brasil precisa fazer é oferecer uma previsão clara e sistemática sobre o futuro da energia nuclear no país, de forma com que os jovens profissionais possam entender a área como aquecida para suas pretensões profissionais, problema visto também atualmente na Alemanha. “É estabelecer como vamos seguir adiante com o negócio no país”, indica.

Quanto a ponta das fornecedoras, Ricardo Santos lembra que quando a construção de Angra 3 foi interrompida em 2015 muitos contratos para insumos e equipamentos também foram paralisados. A ideia agora é negociar com os players a retomada dos acordos envolvendo tanques, bombas, ventiladores e outros itens. No entanto algumas companhias, devido a conjunturas como a pandemia, alegaram não poder honrar mais com suas competências, o que pode abrir  muitas oportunidades no mercado em termos de novos negócios.

Perguntado sobre a função da Nuclep em fornecer a maioria dos componentes do programa nuclear brasileiro, Ricardo Santos disse que a estatal ligada ao MME sempre está no radar mas que o processo legal aponta a prioridade para licitação junto ao mercado, com a contratação direta sendo uma exceção. “Temos negociado com a Nuclep alguns trocadores de calor para Angra 3 devido ao fato de que a empresa que iria fornecê-los decidiu parar de atuar nesse mercado”, finaliza o executivo.