A Câmara dos Deputados aprovou por 210 votos a 71 o projeto de decreto legislativo (PDL) que susta os efeitos de duas resoluções da Aneel que alteram metodologias aplicáveis às tarifas de transmissão. A proposta de autoria do deputado Danilo Forte (União-CE) segue agora para o Senado.
Os regulamentos suspensos pelo PDL 365 são a Resolução Normativa 1.024/2022, substituiu a metodologia de estabilização das tarifas de transmissão por um sistema de tarifas flutuantes, e a Resolução Normativa 1.041/2022, que modificou o sinal locacional da Tust/TUSD-g, para redistribuir os custos de rede entre os agentes do Sistema Interligado Nacional.
A proposta da Câmara foi criticada pela Associação Brasileira dos Grandes Consumidores de Energia e Consumidores Livres (Abrace) e pela Frente Nacional dos Consumidores de Energia. As entidades apontaram interferência do Legislativo em um tema que é da esfera regulatória, e alertaram para impactos sobre o consumidor.
“Vamos buscar sensibilizar os senadores e senadoras do equívoco da decisão da Câmara”, disse o presidente da Frente, Luiz Eduardo Barata, à Agência CanalEnergia. O grupo, do qual a Abrace faz parte, divulgou nota após a votação desta quarta-feira, 9 de novembro.
No comunicado, a frente afirma que vê com preocupação a decisão dos deputados, tomada sem o necessário diálogo e confrontando uma decisão amplamente discutida pela agência reguladora com agentes do setor e consumidores.
“A Frente vai encaminhar respeitosamente a todos os deputados sua avaliação para que eles possam refletir em relação a esses movimentos conhecidos como “jabutis” que encarecem a conta de energia e que certamente voltarão a ser apreciados na Câmara. Contamos com o entendimento dos senadores para frear mais um aumento na conta de luz dos brasileiros nesse e em outros processos legislativos.”
Metodologia
A nova metodologia de cálculo das Tarifas de Uso do Sistema de Transmissão (Tust) e das Tarifas de Uso do Sistema de Distribuição para centrais de geração conectadas em 88 kV e em 138 kV (TUSD-g) prevê a intensificação gradual do sinal de 2023 a 2028, para que os agentes que onerarem mais a rede paguem proporcionalmente mais pelo serviço.
A mudança, segundo a Aneel, vai reduzir as tarifas dos consumidores em 2,4% em média no Nordeste e em 0,8% no Norte, regiões onde há, atualmente, concentração de geração. Esses consumidores terão redução do pagamento pelo uso da rede de transmissão de aproximadamente R$ 1,23 bilhão por ano.
Na Região Centro-Oeste praticamente não haverá impacto, enquanto no Sudeste está previsto aumento de 0,5%, e no Sul, que está mais distante dos centros de geração, de 1,5% .
O deputado Danilo Forte acusou a agência de estabelecer uma política publica, invadindo um espaço que é do Congresso Nacional, e disse que as resoluções do órgão regulador afugentam investimentos em energia eólica (incluindo a fabricação de pás e aerogeradores) e solar e na produção de hidrogênio verde.
“Nós não podemos ter perspectiva de mudança do sinal locacional quando hoje o Nordeste tem excedente de energia, e com o discurso que ficaria mais barata a energia no Nordeste, porque tem esse excedente. Mas vai falir os parques geradores. Vão falir os investimentos, porque vai ser uma mudança de localização, mesmo com uma eficiência menor na geração da energia solar, e simplesmente a extinção de todo o progresso que o Brasil teve no que diz respeito ao avanço da energia do vento, da energia eólica” afirmou o parlamentar.
Em nota, a Aneel rebateu a acusação e disse que “atua em estrita observância de suas competências institucionais” ao tratar do tema. Um papel que foi reconhecido pelo Ministério de Minas e Energia e está previsto na Lei 9.427, de 1996, que criou a agência reguladora.
Também reforçou que as decisões foram tomadas com amplo diálogo e transparência, em três fases de Consulta Pública, e que os regulamentos tem previsão de aplicação gradual, com período de transição.
O fim da estabilização da tarifa dos geradores busca equilibrar o pagamento da expansão da rede entre consumidores e geradores, enquanto a manutenção dessa estabilidade proposta no PDL vai onerar principalmente os consumidores. “Atualmente, todo o risco de oscilação do custo da transmissão recai sobre os consumidores e os geradores que não têm a tarifa estabilizada. Importante destacar, por muito relevante, que nos últimos leilões de transmissão, foram contratados aproximadamente R$ 50 bilhões em investimentos que ainda não entraram nas tarifas, e que apenas em 2023 está prevista a contratação de aproximadamente R$ 50 bilhões”, explicou a agência.
Para o relator da matéria, Juscelino Filho (União-MA), a Aneel criou uma política pública que é de competência do Congresso, e extrapolou suas prerrogativas. O parlamentar alegou que a agência aprovou a resolução do sinal locacional 20 dias depois de a Câmara ter aprovado o projeto de conversão da Medida Provisória 1.118, que estabelecia tarifas congeladas durante todo o período das outorgas de geração. A MP, no entanto, não produziu efeitos, pois perdeu a validade sem ter sido votada pelo Senado.
O deputado Paulo Ganime (Novo-RJ) foi o único parlamentar a criticar a proposta em plenário. Ele apontou problemas graves na proposta, que em sua avaliação invadiu a competência da agência reguladora, além de, no mérito, criar custos para os consumidores. “Tantos falam aqui do aumento de conta de luz, CDE cara, e estamos mais uma vez encarecendo a conta de luz, fazendo com o que o trabalhador, a população mais carente, pague por isso.”