A decisão do Ministério de Minas e Energia de abrir o mercado na alta e na baixa tensão é uma sinalização, mas terá de ser obrigatoriamente suportada por um conjunto de regulações da Agência Nacional de Energia Elétrica. “O ato em si é um farol. No entanto, temos um grande caminho a percorrer até chegar este momento”, afirmou o diretor-geral da Aneel, Sandoval Feitosa, em entrevista nesta segunda-feira, 3 de outubro.

A agência reguladora preparou um estudo para o ministério sobre os impactos, as vantagens e desvantagens da liberação do acesso de consumidores da baixa tensão ao ambiente livre. O documento acabou subsidiando a proposta que o MME apresentou para consulta pública na última sexta-feira, 30 de setembro, com contribuições até 1º de novembro.

O governo sugere a abertura a partir de 2026, exceto para residências e consumidores rurais, que poderão escolher livremente o fornecedor de energia elétrica apenas em 2028. Dois dias antes, o ministério tinha publicado a Portaria Normativa 50, que amplia a abertura para o chamado Grupo A, a partir de janeiro de 2024. Tanto os consumidores remanescentes da alta tensão (carga abaixo de 500 kW) quanto os do Grupo B (baixa tensão) serão representados na Câmara de Comercialização de Energia Elétrica por comercializadores varejistas.

Feitosa lembrou que já existe um aparato regulatório em relação à atividade desse agente de mercado, mas há ainda outras regulamentações relacionadas ao varejo que não estão completamente concluídas. Há, por exemplo, a questão das garantias. Como ficariam os consumidores que eventualmente tenham algum problema de suprimento com a comercializadora.

No caso da alta tensão, há menos pontas a serem amarradas. Para os consumidores em baixa tensão, que são muito mais numerosos, é preciso “trabalhar no framework regulatório para poder comportar essa mudança”, que “é estrutural e de bastante impacto.”

Um dos pontos mais citados nesse universo de consumidores, não apenas pelo diretor-geral da Aneel, mas pelo próprio setor elétrico, é o que fazer com os contratos de compra de energia firmados pelas distribuidoras com base em projeções de mercado. Há ainda outras questões sobre como fazer um processo de comunicação ampla para que o consumidor saiba como escolher seu supridor; quem ficaria com os riscos de default dessas comercializadoras e como representar essa quantidade de consumidores tendo uma só câmara de compensação, que é a CCEE.

“Às vezes um ato, uma decisão, precisa estar suportada por outras ações. Nós estamos falando de 85 milhões de consumidores. Outros países fizeram isso, mas o Brasil tem um porte muito diferenciado. E também há grande diversidade de consumidores”, ponderou Feitosa.

O diretor da Aneel reconhece que parte das medidas dependem também da aprovação do PL 414, que tramita na Câmara dos Deputados e tem como relator o ex-ministro Fernando Coelho Filho. O projeto de lei de modernização do setor altera o modelo comercial do setor elétrico e tem como um dos pilares a livre escolha do fornecedor de energia elétrica, batizada de portabilidade da conta de luz.