Estudo comparativo do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas mostra que o Brasil ainda tem um longo caminho para aproximar seus indicadores de liberalização de mercado aos dos países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico. A comparação foi feita especificamente entre os mercados de energia elétrica, mas a conclusão é de que a diferença no setor de gás é ainda maior.
Iniciativas legais em curso no Congresso Nacional, como o PL 414 podem, no entanto, reduzir a distância e aproximar o setor elétrico brasileiro dos padrões da OCDE, ao dar maior liberdade ao pequeno consumidor, destaca a nota técnica divulgada nesta terça-feira, 24 de maio. Uma apresentação dos principais pontos foi feita pelo diretor de Estudos e Políticas Regionais, Urbanas e Ambientais do órgão, Nilo Saccaro, durante evento do Ipea sobre a reformulação do modelo do setor.
“A incorporação dessa classe de consumidor ao mercado livre de energia permitirá, potencialmente, uma maior escolha e flexibilidade nos contratos negociados com as empresas comercializadoras, podendo até dar maior previsibilidade na evolução das tarifas futuras. Poderá ocorrer a portabilidade da conta de luz entre as distribuidoras, com o provável efeito de redução na tarifa”, afirma o documento produzido pela pesquisadora Maria Bernadete Sarmiento Gutierrez. Ele destaca que o Brasil tem uma das tarifas de energia elétrica mais elevadas do mundo, o que gera efeitos negativos sobre a competitividade das empresas e a renda real dos consumidores.
No estudo, são avaliados os processos de liberalização ocorridos no âmbito da OCDE e no Brasil, considerando a facilidade de acesso ao mercado de eletricidade e o nível de propriedade pública. A comparação é feita a partir de indicadores de regulação do mercado de produtos (PMR, na sigla em inglês).
Dados referentes ao PMR mostram que o valor médio do setor de energia para os países da organização é de 1,41, o que indica alto grau de liberalização. No Brasil esse valor é de 2,53, quase o dobro da média da OCDE indicando um menor grau de abertura do mercado local.
Nos cinco melhores países em valores PMR, que são Reino Unido, Alemanha, Portugal, Austrália e República Tcheca, o valor médio está em 0,44, e na Espanha, sexto colocado, o valor é de 0,73. Enquanto no setor elétrico brasileiro o PMR é 42% superior à média dos países da OCDE, no de gás natural essa discrepância chega a 122% em média.
O mercado do Reino Unido é o mais liberal, com PMR de valor zero, em um mercado sem a presença de empresas estatais e totalmente desverticalizado. Na Alemanha e na Suécia existem estatais com expressiva participação de mercado nos segmentos geração e distribuição, e na Espanha o Estado tem um pequena participação no segmento de transmissão. O Brasil, que também tem empresas do setor controladas pela União ou pelos estados, é o único país nesse grupo onde a venda de participações acionárias depende de prévia autorização legal do Congresso.
Em todos os cinco países transmissão e distribuição são atividades reguladas, sendo que o Brasil, diferentemente dos demais, se diferencia pela ausência de liberdade de escolha do fornecedor para pequenos consumidores residenciais e comerciais, cujas tarifas estão sujeitas à regulação.
Tarifas flutuando livremente, de acordo com o mercado, existem mesmo em países com forte presença estatal, como a Suécia, onde o Estado tem quase 100% no segmento de geração. E Alemanha, onde há participação estatal importante nos segmentos de geração e de comercialização.
No estudo, a pesquisadora destaca que a liberalização da contratação pode contribuir para a redução dos custos finais de energia elétrica no Brasil, “desde que o marco regulatório conduza a uma concorrência efetiva entre agentes comercializadores e geradores.” “Espera-se que isso ocorra em um contexto de tarifas de transporte reguladas de forma justa pela Aneel e em um marco de governança aprimorado pelas novas circunstâncias.”