A aplicação literal do comando da Lei da Eletrobras (Lei 14.182) na contratação de térmicas a gás natural representa um risco em relação à conformidade com outras leis e princípios que regem o setor elétrico e a administração pública. A conclusão é do Tribunal de Contas da União, ao alertar que a depender da real necessidade de energia de reserva, os leilões para a contratação compulsória prevista na lei podem não estar aderentes ao planejamento setorial e a princípios legais e constitucionais.
O plenário do tribunal recomend0u ao Ministério das Minas e Energia que, diante das contradições analise a possiblidade jurídica de ultrapassar a interpretação literal do dispositivo da lei, para justificar uma eventual decisão em relação a não contratar esses empreendimentos.
“O que fica no limite, o que é possível fazer, é recomendar ao Ministério de Minas e Energia que avalie a possibilidade jurídica de interpretar o dispositivo dessa lei de capitalização da Eletrobras, dos 8 mil MW, à luz das leis e princípios legais e constitucionais que regem a matéria. Aqui, se eu me colocar na posição do MME, eu estaria absolutamente tentado a buscar, em cada caso concreto, a não aplicação da literalidade da lei. Mas eu não posso impor a ele o que eu imagino que faria,” disse o relator do processo, ministro Benjamin Zymler.
A área técnica do TCU fez uma avaliação, a pedido da Comissão de Fiscalização e Controle da Câmara dos Deputados, sobre a aplicação dos parâmetros constitucionais na operacionalização das medidas previstas na lei que autorizou a privatização da Eletrobras, especialmente em relação à contratação de 8 GW de usinas termelétricas.
A auditoria apontou que a determinação da lei não tem respaldo em estudo oficial indicando a necessidade sistêmica de compra do montante de energia de reserva indicado para início de suprimento no horizonte de 2026 a 2030. O planejamento indicaria para esse período, uma demanda de aproximadamente 2,2 GW médios para a modalidade nesse período. Há, também, carência de avaliações sobre as consequências tarifárias e ambientais dessa contratação.
O ministro lembrou que já foi realizado um processo licitatório que resultou na contratação de três termelétricas ao preço médio R$ 444/MWh, quando o custo médio no ambiente regulado é de R$348,72/MWh. E que o impacto total da contratação calculado pela Associação Brasileira dos Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres é de R$ 104,5 bilhões, a valor presente.
Para Zymler, chama a atenção uma lei tratar da contratação de térmicas estabelecendo montantes por região e invadindo uma função que é do órgão planejador do Poder Executivo.
Além do jabuti das térmicas, a Lei da Eletrobras também recebeu emendas no Congresso Nacional que autorizaram a contratação obrigatória de 2 GW de pequenas centrais hidrelétricas nos leilões de expansão dos próximos anos; a prorrogação dos contratos do Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia e o inicio das obras do linhão Manaus- Boa Vista, que vai conectar Roraima ao Sistema Interligado.