O suprimento de energia limpa deverá dobrar nos próximos oito anos como forma de limitar o aumento da temperatura global. De outro lado, se isso não ocorrer, há um risco de que o clima fique mais extremo e o stress hídrico chegará a um ponto que a segurança energética inclusive das fontes renováveis seja ameaçada. Essa é a principal conclusão de um relatório da Organização Meteorológica Mundial (WMO, na sigla em inglês). Segundo a publicação que está disponível para download em inglês, o foco em energia neste ano deve-se ao fato de que esse é o principal fator que impacta a saúde climática do planeta.
As promessas de investimentos em energia renovável representam atualmente menos da metade do que é necessário para alcançar as metas de combate às mudanças climáticas. Segundo estimativa da WMO, o caminho para alcançar a meta global de temperatura de longo prazo do Acordo de Paris exige que 7,1 TW de capacidade de energia limpa sejam instalados até 2030, de acordo com números citados no relatório, mas com os números de hoje em dia deverá ficar bem afastado da meta.
Além disso, a entidade aponta que os investimentos em energia renovável precisam triplicar até 2050 para colocar o mundo em uma trajetória líquida zero até 2050. Citou que em 2019 e 2020, a maioria dos investimentos em energia renovável foi feita na região do Leste Asiático e Pacífico (principalmente China e Japão), seguida pela Europa Ocidental e América do Norte. Alertou ainda que os países em desenvolvimento estão sub representados no que diz respeito ao acesso ao financiamento de energia limpa.
Os fluxos financeiros públicos internacionais para países em desenvolvimento em apoio à energia limpa e ao cumprimento do ODS 7 diminuíram em 2019 pelo segundo ano consecutivo, caindo para US$ 10,9 bilhões. Esse nível de apoio foi 23% inferior aos US$ 14,2 bilhões fornecidos em 2018, 25% inferior à média de 2010-2019 e menos da metade do pico de US$ 24,7 bilhões em 2017.
Segundo avaliação do secretário geral da entidade, Prof. Petteri Taalas, a energia está no centro da resposta global para a Agenda 2030 para o desenvolvimento sustentável do Acordo de Paris. Essa visão tomo como base o fato de que a energia contribui com cerca de três quartos das emissões de gases de efeito estufa em termos globais. Por isso, trocar as formas de geração para fontes limpas como a solar, eólica e hídrica, bem como aprimorar ações de eficiência energética “é absolutamente vital se quisermos alcançar ainda no século XXI essa meta”. E acrescentou que “o tempo não está ao nosso lado e nosso clima está mudando diante de nossos olhos. Precisamos de uma transformação completa no nosso sistema global de energia”.
O acesso a informações e serviços confiáveis sobre água e clima será cada vez mais importante para fortalecer a resiliência da infraestrutura energética e atender à crescente demanda que é projetada em cerca de 30% nos últimos dez anos.
As mudanças climáticas, continua a WMO, afeta diretamente o fornecimento de combustível, a produção de energia, bem como a resiliência física da infraestrutura energética atual e futura. Avalia que as ondas de calor e secas já estão colocando a geração de energia existente sob estresse, tornando ainda mais importante reduzir as emissões de combustíveis fósseis. E afirma que o impacto de eventos hídricos e climáticos extremos mais frequentes e intensos já é claro. Cita quedas maciças de energia causadas por uma onda de calor histórica em Buenos Aires, Argentina, e ainda, a ocorrência de chuva gelada que revestiu linhas de energia no Extremo Oriente da Rússia. Em ambos os casos, centenas de milhares de pessoas ficaram sem fornecimento de energia elétrica.
A questão da escassez hídrica acaba não afetando apenas a geração renovável. Esse fato deve-se à necessidade da própria geração térmica acessar esses recursos para resfriamento. A WMO lembra que em 2020, 87% da eletricidade global é gerada por sistemas térmicos, nucleares e hidrelétricos que dependiam diretamente da disponibilidade de água. Enquanto isso, 33% das usinas termelétricas que dependem da disponibilidade de água doce para resfriamento estão em áreas de alto estresse hídrico. Este também é o caso de 15% das usinas nucleares existentes, uma parcela que deverá aumentar para 25% nos próximos 20 anos. Além disso, essas usinas ainda enfrentam a ameaça de elevação do nível do mar.
Além disso, 11% da capacidade hidrelétrica também está localizada em áreas com alto estresse hídrico. E aproximadamente 26% das barragens hidrelétricas existentes e 23% das barragens projetadas estão dentro de bacias hidrográficas que atualmente têm um risco médio a muito alto de escassez.
Apesar desses riscos, constata a entidade, as ações não estão sendo tomadas em um ritmo adequado. Apenas 40% dos planos de ação climática apresentados pelos governos à UNFCCC priorizam a adaptação no setor de energia, e o investimento é correspondentemente baixo. Por isso aponta que a oferta de fontes de baixas emissões precisa dobrar até 2030 se o mundo quiser atingir zero líquido até 2050.
“Uma transição para energia renovável ajudará a aliviar o crescente estresse hídrico global porque a quantidade de água usada para gerar eletricidade por energia solar e eólica é muito menor do que para usinas de energia mais tradicionais, sejam de combustível fóssil ou nuclear”, sinaliza.
As políticas e regulamentações necessárias para permitir a descarbonização no setor de energia ainda são particularmente fracas na África, América do Sul e Ásia, segundo o Banco Mundial. E o reconhecimento da necessidade de serviços de apoio às energias renováveis é particularmente baixo nas Contribuições Nacionalmente Determinadas para o Acordo de Paris.
Mas, o relatório contém notícias positivas apesar deste cenário. Destaca as oportunidades para redes de energia verde ajudarem a combater as mudanças climáticas, melhorar a qualidade do ar, conservar os recursos hídricos, proteger o meio ambiente, criar empregos e salvaguardar um futuro melhor.
Até 2050, as necessidades globais de eletricidade aumentarão ao longo dos anos, isso porque a eletrificação é vista como uma alavanca estratégica para atingir as metas do Net Zero. Esse caminho será atendido por meio da energia renovável, sendo a solar a maior fonte de fornecimento, relata a WNO. “Os países africanos têm a oportunidade de aproveitar o potencial inexplorado e ser os principais players do mercado. A África abriga 60% dos melhores recursos solares do mundo, mas com apenas 1% da capacidade fotovoltaica instalada”, sinaliza.
A entidade passou a emitir relatórios anuais sobre o estado dos serviços climáticos desde 2019 em resposta a um pedido da ONU para obter mais informações sobre as necessidades de adaptação dos países. A edição deste ano inclui contribuições da Agência Internacional de Energia (AIE), Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), Agência Internacional de Energia Renovável (IRENA), entre outras otgrnizações do setor privado e da sociedade civil.
O relatório foi apresentado nesta quinta-feira, 13 de outubro, em um evento do World Energy Council, realizado na Escócia.