O último dia do Brazil Windpower 2022 começou com a notícia da publicação de duas portarias do MME referentes ao principal tema de debates no evento: o desenvolvimento da fonte eólica offshore. A receptividade às medidas contidas nos textos foi positiva e as diretrizes e regras foram classificadas como um primeiro passo que traz a segurança jurídica que viabilizará os estudos futuros da tecnologia por aqui. Contudo, ainda há muito a se fazer e a perspectiva ainda é de que os primeiros aerogeradores em alto mar possam começar a operação comercial no horizonte de 2030.
Entre os investidores potenciais na fonte há demandas que precisam ser equacionadas como a perspectiva de apresentação de cronograma não ser exigido quando do leilão da cessão de área, pois demanda estudos ambientais complexos e sensíveis. Outra questão colocada para o curto prazo é a necessidade de que os primeiros leilões de cessão possam ocorrer até o final de 2023, como criar mercado ou demanda para todo esse bloco de energia da offshore. E ainda, isonomia entre os competidores não existindo reserva de mercado para a indústria de óleo e gás, entre outros pontos.
De acordo com Diogo da Nóbrega, presidente do fundo Copenhagen Infrastructure Partners (CIP) e Copenhagen Offshore Partners (COP), para desenvolver um projeto offshore de 1 GW são necessários US$ 100 milhões. Segundo ele, é preciso ter um arcabouço seguro para que possa convencer as empresas a investir esse dinheiro. “Ninguém coloca esse dinheiro se não há segurança jurídica”, avalia ele.
O executivo elogiou os movimentos executados pelo governo em prol da fonte e ainda acredita serem necessárias melhorias em critérios de qualificação das empresas desenvolvedores e investidores. “Não é um jogo para todo mundo. Precisa ter um ponto de corte”, apontou.
Sean Whittaker, Principal Renewable Energy Specialist at International Finance Corporation (IFC), ressaltou por sua vez que as regras são positivas e que o Brasil com esses textos conseguiu ter uma base para seguir os próximos passos no desenvolvimento da fonte. Para o executivo, a geração offshore no Brasil será a mais competitiva do mundo.
Laura Porto, diretora-executiva de Renováveis da Neoenergia, por sua vez, lembra que, por ser um ambiente de negócios nascente, é necessário um financiamento especial nessa etapa inicial de desenvolvimento da fonte.
O diretor de eólicas offshore Brasil e América Latina da Equinor, André Leite, comentou que é importante haver uma definição sobre os direitos de uso das áreas. O decreto 10.746/22 cria um arcabouço para que isso seja feito através de licitação (planejado ou independente). Ele avaliou que a publicação das portarias é um passo positivo nessa direção e a Equinor está trabalhando ativamente com outras empresas, a ABEEólica e as autoridades buscando garantir um processo transparente e consistente com as metas de sustentabilidade do negócio.
“Estamos seguindo no Brasil para viabilizar o investimento inicial. Acho importante o planejamento espacial marítimo. Numa visão de longo prazo, o investimento vai depender se o Brasil quer ser um exportador de energia limpa e partir para uma diversificação”, comentou.
Fernanda Scoponi, senior Business Development Offshore Wind Brazil da TotalEnergies, foi a voz que levantou a necessidade de que o leilão de áreas do mar para as empresas seja feito até o final do ano que vem. Isso porque há um processo extenso de estudo e licenciamento. Ela lembrou que as portarias vão em direção ao que o mercado pediu e sugeriu ao governo.
Essa avaliação apontada pelos agentes presentes no evento foi corroborado pela presidente executiva da ABEEólica, Élbia Gannoum. Em sua avaliação o texto veio em linha com o que foi discutido ao longo do processo, muitos itens colocados pela associação e os agentes foram acatados. Elogiou a criação do Portal Único e os critérios para que aja a cessão de uso do mar.
“O tipo de cobrança dessa cessão e quanto vai ser é um ponto importante e precisará ser determinada por portaria a ser publicada até junho de 2023, mas acredito que possa vir antes, como veio essa portaria de hoje”, destacou Élbia. “Há outras questões que podem ser encaminhadas mas serão em edital do leilão da cessão, não o de energia, mas do uso do espaço. É passo não é desafio e precisam ser feitos um a um. Nossa leitura preliminar é que a portaria está muito bem, regulamentando o tema”, acresentou.
Élbia disse que não acredita que o PL da offshore que está no Congresso Nacional deverá ser aprovado ainda este ano, diferentemente do que afirmou o senador Jean Paul Prates (PT-RN). “Em anos de eleições dificilmente sai algo desse porte, é trabalho para o ano que vem”.
O presidente da Empresa de Pesquisa Energética, Thiago Barral, definiu que com o texto agora o Brasil tem um rumo no que se refere à discussão do arcabouço regulatório. Em sua análise, estamos no caminho adequado e, evidementemte, que para colocar em prática aprimoramentos serão necessários.
“A portaria consolida a construção coletiva do arcabouço. A portaria vai até o elemento fundamental, tem o Portal Único com maior clareza onde começa o processo e onde estão os processos para que as instituições possam cumprir seus papeis e por outro lado alcança a etapa de cessão de uso das áreas que é fundamental para a segurança jurídica”, afirmou o executivo.
Para Gerusa Magalhães, Sócia Fundadora na Magalhães, Reis & Figueiró Advogados, a portaria representa sim um grande avanço. Cita que o detalhamento apresentado atribui robustez e os detalhes agregados trazem maior solidez. E ainda, afirma que os critérios de capacitação econômica e técnicas que tem que ser exigidos pelo porte e valor dos projetos. Em sua análise, se espera que o governo antecipe um pouco prazos para dois temas relevantes: a sobreposição de delimitação de áreas e o processo de implementação.
“Os investidores estão preparados para dar continuidade a estudos e investimentos e a celeridade contribui com o desenvolvimento mais rápido da indústria”, afirmou. Ela diz que o leilão de cessão de áreas, ainda no ano que vem é difícil de ser realizado, ficaria mais para 2024, pois ainda há muitos detalhamentos a serem feitos.
Ao comentar os caminhos regulatórios do mercado de eólica offshore, o superintendente adjunto de planejamento de geração de energia da EPE, Gustavo Ponte, afirmou que preciso definir os requisitos do estudo de potencial de eólica offshore. “Será necessário incluir além da medição do vento, navegação, pesca e impactos ambientais. Nós já viemos nos preparando antes do decreto e conversando com outros países. Cada País tem a sua forma de abordar e não é tão simples assim. Os requisitos vão se aprimorando ao longo do tempo e conforme o mercado vai amadurecendo. É uma construção coletiva e importante para estabelecer e redefinir os requisitos de potencial offshore”, disse.
Já para a assessora técnica do departamento de planejamento energético do MME, Karina Souza, a Portaria 52 veio para mostrar os próximos passos e contribuir com as atividades, contudo vão continuar as normas complementares ao decreto para julho de 2023.
Segundo Karina, a coordenação do PUG-Offshore veio para buscar soluções que já existem no governo federal e adaptar para que o setor offshore seja preciso, objetivo e simples. “A nossa prioridade tem sido definir os procedimento e regras, para mitigar os riscos de investimentos e de menor risco possível e isso é importante mostrarmos para o setor. Queremos fazer dar certo e minimizando os riscos”, ressaltou.
A executiva ainda destacou que no futuro não iremos ver empreendimentos sobrepostos. “Hoje já temos como endereçar as sobreposições que já existem. O PUG-Offshore e a experiência que Aneel já tem tem para detalhar essas atividades para que os investimentos possam ser aprimorados e complementam as solicitações”, explicou.
Com relação as áreas, Karina destacou que o papel do governo nas definições de áreas é deixar prontas as ferramentas e mecanismos. Nos próximos anos a iniciativa privada irá indicar as áreas de interesse. A primeira fase vai ser igual em todos os países, onde é identificada as suas áreas de interesse.
Por outro lado, o diretor de comunicação, RSC e Carbono da Engie Brasil e diretor da Ocean Winds Brasil, Gil Maranhão, tem observado os limites de países de distanciamentos e critérios diferentes. “É uma questão que vamos ter que discutir, defendendo que regras sejam cumpridas. Ainda enxergo vários pontos em aberto”, disse.
Apresar de todos os avanços, ele não vê empreendedores indo lá e decidindo investir cerca de US$ 100 milhões baseados apenas na portaria 52. “Ainda falta muito. Temos que levar a conversa para um tom mais estratégico”, finalizou Maranhão.