Em audiência pública da Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara dos Deputados sobre a política de uso de termelétricas movidas a gás, realizada na manhã desta terça-feira, 31 de maio, o deputado Elias Vaz (PSB – GO) pediu um movimento para revogação da contratação dos 8 GW inseridos na Medida Provisória de capitalização da Eletrobras. O pedido veio após representantes de associações industriais e agências reguladoras de Energia e Petróleo revelarem que o tema não foi debatido em tempo hábil e que não participaram de estudos prévios. Os impactos da contratação também justificaram o pedido de Vaz.
“Temos que pensar em um movimento para dar um jeito de reverter isso, não podemos simplesmente dar como situação consolidada. Temos que fazer uma discussão ampla, o que deveria ter sido feito antes de ser aprovado”, afirmou. De acordo com Vaz, os deputados foram surpreendidos com a inserção do item no relatório pouco tempo antes da votação.
Durante a audiência, a maioria dos convidados apontou os vários impactos que a contratação trará ao setor elétrico e aos consumidores de energia. O presidente-executivo da Associação Brasileira dos Grandes Consumidores de Energia e Consumidores Livres, Paulo Pedrosa, alertou que o custo das UTEs a partir de 2030 será entre R$ 19 bilhões e R$ 27 bilhões ao ano, um aumento de até 10% na tarifa. Os investimentos nos gasodutos podem chegar a R$ 89 bilhões e na transmissão o custo ficaria em R$ 600 milhões ao ano. “Na nossa visão, essa solução não atende o interesse da competitividade da economia brasileira, apesar de ser uma realidade imposta na lei”, frisa.
Ainda de acordo com Pedrosa, essa energia térmica vai acabar impactando na entrada de projetos renováveis de outras regiões, já que o espaço do mercado estaria definido por essas térmicas. Haverá ainda um aumento nas emissões e a entrada em operação das UTEs deslocaria a produção das UHEs, causando perdas em outros geradores, que buscarão reparação. “Os efeitos finais para os consumidores são talvez ainda maiores”, avisa. Segundo Pedrosa, para cada R$ 1 que se gasta na conta de luz, são gastos R$2 ou mais da energia dos produtos que ele compra. Energia é quase 36% do preço de um caderno, na carne é 33% e no pão, 27%.
Para a Confederação Nacional da Indústria, a contratação dos 8 GW da MP da Eletrobras é mais uma política inadequada para o setor, pelo aumento de custo e emissões. Wagner Ferreira Cardoso, da CNI, alertou que a participação da indústria no PIB vem caindo no mundo todo, mas no Brasil cai em velocidade maior. Uma das razões seria o preço da energia, que no passado se mostrava competitivo. ‘Hoje energia é um entrave para o desenvolvimento da indústria”, relata.
A complexidade no planejamento do setor foi abordada por Claudio Sales, do Instituto Acende Brasil. Ele conta que cenários mostrados pela Empresa de Pesquisa Energética no Plano Decenal e Energia mostram que a inserção dessas usinas na base demandariam investimentos na expansão, de R$ 192 bilhões e o custo operacional ficaria em R$ 145 bilhões em dez anos. Já o cenário chamado ‘rodada livre’, com as demais fontes na expansão, o investimento cairia para R$ 173 bilhões e a operação custaria R$ 93 bilhões. “A inclusão forçada desses 8 GW traria R$ 18,3 bilhões a mais de investimentos o custo operacional vai significar R$ 52 bilhões a mais”, adverte.
Mario Menel, presidente do Fase, também salientou a importância do planejamento e que o operador do sistema pedia térmicas, mas desde que ficassem próximas dos centros de carga e produção. “O planejamento setorial dever ser respeitado, sob pena de termos perda de qualidade da governança do setor’, avisa. A construção de gasodutos também seria bem-vinda, mas desde que para desenvolver um mercado, sem subsídios.
Anton Schwyter, coordenador do Programa de Energia e Sustentabilidade do IDEC, lembrou que os R$ 40 bilhões de custos do leilão emergencial do ano passado – que representa um volume de energia que os da emenda de UTEs – estão sendo questionados no TCU. Ainda segundo ele, o ritmo das tarifas vem aumentando nos últimos anos. Schwyter também rebateu durante a audiência o argumento que as usinas potencializam a construção de grandes indústrias nas suas regiões. “TermoCuiabá e o Complexo do Parnaíba não garantiram a instalação de nenhum consumidor industrial, mostrando que a solução é estrutural”, aponta.
Juliano Bueno de Araújo, presidente do Instituto Arayara, pediu uma CPI da Energia. Segundo Araújo, as empresas de óleo e gás possuem isenção de imposto de renda que chega a R$ 800 bilhões. Ele quer mais agilidade na transição energética, dando como exemplo Fukushima, que após o acidente não teria investido em novas usinas e sim um grande programa de eficientização energética.
O biogás pode ser adotado para suprir parte dessas termelétricas, evitando gasodutos. Há grande potencial da fonte e segundo Tamar Roitman, gerente executiva da Associação Brasileira do Biogás, uma usina movida a biogás é equivalente a uma de gás natural. Desenvolver uma indústria nacional de gás renovável traria segurança energética, desenvolvimento e competitividade para o país. Ela pediu um planeamento ordenado e políticas que tragam reduções de custos.
Para a gerente da Abiogás, a fonte ainda está em desenvolvimento e pode promover redução de custos, por estar em todas as regiões do Brasil. Cotada em reais, não estaria sujeito a volatilidades externas e oscilações de preço.
O parlamentar elogiou as apresentações dos participantes durante a audiência, considerando-as técnicas e importantes. Porém, ele não poupou o empresário Carlos Suárez, que não foi à audiência. Suárez é acionista de empresas da área de gás e apontado como um potencial beneficiário da emenda que inseriu as térmicas na MP. Elias Vaz se queixou do comportamento do empresário, que segundo ele, teria criado dificuldades com a assessoria da Câmara para ser convocado. “Quando a pessoa se comporta assim é porque no fundo ela mesmo acha que o que faz está errado”, critica.