As emissões de gases de efeito estufa do Brasil tiveram em 2021 sua maior alta em quase duas décadas. Dados do Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa do Observatório do Clima mostram que no ano passado, o país emitiu 2,42 bilhões de toneladas brutas de CO2 equivalente, um aumento de 12,2% em relação a 2020, de 2,16 bilhões de toneladas. Na área de energia, a alta ficou em 12,2%, a maior desde o “milagre econômico” da ditadura militar, em 1973.

Só em 2003 foi verificada uma alta maior, quando o país atingiu seu recorde histórico de emissões, com alta de 20%, puxada pela explosão do desmatamento na Amazônia. No ano passado, as emissões por desmatamento também foram as principais responsáveis pela elevação. Impulsionadas pelo terceiro ano seguido de crescimento da área desmatada na Amazônia e demais biomas no governo de Jair Bolsonaro, as emissões por mudança de uso da terra e florestas tiveram alta de 18,5%. A destruição dos biomas brasileiros emitiu 1,19 bilhão de toneladas brutas no ano passado — mais do que o Japão —, contra 1 bilhão de toneladas em 2020.

Quase todos os demais setores da economia tiveram forte alta: 3,8% na agropecuária, setor que costuma ter flutuações pequenas nos gases de efeito estufa e 8,2% no setor de processos industriais e uso de produtos. O setor de resíduos foi o único com emissões estáveis de 2020 para 2021.

A elevação em energia e indústria se deve a uma série de fatores. Um deles é a retomada da economia após a fase mais grave da pandemia de Covid-19. Neste caso, o Brasil acompanhou a tendência mundial: um relatório do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente lançado no fim de outubro mostrou que, após uma queda de 4,7% em 2020, ano de pico da pandemia, as emissões do mundo voltaram a subir rapidamente em 2021 e podem ter batido o recorde histórico de 2019.

De acordo com Felipe Barcellos, analista de projetos do Instituto de Energia e Meio Ambiente, organização responsável pelos cálculos de energia e processos industriais do SEEG, o setor de energia no Brasil emitiu 435 milhões de toneladas de CO2 equivalente em 2021 contra 387 milhões em 2020. Segundo ele, proporcionalmente as emissões explodiram pelo fato de o consumo ter caído em 2020 por causa da Covid. No ano passado, o consumo energético voltou a patamares de 2014.

No entanto, dois outros fatores explicam a maior alta de emissões em quase 50 anos no setor. Um deles foi a crise hídrica de 2021, decorrente da pior estiagem em nove décadas no Centro-Sul do país. Ela secou as hidrelétricas e forçou o acionamento de termelétricas, que o governo tornou permanente. Isso diminuiu a parcela de energias renováveis na matriz elétrica nacional. Enquanto o consumo de eletricidade aumentou 4%, as emissões por geração de eletricidade cresceram 46%. Um terceiro fator, também decorrente da seca, foi a queda na safra de cana no Sudeste, que levou a uma alta do preço do etanol — reduzindo, consequentemente, a participação do biocombustível nos transportes.

A agropecuária teve as maiores emissões da série histórica: 601 milhões de toneladas, contra 579 milhões em 2020. Se fosse um país, o agro brasileiro seria o 16º maior emissor do planeta, à frente da África do Sul. A pecuária — em especial o metano emitido pelos arrotos do rebanho bovino — é a principal fonte, com 79,4% das emissões do setor. O aumento expressivo do rebanho bovino em 2021, de 3,1% (seis vezes mais que a média dos últimos 18 anos), foi o principal fator a influenciar o aumento das emissões. A última vez que o país viu um crescimento tão grande no número de cabeças de gado foi em 2004. Na agricultura, pesaram a alta no consumo de fertilizantes nitrogenados (13,8%) e o volume de calcário nas lavouras, que subiu 20%.

No setor de resíduos, que engloba principalmente a disposição de lixo (64% das emissões) e o tratamento de esgoto (28%), as emissões permaneceram essencialmente inalteradas (91,1 milhão de toneladas em 2021 contra 91,2 milhões em 2020).

O grande emissor, responsável por 49% de todas as emissões do país, foram as mudanças de uso da terra. O desmatamento na Amazônia, respondeu por 77% das emissões por MUT em 2021. O aumento nas emissões brutas do setor, de 18,5%, só é superado na série histórica pelo ano de 2003, no qual o crescimento foi de 30%. Também foi detectado aumento expressivo, de 65%, no carbono emitido pelo desmatamento da Mata Atlântica. No Cerrado, as emissões foram de 117 milhões de toneladas, com aumento de 4%.

O SEEG também fez uma estimativa do impacto das queimadas não associadas ao desmatamento, como as produzidas por incêndios florestais na Amazônia. Elas produzidas pelo homem, mas não são contabilizadas no inventário oficial brasileiro. Puderam ter sua extensão verificada pela primeira vez por meio do MapBiomas Fogo. Caso fossem computadas, representariam um acréscimo de 8% nas emissões por MUT no Brasil.

Segundo Tasso Azevedo, coordenador do SEEG, o balanço de dez anos do Sistema, mostra que o Brasil teve uma década perdida para controlar sua poluição climática. Ele explica que desde a regulamentação da Política Nacional sobre Mudança do Clima, em 2010, não apenas não se conseguiu reduzir as emissões de maneira consistente, como elas aumentaram nos últimos anos de forma expressiva. Para ele, o Brasil tem as ferramentas de política pública, a tecnologia e os recursos para mudar sua trajetória, mas é preciso que o governo e a sociedade entendam que isso é fundamental para dar segurança à população em tempos de eventos extremos acelerados e também para alavancar a economia.